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12 maio 2017
12 de maio de 2017
A inquirição e defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva perante o juiz Sérgio Moro, em Curitiba, cumpre mais um episódio da crise política que perseguiu e abateu os governos petistas. Lembremos aqui que Lula enfrentou em seu primeiro mandato a eclosão de denúncias de corrupção, que acabou no longo, desgastante e feroz processo do que se denominou “mensalão”.
A partir de uma denúncia de corrupção nos Correios, o denunciado Roberto Jefferson se tornou o delator do PT, afirmando que o governo comprava votos dos parlamentares. Abria-se em 2005, em meio ao mandato de Lula, uma guerra de acusações, potenciada pela imprensa monopolista inimiga do petismo. Em resumo, em agosto de 2007, o Supremo Tribunal Federal iniciou o julgamento do “mensalão”.
O Ministério Público se baseou em acusações de formação de quadrilha, corrupção ativa, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Os implicados reconheceram que houve somente prática ilícita de caixa 2, comum a todos os partidos. Mesmo sem prova material, importantes dirigentes, parlamentares e homens de governo, como José Dirceu e José Genoíno, foram condenados à prisão.
A oposição, comandada pelo PSDB e DEM, procurou implicar Lula, responsabilizando-o pela sustentação de uma ampla bancada parlamentar por meio da compra de votos. Travou-se uma batalha em torno da constituição de uma Comissão de Inquérito do Congresso Nacional. O PT exigiu que se apurasse a corrupção desde o governo de Fernando Henrique Cardoso.
Recordemos também que o “mensalão” teve como precedente o esquema de desvio de dinheiro estatal montado por Eduardo Azeredo, do PSDB, nas eleições de 1998, para o governo de Minas Gerais. O que se denominou “valerioduto tucano” passou a servir ao PT, no governo de Lula. Ocorre que esse conhecimento não serviu ao Ministério Público e ao Supremo Tribunal Federal para investigar a fundo a ampla rede de corrupção, montada por várias quadrilhas no seio do Estado, como expressões da política burguesa.
O objetivo era o de caçar o PT e atingir mortalmente o caudilho Lula. Depois, evidentemente, se faria uma assepsia pelas bordas do PSDB, caso a situação política exigisse. Não foi possível cassar o mandato de Lula, apesar do DEM trabalhar pelo seu impeachment. A situação econômica era favorável ao governo petista. Em última instância, as bases econômica e social determinam as crises políticas em torno da disputa do poder e da governabilidade. Está aí por que Lula manteve seu carisma popular e, mesmo com a vasta publicidade do julgamento do “mensalão”, derrotou o PSDB em 2006.
A projeção do lulismo alcançou dar vitória a Dilma Rousseff em 2010. No entanto, a crise econômica, diga-se de passagem, de ordem mundial, empurrava o Brasil para a recessão, colocava no alto a dívida pública, desequilibrava as contas do Tesouro Nacional, derrubava a lucratividade de importantes setores capitalistas, ameaçava o parasitismo financeiro e impulsionava uma onda gigantesca de demissões. Estavam dadas as condições para uma mudança no poder. No entanto, a eleição de Dilma para um segundo mandato, em 2014, provocou uma rebelião do PSDB, sua coligação e a imprensa monopolista. A primeira investida foi a de anular as eleições por meio de uma “auditoria especial” nas urnas eletrônicas a ser realizada pelo TSE. As eleições foram polarizadas e regadas de abundante financiamento empresarial. Essa via não tinha como progredir. Serviu, porém, para declarar a “ilegitimidade” das eleições e do governo.
A Operação Lava Jato foi lançada precisamente em março de 2014. É visível que se trata da continuidade do “mensalão”, envolvendo figuras como o deputado José Janene e o famoso doleiro Alberto Youssef. Desta vez, o escândalo de corrupção serviu de instrumento para o PSDB, aliados, imprensa e organizações da classe capitalista se unirem em torno do impeachment. Mais uma vez se fez a triagem do PT até chegar a Lula, passando pela derrubada do governo eleito.
Como dissemos, a Lava Jato foi um instrumento. A causa se encontra na impossibilidade histórica do reformismo se sustentar diante da poderosa crise econômica, que expressa a desintegração do capitalismo. A corrupção é inerente ao Estado e à política burguesa. Também não é causa primeira da crise. Dilma se mostrou incapaz de governar segundo as necessidades gerais do capital já no seu primeiro mandato. Foi responsabilizada pelo poder econômico de ter colocado lenha na fogueira. Não poderia realizar as brutais reformas antinacional e antipopular exigidas pelo capital financeiro, industrial e comercial. A base parlamentar se estilhaçara. Armou-se um novo realinhamento partidário sob a bandeira do impeachment em torno da falsa questão do crime de responsabilidade fiscal.
