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06 abr 2016
6 de abril de 2016
Porque a classe operária e demais explorados devem ser contra o impeachment
Está claro que a Comissão Especial que decidirá sobre o acatamento ou não do impeachment da presidente Dilma Rousseff não passa de um circo. Sabíamos disso assim que foi constituída. As cartas estavam marcadas antecipadamente. Não haveria nenhuma avaliação jurídica séria. Não haveria uma conclusão política sobre bases materiais. As explicações dos acusadores e a defesa do governo não modificaram em nada as posições já cristalizadas. Os deputados foram selecionados pelos líderes partidários segundo a inclinação pré-estabelecida a favor ou contra o impeachment. Nem os argumentos do governo, nem os dos seus acusadores modificaram as opiniões de quem quer que seja. O que quer dizer que todos são partes envolvidas e interessadas no julgamento.
O PSDB, que lidera a oposição, quer derrubar o governo e criar as condições para retomar o poder do Estado. Não admitiu sua derrota eleitoral. O PMDB, que faz parte do governo, por meio do vice-presidente, tem a ganhar com o impeachment. Importantes lideranças, a começar por Michel Temer, trabalham pela formação de um novo governo. Uma fração do PSDB, sob a chefia do senador José Serra, pretende montar um governo transitório em torno de Temer. Logo mais, a Câmara dos Deputados votará o pedido de impeachment.
O PT e PSDB contam seus votos. De um lado, os governistas reorganizam suas forças, depois da decisão do PMDB de abandonar o governo, redistribuindo cargos. De outro, a oposição, apoiada por empresários e imprensa, pressiona para que votem pela derrubada de Dilma. Ambas as partes fazem listas públicas de deputados, para que sejam responsabilizados pelo resultado final. Os governistas indicam quem são os golpistas. Os oposicionistas, quem são os que votam em apoio ao governo petista, envolvido no saque da Petrobrás, na corrupção e responsável pela crise econômica.
Assistiremos na Câmara dos Deputados o mesmo circo montado pela Comissão Especial, somente não sabemos ainda com precisão o resultado final. O PSDB e seus asseclas avaliam que é grande a chance do impeachment passar. O PT se bate por alcançar os 172 votos necessários ou ausências para evitar a queda de Dilma. A população, formada pela maioria de operários, camponeses e de classe média pobre, assiste e assistirá ao espetáculo. Não tem nenhum poder de decisão, embora tenha se dividido nas eleições de 2014 e dado a vitória a Dilma, com 54 milhões de votos.
Ocorre que na democracia e no denominado Estado de Direito quem elegeu não controla o governo eleito. O poder não emana do povo, como se diz pomposamente. O poder real que sustenta a democracia são os capitalistas, fundamentalmente os grandes capitalistas e a velha oligarquia agrária, ainda que decadente. Está aí por que é negado ao “povo”, ou seja, à maioria nacional oprimida, o poder de destituição do governo.
As manifestações de uma camada da classe média a favor do impeachment e as contrárias, organizadas pela Frente Brasil Popular (CUT, CTB, MST, UNE, PT e PCdoB), servem ao circo parlamentar. Não foram independentes e não expressaram o poder da maior oprimida. São manifestações subordinadas às disputas políticas no Congresso Nacional e judiciais no Supremo Tribunal Federal. O que significa o seguinte: aqueles que elegeram não são os que destituem o governo eleito. Quem derrubará ou conservará o mandato de Dilma são os deputados e juízes, que estão subordinados ao poder dos capitalistas, ou seja, da classe minoritária e exploradora da maioria.
Os jornais dizem que a maioria quer o impeachment. Para “comprovar”, mostram pesquisas de opinião. Nada mais falso, uma vez que a maioria oprimida não teve possibilidade de conhecer as reais causas da crise política e das disputas interburguesas. A versão criada pela imprensa monopolista é a mesma que a da oposição, que tem buscado o golpe desde o primeiro dia do mandato de Dilma. Está claro que os meios de comunicação se tornaram porta-vozes do PSDB, DEM e demais aliados. E por quê? Porque são instrumentos político-ideológicos da classe capitalista, cujo núcleo dominante está pela destituição do governo, por não ver nele e no PT condições para responder à gigantesca recessão e à decomposição do capitalismo, que é mundial (ainda que o governo professe continuamente sua disposição para aplicar as medidas antinacionais e antipopulares ditadas pelo capital financeiro internacional).
