• 14 fev 2017

    O intervencionismo militar nos estados, típico de uma ditadura civil

14 de fevereiro de 2017

É preciso responder com um movimento nacional dos explorados

O governo de Michel Temer nasceu de uma situação política excepcional. A burguesia já não admitia que seu Estado permanecesse sob a condução do PT. O motivo principal era de ordem econômica. A recessão, o alto endividamento do Tesouro Nacional e o déficit primário exigiam uma drástica mudança de política econômica e de relação do governo com a burocracia sindical e movimentos. Fez parte dessa situação a necessidade de um novo realinhamento internacional. Assim, tem exigido a profunda crise mundial, cujos reflexos na América Latina são sensíveis. De forma que os capitalistas, chefiados pelo grande capital nacional e multinacional, decidiram não esperar as eleições presidenciais de 2018. Autorizaram os seus partidos orgânicos, cujos pilares da política de Estado constituem o PMDB, PSDB e DEM, a derrubarem o governo constitucional de Dilma Rousseff por meio de um golpe.

Desta vez, a burguesia não necessitou recorrer à ditadura militar, como o fez em 1964. As condições marcadas pelo predomínio da política de colaboração de classes desenvolvida pelo PT e pela retração da classe operária e do movimento camponês permitiram a deposição de um governo recém-reeleito por meio de um golpe institucional. As Forças Armadas ficaram como guardiãs. Não precisaram se envolver. O que permitiu aos partidos que impulsionaram o processo de impeachment defenderem o golpe como se fosse uma decorrência normal, constitucional, da democracia.

O Congresso Nacional cassou o voto de mais de 50 milhões que reelegeram Dilma Rousseff. O objetivo foi de constituir um governo transitório, sob a máscara da constitucionalidade, do Estado Democrático de Direito. O fato é que Michel Temer, vice-presidente de Dilma Rousseff e chefe do PMDB, encabeçou um governo de exceção. Apoia-se inteiramente na frente ampla de partidos que se uniram em torno do impeachment, no poder judiciário que se alinhou ao golpe e nas Forças Armadas. Tem apoio do grande capital e conta com uma parcela da alta classe média. As massas, a maioria nacional oprimida, reprovam esse governo, embora não tenham se lançado contra o golpe.

Michel Temer e as camarilhas dos partidos que o sustentam assumiram a missão de impor um conjunto de reformas e medidas antinacionais e antipopulares em prazo curto de tempo. O que era difícil a um governo eleito, colocado diante da fragmentação partidária, tornou-se mais fácil a um governo de características ditatoriais. Não tem sido mais violento porque continua sobressaltado pela crise política desencadeada pela Operação Lava Jato e pela sobrevivência da política de colaboração de classes do PT e de seu braço sindical. Nenhum governo que se constituiu após a ditadura militar foi tão pródigo em reformas voltadas diretamente contra os assalariados e os explorados em geral, em tão pouco tempo. Não é preciso enumerar todas elas.

O grande feito esperado é o das reformas da previdência e trabalhista. Temer conta precisamente com a unidade das forças burguesas que o colocaram na presidência por meio do golpe. O PT e seus escassos aliados não têm como oferecer resistência parlamentar. Estão cientes de que são incapazes de enfrentar o governo golpista. Só lhes resta aproveitar a crise política que continua a acossar o governo e a trabalhar por se reestruturar como oposição burguesa. Respeitadores da democracia burguesa e da propriedade privada dos meios de produção, o PT e aliados estão ajoelhados diante do governo da aliança golpista. Dão continuidade à política de colaboração de classes, sob as novas condições abertas pelo impeachment.

A resistência e o contra-ataque dos explorados dependerão de explosões espontâneas e de uma tremenda pressão social sobre os sindicatos e centrais, profundamente burocratizados e submetidos à política de Estado. O calendário de mobilizações anunciado pela CUT contra a reforma da previdência e trabalhista está voltado às disputas parlamentares e condicionado pelo objetivo do PT de se reorganizar como oposição burguesa.