O golpe de Estado e a instituição de uma ditadura civil não solucionou a crise política, mas lhe deu uma nova forma. A Operação Lava Jato continuou a se expandir revelando que o PT era apenas uma parte da vasta rede de corrupção empresarial e política. PMDB, PSDB, DEM e demais partidos, cada um a sua maneira e grau, que se valeram dos escândalos para jogar o PT no limbo e derrubar seu governo, têm seus figurões denunciados. Temer perdeu oito ministros por envolvimento na bandalheira e ainda sustenta outros velhacos, do tipo Moreira Franco e Eliseu Padilha. O próprio presidente golpista está implicado nas malhas de financiamento criminoso de campanha. Neste aspecto, permanece a crise política, que deve ser resolvida com a Lava Jato esgotando o caso do PT. O problema está em como disciplinar o andamento desse processo e reduzir o ativismo do Ministério Público e da Polícia Federal. Não há, porém, crise política quanto à unidade burguesa em torno do governo golpista. A palavra de ordem é a de preservar o governo que está possibilitando a implantação das draconianas reformas e criando as condições para os capitalistas intensificarem a exploração do trabalho e para o Estado reunir recursos para sustentar o parasitismo dos poderosos grupos econômicos.
O Congresso Nacional continua a se sujeitar ao governo que ele mesmo criou pela força do impeachment, embora tenha aumentado a resistência quanto à violenta reforma da previdência. O PT, PCdoB e PSOL se mostram impotentes. Não têm como encarnar uma forte oposição. Servem de enfeite oposicionista à imposição autoritária das reformas.
A greve geral indicou o caminho da luta contra o governo golpista e contra a ofensiva discriminatória da Lava Jato contra o PT e Lula. Mas a burocracia sindical apenas a usou e a está usando para abrir negociação com Temer e o Congresso Nacional. O espaço de tempo que deixou para o governo caminhar e para a Lava Jato avançar sobre o PT desarmou a luta. Não sabemos, portanto, de fato, se o indicativo de greve geral por dois dias será posto em prática.
A Lava Jato está por atingir o PT como um todo. Quanto ao PMDB, PSDB e DEM, sua parte na corrupção será tratada distintamente, assim como vem ocorrendo. É preciso considerar o depoimento de Lula nesta situação e não perder os elos da ascensão e queda do petismo.
Demonstramos em várias oportunidades que o PT não é um partido orgânico da burguesia. Aburguesou-se mais e mais a cada passo que o aproximava do poder. Corrompeu-se prematuramente ao se servir do financiamento de empresários e grupos econômicos, em outras palavras, dos exploradores da força de trabalho, dos opressores da maioria dos brasileiros. Daí a adentrar e assimilar o mundo próprio dos partidos orgânicos da burguesia foi seu destino.
Em termos históricos, o PT rompeu com suas raízes operárias de nascimento. Em termos políticos e organizativos, se moldou à governabilidade burguesa e se curvou diante dos fundamentos da ditadura de classe da burguesia que sustenta o Estado e as relações capitalistas de exploração do trabalho. Em termos programáticos e teóricos, nunca foi proletário, revolucionário, marxista.
As forças burguesas do Estado finalmente conseguiram colocar Lula como réu, cujo resultado é esperado. A condenação já foi feita no tribunal de exceção oculto. Depois da derrubada do governo Dilma, o restante é consequência. A teatral defesa perante perguntas e respostas preparadas para obter contradições, sem que se apresentasse nenhuma prova concreta da acusação sobre o triplex, serviu para desmontar o caudilho disposto a se candidatar em 2018. Tudo tem de parecer muito natural, muito dentro da lei e muito dentro da democracia.
A ditadura civil de Temer também se esconde com a máscara do Estado de Direito que presidiu a destituição de Dilma e com a do funcionamento normal das instituições. É imprescindível entender e denunciar o fato do processo da Lava Jato contra o PT estar ocorrendo sob um governo golpista, por isso uma ditadura civil, denunciado no mesmo processo e sob um Congresso Nacional constituído de deputados e senadores também implicados na corrupção.
Não temos dúvidas de que o PT e Lula estão mergulhados no financiamento fraudulento montado junto às empreiteiras e à burocracia da Petrobrás, assim como estão o PMDB e Temer, o PSDB e Aécio Neves, etc. Não temos dúvidas, porém, de que se trata de um julgamento de exceção do PT e de Lula. É contra esse método, essa política, essa farsa teatral e esse autoritarismo que nos insurgimos e lutamos para que a classe operária se insurja.
