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29 jan 2017
29 de janeiro de 2017
Não se deve menosprezar o significado da eleição de Donald Trump. As análises que dão a ideia de que dificilmente porá em prática o seu programa eleitoral podem desviar a atenção da necessidade de combater a ofensiva imperialista sob as novas condições políticas abertas nos Estados Unidos.
O ponto de partida é dado pela longa crise econômica mundial. Barack Obama não foi capaz de fazer seu sucessor, apesar de elevada aprovação. A derrocada de 2008 e o baixo crescimento solaparam a política dos democratas e deram projeção aos republicanos na figura de um empresário que expressa tendências fascistas. A surpreendente derrota de Hillary Clinton e a hegemonia alcançada pelos republicanos se deram sobre a base de uma avaliação vitoriosa de que era chegada a hora dos Estados Unidos mudarem suas diretrizes de política internacional. Além de boa parte da classe média, importante parcela da classe operária foi arrastada pela virulenta propaganda em torno do protecionismo e do nacionalismo xenofóbico.
Evidentemente, republicanos e democratas respondem aos interesses da burguesia imperialista. Embora em última instância sempre convirjam, nem por isso deixam de representar variantes distintas. É o que se observa já nas primeiras horas do governo Trump.
A revogação do Acordo Transpacífico (TPP) demonstrou a sua disposição de mudar sensivelmente a orientação implantada pelos democratas, substituindo uma ofensiva intervencionista de bloco por outra de acordos bilaterais. É bem provável que altere o acordo de livre-comércio que engloba o México e Canadá (Nafta). Temos de ver ainda se cumprirá o objetivo de mudar a relação dos Estados Unidos com a Europa em torno da OTAN. Essa é uma relação mais delicada, uma vez que se assenta na aliança vencedora da Segunda Guerra Mundial e que serviu de instrumento para os Estados Unidos imporem sua hegemonia internacional.
Basta a presteza como Trump revogou o TPP para se notar que importantes mudanças começam a ganhar corpo. O fundamental está em que a guerra comercial ganha nova dimensão. Tudo indica que o novo governo pretende usar o protecionismo para obrigar maior abertura do mercado mundial, sem que os Estados Unidos tenham de fazer múltiplas concessões. Não se trata mais de utilizar a diretriz dos blocos e acordos multilaterais para o capital financeiro e as multinacionais norte-americanas penetrarem mais livremente em toda a parte, mas sim de a potência retomar seu lugar produtor de mercadorias de alto valor agregado e de grande exportador.
Os ideólogos trumpistas entendem que os Estados Unidos não devem mais impulsionar a penetração das multinacionais em países que servem de plataforma e que acabam por inundar o mercado norte-americano de mercadorias exógenas. Os casos mais flagrantes são o da China e do México. A meta de reindustrializar os Estados Unidos vem nesse sentido, embora tenha tudo para fracassar. Não se realizará a volta das multinacionais. O cancelamento da Ford de abrir uma nova fábrica no México foi apresentado como um marco concreto da nova política. Não representa, porém, um movimento geral. A economia dos Estados Unidos se encontra em decadência devido à contradição entre as forças produtivas altamente desenvolvidas e as relações de produção. Essa lei econômica e histórica determina que o capitalismo da época imperialista não tem como impulsionar globalmente as forças produtivas. Ao contrário, a crise de superprodução se converte em sua destruição maciça.
O mais provável é que Trump utilize o protecionismo para impor em todas as latitudes maior abertura econômica para as exportações norte-americanas e maior consumo interno em mercados nacionais tão vastos como o da China. Está demonstrado que o problema de fundo da maior economia se encontra na irresistível queda da taxa média de lucro, o que levou as multinacionais a transferirem e construírem novas fábricas onde a composição orgânica do capital lhes é favorável, em outras palavras, onde a abundante força de trabalho pode ser superexplorada (capital variável), compensando a alta tecnologia já constituída (capital constante). Esse é o obstáculo com que a política protecionista dos republicanos se deparará.
Ao contrário de suas promessas, Trump terá de percorrer a via de ataque generalizado às condições de trabalho e existência da classe operária norte-americana. Para isso, impulsionará uma ofensiva sobre os países semicoloniais. A revogação do TPP deixou os porta-vozes do imperialismo e o próprio governo golpista de Temer a “ver navios”. O ministro do Exterior, José Serra, se distingue do governo petista pela defesa do realinhamento do Brasil em torno dos Estados Unidos. O TPP de Obama era a porta de entrada. Poderia seguir o exemplo do governo Macri, da Argentina. Agora, aguarda como será o realinhamento. O argumento de que afinal de contas o Brasil não tem nenhum tratado com os Estados Unidos – pobre do México – serve de consolo.
Os explorados da América Latina e, dentre eles, o proletariado estão pagando caro pela crise econômica e pela política pró-imperialista da maioria dos governos. É um momento propício para se travar a luta contra o grande capital, desenvolver as reivindicações e impulsionar o programa da revolução proletária. A tarefa de pôr em pé a frente única anti-imperialista se apresentará com maior concretude diante da ofensiva da política do fascista Trump.