• 03 out 2016

    Derrocada do PT e consolidação do golpe de Estado

3 de outubro de 2016

Eleições Municipais

A conclusão mais visível e importante foi queda do PT. A imprensa monopolista se sentiu confortável com esse destaque. De 630 prefeitos eleitos em 2012, despencou para 256. Em números relativos, perdeu 59,4%. A derrota de Fernando Haddad para João Doria, em São Paulo, representou, em particular, o sentido geral do descenso petista.

O esfacelamento eleitoral do PT na principal capital do País o coloca em uma posição subalterna no quadro das forças partidárias nacionais. O fortalecimento do PSDB no estado de São Paulo tem um significado especial diante do fato de ter sido o fio condutor do golpe de Estado, embora o PMDB tenha assumido finalmente a presidência da República. A enorme rejeição nacional ao PT e a fragorosa derrota no principal estado da federação vêm solidificar o impeachment e favorecer a ofensiva da direita em seu objetivo de liquidar o PT.

Não há dúvida de que os responsáveis pela Operação Lava Jato verão nesse resultado catastrófico um apoio das massas à perseguição seletiva ao petismo. Distintamente seria se o PT tivesse sido capaz de convencer a maioria nacional oprimida de que a investigação de que padece e o golpe institucional constituíram um ataque a um governo de fato “popular”, embora burguês.

É evidente que o longo espetáculo do impeachment, a expulsão de Dilma Rousseff do Palácio do Planalto, a campanha de denúncia sobre a corrupção na Petrobrás, a utilização das empreiteiras para se financiar, a prisão de importantes figuras petistas e a transformação do ex-presidente Lula em réu da Lava Jato foram os principais fatores que implicaram a derrocada do PT. Os analistas que servem à imprensa monopolista batem nessa tecla. Explicam o que está às vistas de qualquer um que domine o bê-á-bá da política. Assim, ocultam o outro lado da medalha. Os crimes dos demais partidos, principalmente os do PSDB, PMDB e DEM, foram marginalizados pela Operação Lava Jato, Ministério Público Federal e Supremo Tribunal Federal.

Com elevada dose de falsificação e hipocrisia, as instituições judiciais e policiais esconderam a revelação de que a direção do PMDB se convenceu definitivamente de que era preciso levar a cabo o impeachment de Dilma Rousseff como uma medida de contenção da ofensiva da Lava Jato. PMDB e PSDB/DEM estabeleceram uma aliança para que a caça ficasse direcionada ao PT e assim se exaurisse. Não se tratava apenas de derrubar o governo eleito, mas de arrancar o petismo do seio das massas. Em outras palavras, quebrar o encanto eleitoral exercido por Lula.

Há uma enorme quantidade de parlamentares e figurões do PSDB, PMDB e DEM denunciados pelo Ministério Público Federal, que de tão envolvidos que estão na corrupção não poderiam ficar ocultos. Aécio Neves e próprio Michel Temer fazem parte do rol da Lava Jato. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e seu partido, o PSDB, se safaram do “Escândalo do Caso Alstom”, que envolveu 6,8 milhões de dólares em propina. Também ficou para trás o caso de corrupção de Furnas. As campanhas presidenciais dos peessedebistas foram, sem exceção, regadas por dinheiro sujo.

Mais recentemente se descobriu o desvio de recursos da merenda escolar. É claríssimo o envolvimento do governo Alckmin. A máfia da merenda, assim denominada, foi organizada desde a secretaria da casa civil até a presidência da Assembleia Legislativa de São Paulo. Montou-se uma CPI sob o controle do PSDB e aliados – o PMDB também está implicado -, que mais serviu para ocultar do que para revelar. Sem que se demonstre o quanto as instituições que caçam o PT e o quanto protegem os delinquentes do PSDB, não se pode avaliar corretamente a estrondosa vitória do candidato de Alckmin em São Paulo e a derrocada geral dos petistas Brasil afora.

A explicação do desastre não se resume à vasta corrupção. O PT carrega nas costas o resultado da catastrófica crise econômica. Em pleno período eleitoral, as notícias diziam que o desemprego alcançava a casa dos 12 milhões e que renda média dos assalariados continuava caindo. Aos olhos das famílias afetadas com o desemprego e agoniada pela alta do custo de vida, o PT foi apresentado como o principal culpado, quando não o único culpado. Na campanha pelo impeachment, o PSDB, DEM e PMDB pintaram o governo de Dilma como o satanás que assaltou a vida do povo. Associaram a corrupção com a política econômica e com as demissões em massa, de maneira a formar uma explicação completamente distorcida dos acontecimentos. Os capitalistas que demitiam em todos os ramos da produção e dos negócios, as multinacionais que fechavam milhares de postos de trabalho e os especuladores da dívida pública que recebiam 500 bilhões de reais em juros ao ano ficavam anônimos, quando não eram vitimados. É como se a brutal recessão combinada com a alta do custo de vida tivesse nascida da política econômica do PT, cujo governo gastou mais do que o Orçamento permitia, que esbanjou e que dilapidou o patrimônio da Nação por meio da corrupção.

Essa foi a gigantesca fraude ideológica que amparou o impeachment e que pairou sobre as eleições municipais. Essa foi a grande fraude que serviu para o PSDB sair vitorioso das eleições, seguido das rebotalhas partidárias que calçaram a via do impeachment.

A política econômica certamente influencia o curso da crise, mas não o cria e não o determina em última instância. A recessão se instalou e se aprofundou no Brasil como reflexo e parte da enorme queda do comércio mundial. Toda América Latina sentiu os abalos do desmoronamento que iniciou em 2008 nos Estados Unidos e que até hoje não foi plenamente contido.