A tragédia do PT é que serviu aos interesses gerais da burguesia, em particular, privilegiou grupos econômicos, favoreceu as multinacionais e acabou prostrado diante da crise econômica que não se originou no Brasil e que o jogou no precipício. Prostrado e golpeado pela política e justiça burguesas, Lula compareceu diante de um juiz educado e cheio de mesura, sob os ares do império de uma lei supostamente neutra, diante da qual todos os criminosos devem abaixar a cabeça.
Ao se defender, colocando toda a tratativa sob a responsabilidade da mulher recém-falecida, Marisa Letícia, deu armas para os abutres. Um documento sem assinatura foi confiscado na casa do ex-presidente por meio de uma invasão domiciliar e uma prisão coercitiva merecia uma firme denúncia de Lula contra a ilegalidade, a publicidade e a prepotência da Polícia Federal. Não houve a firmeza devida de que se tratava de uma prova plantada. Moro indagou sobre a ameaça de Lula de que se eleito prenderia aqueles que abusaram do poder. A resposta de que era força de expressão, palavras de palanque, foi de quem temeu pela afirmação. Por que não dizer que sim, se de fato há um abuso seletivo de poder contra o PT? Moro é parte de um julgamento político, que está a cargo dos adversários que derrubaram o governo petista. Perguntado se achava que havia uma conspiração da Lava Jato, Lula não foi afirmativo. Por que não dizer que o impeachment resultou de uma conspiração que incluiu o vice-presidente Michel Temer e vários partidos da base aliada? A fachada democrática do processo legislativo e judicial não excluiu a conspiração. Na verdade, serviu para ocultá-la da população. A Lava Jato é parte da conspiração. Os vazamentos seletivos nos momentos calculados. A alimentação diária da imprensa com informações truncadas, o grampo clandestino do telefone presidencial, etc. serviram para instrumentar a direita, alimentar o Movimento Brasil Livre (MBL), Vem pra Rua, etc.
Todo processo foi montado com prisões preventivas e delações premiadas, sujeitas a todo tipo de manobras e divulgado pela imprensa monopolista antipetista como verdadeiras. A cada desmentido dos acusados, um bando de comentaristas reforçava a “verdade” dos delatores. É claríssimo que a derrubada do governo contou com a conspiração política, judicial e policial.
Finalmente, Lula disse que somente o povo pode julgá-lo. Isso significa que está sendo julgado arbitrariamente e, portanto, é vítima de uma conspiração política. Ser julgado pelo povo, no entender de Lula, é submeter-se ao voto. É nesse quadro da democracia formal que se montou a grande conspiração do impeachment e se conduziram as investigações e julgamento do “mensalão” centralizado no PT, e que veio a se repetir com maior amplitude no caso do “petrolão”. O fato é que o PT está sendo julgado pela justiça burguesa e não pelo povo.
Desde as primeiras horas desse processo, afirmamos que somente a classe operária pode apurar os crimes atribuídos a Lula e a todos petistas através de um Tribunal Popular nascido das lutas e assentado nas assembleias, comitês e organizações independentes perante a burguesia. Um Tribunal Popular investigaria todos os crimes dos partidos da burguesia e do empresariado. Essa seria a via revolucionária das massas oprimidas lutar pelo poder próprio e limpar o País da podridão burguesa.
Temos a certeza de que o PT e Lula preferem o julgamento da burguesia. Já se sujeitaram ao golpe de Estado e à ditadura civil de Temer sob a bandeira da democracia e da justiça burguesas. Na manifestação petista, em Curitiba, o caudilho jurou inocência e disposição de se candidatar à presidência. Mais uma vez prevaleceu o palanque.
Os explorados deram uma demonstração de força no dia 15 de março e 28 de abril. Levantaram-se contra as medidas reacionárias de Temer e estavam dispostos a dar um novo passo em defesa de suas vidas. Mas a burocracia sindical recuou e indicou que poderá esvaziar o combate. Foi um sinal de não radicalização e de disposição de armar um novo quadro de conciliação de classes. Essa conduta reforçará o objetivo dos golpistas de golpear mais fundo ainda o PT.
Lembramos que, durante o impeachment, a CUT e seus sindicatos fecharam os olhos para as demissões em massa. Não organizaram a resistência. Corremos o perigo, agora, de que se desviem o curso da ação direta coletiva, que permitiu os explorados pararem o País, para atos inócuos com fins eleitorais. A classe operária e sua vanguarda não podem perder de vista que o objetivo da luta não deve ser ditado pela Lava Jato e pelos depoimentos de Lula. Nosso objetivo é o de derrubar e enterrar as reformas antinacional e antipopular de Temer por meio de uma greve geral por tempo indeterminado. O que não impede o movimento de rechaçar o processo seletivo contra o PT e levantar a bandeira de que a classe operária e a maioria oprimida são as forças sociais que devem julgar os crimes da burguesia, por um Tribunal Popular.