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25 maio 2017
25 de maio de 2017
Sabia-se que a manifestação de 24 de maio, em Brasília, seria reprimida, não importando se fosse mais ou menos pacífica. Mas não estava previsto que o governo utilizasse a ação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Essa medida equivale ao estado de sítio. Coloca a repressão nas mãos das Forças Armadas e suspende as garantias democráticas.
O ministro da Defesa Raul Jungmann e o do Gabinete de Segurança Institucional general Sérgio Etchegoyen anunciaram o decreto presidencial sob a justificativa de conter a “baderna e o descontrole”. Informaram que a medida foi requisitada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM). Diante dos protestos dos deputados da oposição, Maia foi obrigado a explicar sua conduta. Respondeu que solicitou o uso da Força Nacional de Segurança Pública e nada mais. A desculpa esfarrapada de Jungmann e Etchegoyen foi a de que não havia efetivo suficiente em Brasília e que a solução foi recorrer às Forças Armadas.
A manifestação organizada pelas centrais sindicais não objetivava confrontar o aparato policial. A burocracia dirigente interveio contra a ação dos Black Blocks. É sabido que há infiltração de provocadores da polícia. A regra tem sido a de em todas as manifestações coletivas a tropa de choque intervém violentamente.
Jungmann e Echegoyen sabiam perfeitamente que Brasília seria tomada por passeatas, concentrações e protestos. A marcha ao Planalto foi convocada antes da divulgação das denúncias de Joesley da Friboi. O objetivo central era o de pressionar o Congresso Nacional a não aprovar as reformas. Com as revelações do empresário, potenciou a bandeira de “Fora Temer” e “Eleições Diretas, Já”, do PT e aliados.
Temer se acha pressionado a deixar a presidência e se agarra às reformas da previdência e trabalhista como autodefesa. Apresenta sua política econômica e seu quadro de ministros econômicos como salvação nacional. De forma que resiste com todas as forças que ainda lhe restam para preservar-se na direção do Estado.
Desde que assumiu o governo, Temer passou a reorganizar os órgãos de segurança. O ponto de partida foi o restabelecimento do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e sua vinculação à Agência Brasileira Informação Nacional (Abin). As forças golpistas têm clara consciência de que o capitalismo atravessa uma crise turbulenta e que é inevitável o agravamento da luta de classes. Sob alguns pronunciamentos mansos de que a Constituição e as leis garantem o direito de manifestação, movimenta-se o aparato policial e militar voltado a impedir que o movimento de massa se fortaleça e que a classe operária tome a frente dos combates empunhando suas próprias reivindicações.
As manifestações de junho de 2013 marcaram a fogo a situação política. Revelaram a gigantesca capacidade das massas coletivamente postas em movimento. No momento, a burguesia e a imprensa monopolista viram como uma contestação ao governo de Dilma Rousseff, do PT, embora atingisse os governadores de todos os naipes. Recordemos que o Palácio do Governo, em Brasília, foi sitiado por uma multidão. No entanto, bastou o aparato policial para controlar a fúria dos manifestantes.
Temos que o golpe não serviu apenas para a troca de um governo por outro mais comprometido a impor as reformas. Tratava-se de reorganizar a centralização do Estado. Para isso, era preciso aumentar a presença e o poder dos militares no seio do governo e das instituições. Temer se identificou com esse objetivo, que certamente vinha sendo pleiteado pelas Forças Armadas.
Na greve da polícia do Espírito Santo, o governo estadual emitiu um decreto transferindo para os militares a segurança. É comum que o governo federal intervenha nos casos de greves da polícia, principalmente com a Força de Segurança Nacional. Desta vez, porém, expressou a crescente influência dos militares no governo Temer.
O cerco policial à manifestação, em Brasília, previa um confronto e uma justificativa para a violência do Estado. A utilização de arma de fogo foi, certamente, prevista. Os policiais começaram o choque com as massas. A parcela que revidou e a ação dos Black Blocks não poderiam romper o aparato policial. A justificativa de que a polícia do Distrito Federal se mostrou incapaz de conter os manifestantes e que por isso o governo se viu obrigado a emitir o decreto que determinou por uma semana o estado de exceção foi posta em dúvida pelo próprio governador Rodrigo Rollemberg (PSB). De fato, Temer atendeu à orientação do Gabinete de Segurança Institucional. Aproveitou-se do fato de Rodrigo Maia ter pedido reforço da Força de Segurança Nacional para apresentar as Forças Armadas como guardiã do governo.