É de conhecimento do movimento sindical, do movimento camponês e popular e da vanguarda, que se coloca no campo das esquerdas, que, sem um levante nacional contra o governo de Temer, as reformas anti-operárias serão impostas. A classe operária está na iminência de ter direitos elementares arrancados à força pela ultra minoria burguesa. Os camponeses pobres sentem a mão pesada da política pró-latifúndio e pró-agronegócio.

Não temos dúvida de que o golpe foi gestado sob a impotência e fracasso dos governos petistas, nas condições de gigantesca crise econômica e de desintegração do capitalismo mundial. A confiança depositada pelos pobres e miseráveis na promessa do nacional-reformismo petista de distribuição de renda e superação da fome, agora, se volta contra suas necessidades básicas na forma de desorganização, de subordinação de suas organizações à política burguesa e de ausência de independência de classe.

O caráter ditatorial de Temer somente não tem mostrado por inteiro seu rosto devido a que tem podido impor sua política antinacional e antipopular sem contar com uma resistência organizada do proletariado. Mas seus disfarces democráticos se tornam cada vez mais visíveis aos explorados. E assim revela a falência histórica dos partidos da burguesia, que dirigem o País desde as prefeituras até a presidência da República. A intervenção de Temer no estado do Espírito Santo é um claro sintoma de como funciona a democracia oligárquica. A burguesia e seu Estado não suportam uma paralisação da polícia, que qualquer um sabe se trata de um recurso extremo dos policiais rigidamente subordinados à hierarquia ditatorial. A mesma medida se aplica no Rio de Janeiro.

A putrefação do capitalismo e a consequente barbárie são tal que os governos estão obrigados a inchar o aparato de repressão com um elevado contingente de homens, mas para isso têm de pagar um salário muito rebaixado. Que seja 7 ou 4 anos sem reajuste no Espírito Santo, o arrocho salarial levou as mulheres dos policiais a armarem os bloqueios nas casernas. O governo que mais aplicou a Lei de Responsabilidade Fiscal e que foi tido como exemplo a outros estados que deveriam seguir foi sacudido pela paralisação da polícia, por saques e pela explosão de assassinatos. O socorro pedido pelo governador pôs às claras a ausência de uma real autonomia dos estados da Federação e o caráter centralizador-ditatorial da República. E a intervenção das Forças Armadas, por sua vez, evidenciou seu papel de contenção da luta de classes.

Somente os cegos e os interessados em ocultar a realidade não veem que a greve da polícia por salários, denominada de motim pelo governo, é uma expressão deformada da luta de classes. É evidente que a ampla destruição das condições de vida das massas acaba por se projetar no interior do aparato policial. Como instrumento de repressão, a burguesia não pode tolerar tal manifestação. Foi criada no governo de Lula a Força de Segurança Nacional. Sua função é a de intervir nos estados quando os governadores perdem a capacidade de reprimir. É o caso da paralisação na polícia. Não sendo capaz de cumprir essa função, as Forças Armadas são acionadas.

Michel Temer, em meio à crise política que atinge seu governo, fez uma demonstração de força atuando prontamente no Espírito Santo. Não se pode admitir qualquer acordo de reajuste salarial. Seria a quebra da linha geral de ajuste fiscal, que deve centralizar todas as esferas da administração pública. A greve da polícia se choca não apenas com o governo estadual, mas também com o governo federal.

No caso do Rio de Janeiro, a polícia apenas exige o pagamento em dia dos salários e gratificações. A crise é mais profunda. O estado está quebrado. O acordo imposto por Temer ao governador Luiz Fernando Pezão implica um violento ajuste que recai inteiramente sobre o funcionalismo e sobre a população que necessita da saúde e educação públicas. A privatização da Cedae provocou uma reação dos trabalhadores, de populares e de estudantes. A transformação da Assembleia Legislativa (Alerj) em praça de guerra e a possibilidade de o descontentamento dos policiais confluírem com as manifestações levaram Temer a atender ao pedido do governador para que enviasse tropas para sufocar a tendência à rebelião. Está previsto entre 15 de fevereiro e 5 de março o patrulhamento das ruas por soldados das Forças Armadas e pela Força Nacional de Segurança. É nesse período que a Alerj prevê a conclusão das votações.