Os governos burgueses – é preciso sempre identificar seu conteúdo de classe – que retomaram algumas teses do nacionalismo burguês e que as adaptaram se tornaram inviáveis diante da crise de superprodução e da exposição da fragilidade das economias atrasadas latino-americanas, submetidas que são ao imperialismo. Na Argentina, o peronismo foi apeado do poder. Na Venezuela, o governo chavista está em frangalhos e fortalecem as tendências de golpe de Estado. Na Bolívia, a população não aceitou uma nova candidatura do indigenista. No Brasil, o governo pseudo reformista foi derrubado. No rastro de seus fracassos e diante de suas impotências diante do imperialismo, avança a direita. À exceção da Bolívia, onde se fortalecem as tendências revolucionárias das massas, tendo em seu seio o Partido Operário Revolucionário, em toda América Latina a reação francamente pró-imperialista levanta a cabeça, depois de ter perdido terreno com o fim do desastroso movimento “neoliberal”.

Esse fenômeno também esteve presente nas eleições municipais, por meio das quais os partidos da burguesia reúnem forças para a disputa presidencial. É bem possível que essas eleições tenham sido a mais internacionalizada da história das eleições municipais. A derrocada do PT e a elevação dos partidos que protagonizaram o golpe de Estado estiveram sob a influência das tendências gerais de direitização da política burguesa. Foi muito importante para a consolidação do golpe que o PT fosse varrido eleitoralmente no pleito que ocorreu imediatamente à constituição do governo golpista. Caso contrário, poderia potenciar o “Fora, Temer!”, “Diretas Já!”, encabeçado pela Frente Brasil Popular.

As eleições são o campo político da burguesia. É preciso reafirmar constantemente essa premissa, uma vez que os partidos da ordem capitalista, as instituições do Estado e o aparato ideológico da burguesia tudo fazem para disfarçar e ocultar o caráter de classe da democracia e, portanto, de sua dominação. Está aí por que as explicações dos acontecimentos políticos são de classe. Não basta a explicação acima. Por si só pouco valor tem para o entendimento do momento e o diagnóstico do futuro próximo. O PT sofreu uma derrota no âmbito da política burguesa. O mau desempenho eleitoral foi uma extensão do processo da Lava Jato e do impeachment. Essa é a evidência da superfície dos fatos. O que por si só já permite afirmar que se trata de uma derrota no campo da política burguesa. Mas o fundamental está em que o PT, por não ser historicamente um partido orgânico a burguesia, traiu as aspirações dos explorados ao governar para a burguesia e de acordo com os seus interesses de classe. A corrupção é consequência desse conteúdo de classe de sua política, não importando se é menos entreguista e mais complacente com a tragédia social dos explorados do que o PSDB, etc. Esse fundamento é decisivo no balanço da derrocada do PT. Impossibilita sustentar a fraude de que se tratou do embate entre “esquerda e direita”, entre “progressistas e reacionários”, entre um “projeto popular e um projeto elitista”.

Há sem dúvida distinção entre as políticas econômicas, mas são distinções no terreno da política burguesa e apenas de graus. São variantes da política de classe da burguesia. No momento em que a crise provocou perigosos desequilíbrios, entre eles o da queda do superávit primário, necessário para pagar a monumental carga de juros da dívida pública, a burguesia se uniu em torno dos velhos partidos oligárquicos, para derrubar o imprestável governo de Dilma Rousseff.

Não foi a classe operária, nem a maioria oprimida, que arrebentou o governo petista, mas sim a burguesia e uma camada da classe média. No entanto, foi o governo petista que abriu fogo contra os explorados assumindo a política econômica calcada no “ajuste fiscal”, voltada principalmente a proteger os interesses do capital financeiro. Nesse sentido, houve uma rejeição das massas aos candidatos do PT e uma debandada para os falsamente identificados como salvadores da Nação, dos empregos e dos salários.

Sem a presença de um partido revolucionário, enraizado no proletariado e dirigentes das lutas, e diante da presença de uma esquerda oportunista e raquítica, que muito mal se mascara de socialista, os explorados foram arrastados pelos seus piores e mais vis carrascos.

Sobre a base desses acontecimentos, o PT perdeu terreno entre as massas e dificilmente irá recuperá-lo em sua integridade. De qualquer maneira, não terá mais como disfarçar sua política burguesa, de respeito à grande propriedade capitalista, ao capital financeiro e ao imperialismo. Não se pode deduzir desses fatos que os explorados passaram a apoiar a política do PSDB, PMDB, DEM, etc. O mais preciso é afirmar que foram arrastados circunstancialmente pelos partidos golpistas em função da própria degenerescência do PT. Nada mudou em suas vidas, mas mudará para pior com os ataques já planejados pela aliança PMDB, PSDB e DEM.

O “ajuste fiscal” será mais violento que o traçado por Dilma Rousseff. As reformas da previdência e a trabalhista precarizarão ainda mais a existência da maioria. A pobreza, miséria e fome avançarão. As massas apenas estão na posição de expectativa diante da nova situação. Sem dúvida, se chocarão com o novo governo.

Trata-se de a vanguarda fazer uma severa avaliação sobre as distorções e as falsificações que levam o oportunismo eleitoral e democratizante das esquerdas, cujo protótipo mais acabado se encontra no PT. Trata-se de se colocar por reordenar as forças de esquerda para marginalizar as direções oportunistas e fortalecer a construção do partido marxista-leninista-trotskista. Trata-se de empunhar as reivindicações mais sentidas pelos explorados e vinculá-las à luta por um governo operário e camponês, pela estratégia de poder próprio das massas, que é a ditadura de classe do proletariado.