O fato de a classe operária não ter seu partido revolucionário e carecer de organizações próprias independentes das forças burguesas não a permite julgar a crise de seu ponto de vista de classe, responder com sua política e combater o golpe da direita com seu programa e estratégia de poder (a luta por um governo operário e camponês). Sem uma política independente, a classe operária não pode lutar contra o impeachment sem estar subordinada à política burguesa do PT. A consequência é muito mais grave. Sem a política revolucionária, que lhe permite lutar por um poder próprio, a classe operária não tem como convencer os camponeses e a classe média pobre de que o golpe é retirar da maioria oprimida o poder de derrubar o governo que elegeu.
Quem elegeu é que pode destituir! Esse pressuposto é da própria democracia burguesa, que, no entanto, é extremamente deformada no caso do Brasil. A revogabilidade do mandato por quem elege não consta no ordenamento jurídico e político do Estado brasileiro, justamente porque implica que as massas exerçam a soberania política. A burguesia não pode admitir nem mesmo a sombra do “poder que emana do povo”. Em seu lugar, copiou-se das democracias imperialistas o princípio do “impeachment” (impedimento), cujo pressuposto antidemocrático está em que o Congresso Nacional, seus partidos e parlamentares representam o “povo”. Essa é a única razão pela qual os explorados devem lutar contra o impeachment e, portanto, contra a derrubada de Dilma por essa via.
Há entre as esquerdas quem diz que não há golpe. Erram brutalmente. O golpe consiste precisamente na aplicação do impeachment que expressa o poder da minoria burguesa de cassar o voto de 54 milhões que elegeram Dilma e rechaçaram Aécio Neves. Trata-se dos explorados exercerem de fato a soberania popular, ainda que no plano democrático-burguês. Não há nenhum outro motivo fundamental que caracterize o impeachment como golpe. No entanto, o PT e seu governo não rechaçam o impeachment como instrumento da minoria burguesa. Consideram-no como constitucional, portanto, legítimo meio para o Congresso Nacional interromper o mandato de um presidente. Alegam que o golpe se deve não ao impeachment, mas tão somente à falta do crime de responsabilidade. Dilma poderia perder o mandato, como ocorreu com o ex-presidente Fernando Collor de Melo, mas para isso deveria ser comprovado que atentou contra a Constituição. Acusa a oposição de ter forjado um crime de responsabilidade.
Em sua defesa na Comissão Especial, o advogado geral da União, José Eduardo Cardozo, concentrou-se em demonstrar que a denúncia de violação da Lei de Responsabilidade Fiscal é falsa, inconsistente e improcedente. Se fosse verdadeira, seria legítima e necessária a interrupção do mandato presidencial. A oposição, por sua vez, afirma que a violação e o crime de responsabilidade são claros. Nesse terreno de disputa interburguesa, em que os explorados não têm como ter investigação e conclusão próprias, prevalecerá a interpretação política dos parlamentares, podendo ir parar finalmente nas mãos do Supremo Tribunal Federal.
É sabido que as leis são utilizadas de acordo com as necessidades da burguesia. Constantemente, prefeitos, governadores e governo federal as manejam de acordo com os interesses gerais da burguesia. Está aí por que Dilma se defende mostrando que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fez as mesmas operações financeiras e orçamentárias sem, contudo, sofrer denúncia do Tribunal de Contas da União. A resposta dos defensores do impeachment de que o presidente de honra do PSDB as utilizou em menor escala e em menor volume não eliminam o fato de que houve violação da Lei de Responsabilidade Fiscal, criada por eles mesmos e ditada pelo Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial para proteger os credores e especuladores.