Como se vê, todas as medidas vêm sendo impostas ditatorialmente por Temer e pela aliança golpista que controla o Congresso. É nessas circunstâncias que melhor se verifica a função do golpe. É sintomático que Temer tenha anunciado que imporá “regra dura” para o funcionalismo não se animar a utilizar a greve. Está prevendo dias mais turbulentos. A crise social se agravará ainda mais nos próximos anos. Dificilmente, a economia voltará a crescer a taxas capazes de repor os postos de trabalhos destruídos. E os serviços sociais estarão ainda mais comprometidos. A PEC do Teto indica claramente esse caminho.

Está em curso o conflito burguês em torno da Operação Lava Jato. Poderosos setores da burguesia chegaram à conclusão de que o que tinha de se fazer foi feito e que agora é o momento de resolver tão somente o rescaldo. O governo golpista precisa de um fôlego para fazer valer suas reformas e enfrentar o descontentamento dos explorados que pulsa sob seus pés. Se não fossem os escândalos de corrupção que continuam a eclodir no seio do governo, a sua estabilidade estaria assegurada, a depender principalmente da atitude da classe operária e dos demais oprimidos diante dos ataques sofridos. O envio do ministro da Defesa, acompanhado de altas autoridades, ao Espírito Santo para ameaçar os policiais grevistas e as mulheres que se destacavam no bloqueio dos quartéis foi uma demonstração política indicando que é hora de pôr fim à Lava Jato.

Infelizmente, a classe operária se mantém recuada. Os capitalistas a golpearam com uma onda de demissões, sem que os sindicatos resistissem. Pior do que não resistir foi a descarada colaboração com as multinacionais e grandes empresas nacionais que devastaram cerca de três milhões de postos de trabalho em pouco tempo. A aplicação da “flexibilização do trabalho” está na base da reforma trabalhista. Na prática, o patronato vem solapando os direitos trabalhistas assegurados na CLT. Falta apenas impor novas regulamentações, que defendem o capital contra o trabalho.

Temer, depois de dizer que irá regulamentar a lei antigreve para o funcionalismo, anunciou que impulsionará a votação no Senado da lei geral da terceirização. Após ter passado pelas turbulentas ocupações de escolas e universidades contra a PEC do Teto e a reforma do ensino médio, o governo se sentiu animado a prosseguir com os seus ataques, contando com a política de contemporização do PT. Por seu turno, a esquerda não tem sido capaz de organizar-se em uma frente de luta pela independência de classe dos movimentos. Mas Temer necessita agora conter a animosidade dos policiais de vários estados. Derrotados os movimentos do Espírito Santo e Rio de Janeiro, Temer terá mais fôlego para ir adiante com as reformas antinacional e antipopular.

A ausência de apoio das centrais e sindicatos à greve da polícia e ao corajoso bloqueio das mulheres aos quartéis facilita a intervenção das forças federais de repressão. O Partido Operário Revolucionário tem insistido no combate ao governo golpista, que vem se caracterizando por encarnar uma ditadura civil. O PT já abandonou até mesmo a bandeira de oposição burguesa de “Fora Temer” e “Eleições Já!”.

Nossa luta continua sob a bandeira de “Abaixo o governo golpista de Temer, por um governo operário e camponês!”! A via é a de organizar a classe operária e os demais explorados contra as demissões, o desemprego e a alta do custo de vida. É a de pôr em pé um movimento nacional contra as reformas da previdência, a trabalhista, a do ensino médio, a lei da terceirização e o projeto de lei que criminaliza as greves. É necessário defender sem meio termo o direito dos policiais de paralisarem suas funções, de terem sindicatos, de realizarem assembleias nos quartéis e de se manifestarem.

O Partido Operário Revolucionário chama a classe operária, os camponeses, a classe média empobrecida e a juventude a se unirem em uma frente única contra o governo Temer e a aliança golpista.