Não havia e não houve qualquer risco à governabilidade e ao Congresso Nacional. A manifestação dirigida pelas centrais rivais foi convocada inteiramente sob a orientação pacífica, cuja meta era tão somente a de pressionar os parlamentares a abrirem negociações sobre as reformas. A Força Sindical, lembremos, se aliou ao golpe, embora tivesse divergência interna. O deputado Paulinho que participou ativamente em favor do impeachment foi um dos promotores da manifestação e orientou a burocracia a ser dura com os Black Bocks. J
Jungmann e Etchegoyen vieram no dia seguinte, 25 de maio, anunciar a revogação do decreto alegando que não havia mais perigo de segurança e de baderna. Mas alertaram que estão prontos para recorrer à mesma medida.
A intervenção das Forças Armadas contra uma manifestação de massa é sintomática. É distinta, embora siga o mesmo princípio da ditadura de classe da burguesia, da intervenção no caso da greve da polícia. Pode parecer puramente circunstancial, mas indica uma tendência interna à política burguesa e ao Estado.
As Forças Armadas permaneceram nos bastidores do golpe institucional, mas estiveram de acordo com a via e os meios para derrubar um governo constitucional. Foram avalistas do impeachment, tal qual o Supremo Tribunal Federal. Esses fatores de conjunto indicam que a derrubada do governo eleito pelo Congresso Nacional deu lugar a uma ditadura civil, cujas características dependeriam do desenvolvimento da crise política e da estabilização da governabilidade.
Não devemos circunscrever o decreto de Temer de 24 de maio a um episódio. Demonstramos a importância da intervenção das Forças Armadas no estado do Espírito Santo. Agregamos, agora, o tamanho do aparato policial utilizado para neutralizar a manifestação em Curitiba por ocasião do depoimento do ex-presidente Lula. Temos presenciado o recrudescimento da repressão aos movimentos.
A crise econômica vem sendo descarregada inteiramente sobre os explorados. É insuportável o desemprego de 14,2 milhões de trabalhadores e cerca de 26 milhões que vivem no subemprego. Basta essa situação para tornar as situação social e política explosiva. Mas a burguesia e seu governo não param por aí. Impõe um dos maiores retrocessos trabalhistas e previdenciários que temos conhecimento da história republicana do País. Há uma ligação indissolúvel entre o impeachment, a constituição de um governo de exceção e a utilização das Forças Armadas para reprimir a manifestação em Brasília.
A desmoralização de Temer diante da população e as dificuldades do Congresso Nacional em sustentar o governo denunciado pela promotoria da União impossibilitaram a manutenção do decreto de Garantia da Lei e da Ordem. O recuo não deve impressionar. O essencial é que indicou uma tendência da burguesia e de seu Estado em endurecer contra as massas. O mais provável é que os militares se coloquem cada vez mais abertamente como seguro da governabilidade.
A questão é saber até onde a burocracia sindical retrocederá nas manifestações. Após a greve geral de 28 de abril, foi dado um fôlego ao governo e ao Congresso que aproveitaram para impulsionar o andamento das reformas. As revelações dos áudios dos irmãos Batista estancou o frenético processo. Temer armou uma reação. O Congresso retomou os encaminhamentos. Os choques dos manifestantes com a polícia e a intervenção das Forças Armadas não interromperam as votações. Os golpistas não deram a mínima importância ao protesto da oposição e sua retirada do plenário. A conduta dos governistas transpareceu as bases do golpe.
Congresso Nacional e governo Temer formam um todo. Tornaram-se órgãos de um poder do golpe. O Congresso não foi apenas um instrumento da derrubada do governo eleito, mas também, consequentemente, órgão de um governo ditatorial, cuja finalidade imediata foi a de impor às massas as reformas ditadas pelo capital financeiro e pelo imperialismo. Está aí por que o escândalo que atingiu Temer não resultou em uma ruptura, embora tenha abalado os partidos governistas.
A linha de separar as reformas da crise política passou a dirigir os defensores de Temer. É do interesse da burguesia e dos partidos golpistas, principalmente do PSDB e DEM, em aprovar as reformas.
Os acontecimentos de Brasília serviram à reação para acusar o movimento de baderneiros diante da população. É preciso que as centrais deem uma resposta rápida. Não basta denunciar o estado de exceção. É preciso retomar o caminho da greve geral. Essa é a principal arma que pode dar vitória à classe operária, aos demais explorados e à juventude oprimida.
Se o movimento não der esse passo urgentemente nesse sentido, as forças golpistas se recuperarão da hecatombe das denúncias. A saída de Temer não modificará a situação contrária às massas. O governo golpista não se resume ao presidente da República. O Congresso Nacional encarnou o golpe e, como dissemos, se tornou órgão de uma ditadura civil. Somente reorganizando a luta para uma nova greve geral poderá colocar a iniciativa política nas mãos da classe operária. Essa é a condição para derrotar as forças da reação burguesa e do processo antidemocrático que caracteriza a situação nacional.