A montagem do processo de impeachment não para aí. A Operação Lava Jato se tornou uma poderosa arma contra o PT e seu governo. Todos os grandes partidos estão envolvidos com as empreiteiras, que se aproveitaram da venalidade da burocracia estatal, dos partidos e dos políticos para saquearem a Petrobrás e outras estatais. Mas a rede de interesses e negociatas é muito mais ampla, envolve bancos, multinacionais e grandes empresários brasileiros, que continuam encobertos pela lei que permite o financiamento privado de campanha eleitoral. Nenhum capitalista entrega milhões aos partidos se não for para proteger seus interesses no Estado, que finalmente recaem na forma de impostos, de cortes orçamentários, de eliminação de direitos, etc.
Os explorados elegem os candidatos que servirão à burguesia. Não têm como defender seus interesses de pobres e oprimidos nas instituições do Estado e por meio da política dos partidos patronais. Essa é a dura verdade da democracia burguesa. Dura verdade para os explorados, certamente. É nesse terreno que o PSDB e seus aliados organizaram o movimento pela derrubada de Dilma Rousseff. Movimento esse que faz parte do funcionamento do Estado, ou, como soa mais bonito, do chamado Estado de Direito, que quer dizer império da Constituição, o qual garante o direito de propriedade dos meios de produção, de exploração do trabalho e do exercício da ditadura de classe da minoria capitalista sobre a maioria trabalhadora.
A classe operária e demais explorados não devem se meter nesta armadilha. Não devem sair em defesa do Estado de Direito e da democracia em geral quando se trata de uma disputa interburguesa no campo da Constituição e da legalidade. Os aspectos assinalados expressam, antes de tudo, as conspirações e choques no plano jurídico-político sobre o qual os explorados não têm controle e de fato nada sabem, a não ser as versões que oferecem governistas e golpistas. É importante denunciar as arbitrariedades, as ações antidemocráticas e as conspirações voltadas a derrubar a presidente eleita e a criminalizar o PT.
O Partido Operário Revolucionário tem denunciado e combatido constantemente a política dos golpistas, em todos os seus aspectos. No entanto, sem se colocar no terreno do governismo, que está envolvido até a medula com a política burguesa, com as relações oligárquicas de poder e com a podridão no seio do Estado. Nossa bandeira foi, desde o seu primeiro mandato, de Oposição Revolucionária ao Governo Burguês de Dilma Rousseff. É por essa via que temos defendido a independência de classe dos explorados diante do governo petista, de todos os partidos da burguesia e do Estado. E é por ela que combatemos o golpe institucional. Levantamos a bandeira de abaixo o golpe contra Dilma Rousseff na defesa do princípio democrático da revogabilidade do mandato por aqueles que elegeram a presidente. O que exige que não se tenha nenhum compromisso com a defesa do governo burguês.
Os explorados devem lutar contra o golpe, sob a estratégia de poder própria – a luta por um governo operário e camponês, com os métodos e meios da revolução proletária. É preciso organizar um Tribunal Popular, nascido das lutas e apoiado nas assembleias operárias, camponesas e populares. Somente uma organização própria e independente edificada no seio da maioria oprimida tem como responder à crise econômica e política com o programa do proletariado.
Está praticamente definido que parte dos explorados segue os golpistas e parte, o governismo. Isso se deve à ausência do partido revolucionário e, consequentemente, de um movimento independente dos explorados, com suas reivindicações e seus métodos próprios de luta. Situação que exige maior esforço da vanguarda e das camadas mais conscientes dos explorados e da juventude em concentrar esforços na construção do partido proletário.
Tanto a queda do governo como a sua manutenção colocará no dia seguinte as mesmas necessidades dos explorados: defender em todo o país os empregos, os salários, os direitos trabalhistas e previdenciários e as condições gerais de existência da maioria oprimida.
Abaixo o golpe contra o governo Dilma! Não ao impeachment!
Os explorados, com sua independência de classe e a partir de suas reivindicações próprias e seus métodos de luta, precisam tomar em suas mãos a bandeira da revogabilidade do mandato da presidente apenas por quem a elegeu!