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03 ago 2017
3 de agosto de 2017
Temer, imediatamente após a votação na Câmara dos deputados, fez um pronunciamento de vencedor: “não descansarei até 31 de dezembro de 2018 (…) para concluir o trabalho que iniciamos em 12 de maio de 2016 (…) durante esse breve período espero terminar a maior transformação já feita no país em vários setores do Estado e da sociedade”. Referiu-se como grande feito de seu governo a “modernização da Lei Trabalhista, esperada há mais de 30 anos”. Agora, tem pela frente impor a Reforma da Previdência.
Nas condições de profundo abalo político provocado pelas revelações de Joesley Batista e pela denúncia do Ministério Público de “corrupção passiva”, a obtenção de 263 votos pelo arquivamento da denúncia e 227 votos pelo não arquivamento pode ser considerada uma vitória da camarilha governista. Depois de rasgar e jogar na lata do lixo o parecer favorável do relator Sérgio Zveiter (PMDB) e colocar em seu lugar um relatório confeccionado para rechaçar a denúncia do Procurador-Geral Rodrigo Janot, era previsível que a Câmara Federal fizesse o mesmo.
A quadrilha peemedebista que ocupou o Planalto por meio do golpe de Estado, no entanto, esperava uma vitória mais estridente. Os 227 deputados que disseram NÃO ao relatório de Paulo Abi-Ackel (PSDB) não apenas confirmaram a denúncia como refletiram o processo de desintegração da base de sustentação da ditadura civil de Temer. Assim que terminou a votação, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, evidenciou dúvidas sobre a vitória de Temer. O problema é como será assegurada a governabilidade diante das pressões desintegradoras da frente partidária que derrubou o governo de Dilma Rousseff.
A camarilha resistiu à tormenta desencadeada em 17 de maio pela JBS. Derrotou a ofensiva da Operação Lava Jato, mas saiu politicamente golpeada. Tudo indica que uma nova tormenta se erguerá. O custo da vitória de Pirro é alto. As escandalosas concessões à bancada ruralista e evangélica resultarão em retomada da divisão interburguesa em torno da política econômica. Os presentes distribuídos a deputados não agradaram setores burgueses que apoiaram o golpe. Ficou claro que Temer recorreu ao velho expediente de comprar parlamentares. A promessa de cargos e postos ministeriais serviu de moeda de troca com os partidos mais fisiológicos. Obtidos os votos, agora virão as cobranças.
Temer está diante de um difícil rearranjo das forças golpistas. A divisão do PSDB, 22 a favor do relatório e 21 contra, indicou rupturas na base governista. Esse partido foi o principal pilar de sustentação do golpe de Estado. Temer e Aécio Neves usaram o PSDB de Minas Gerais para escorraçar o relator Sérgio Zveiter e colocar em seu lugar o mineiro Paulo Abi-Ackel, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). No entanto, no plenário da Câmara, o deputado Ricardo Tripoli, PSDB de São Paulo, chamou a bancada a votar contra Temer. O PSDB que esteve à frente do impeachment acabou entregando o poder ao PMDB e ao DEM. Os seus quatro ministérios não compensam o comprometimento com o governo que é rechaçado pela quase totalidade da população. O flagrante que expôs a delinquência de Aécio Neves obriga a fração do PSDB mineiro a garantir a sobrevivência de Temer, independente do quanto esteja desmoralizado. Ocorre que a fração paulista e a nordestina do PSDB não pretende se sacrificar perante o julgamento eleitoral de 2018.
O chamado Centrão (PP, PR, PRB, PSD, PTB, SD e outros) deu a vitória a Temer, como era esperado. Nele estão concentrados os ruralistas, evangélicos e os sindicalistas direitistas. Chamou atenção o fato da bancada da “bala” (segurança) ter dado votos contra Temer, em apoio à Operação Lava Jato. Os integrantes das bancadas BBB (boi, bala e bíblia) estão disseminados em quase todos os partidos, compondo um universo de 385 deputados de um total 513. Somente a bancada ruralista reúne cerca de 200 deputados. Esta bancada votou esmagadoramente em favor do governo, expressando os interesses do agronegócio, latifundiários, etc. Boa parte das bancadas BBB se concentra nos partidos que formam o Centrão. Recordemos que foi essa base parlamentar, que expressa a direita mais radical, que possibilitou ao PSDB estabelecer uma aliança com o PMDB para derrubar o governo do PT.
A oposição encabeçada pelo PT esteve unida. Votou quase 100% pelo acatamento da denúncia. É preciso, porém, não confundir a totalidade dos votos como de oposição. Quase todos os partidos que serviram ao golpe deram votos contrários ao relatório de Abi-Ackel. Alguns notórios reacionários procuraram se destacar do governo, como foi o caso dos Bolsonaros. Tinham a certeza, porém, que Temer venceria. À exceção do PT e aliados que foram vítimas do impeachment, os demais votaram pelo acatamento da denúncia em função de cálculos eleitorais e de vínculos com as forças que comandam a Lava Jato. De maneira que os 227 votos contra Temer não têm o mesmo peso político. A parcela considerada “infiel” é dura adversária do PT e aliados, trabalhou pelo golpe de Estado. A crise é tão profunda e os interesses oligárquicos são tão arraigados que levaram a colocar no mesmo terreno os não-golpistas e golpistas. É necessário, embora pareça marginal, apontar o fato de o governador da Bahia, do PT, ter licenciado dois de seus secretários para votar em favor de Temer. Segundo informações, o afastamento de Temer daria interinidade ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que é do DEM, o que fortaleceria o prefeito de Salvador, Antônio Magalhães Neto, do mesmo partido. Na prática, o petista contribuiu pela permanência de Temer.
Não era e não é do interesse do PT afastar o presidente golpista e entregar o poder a Rodrigo Maia. Perderia sentido a bandeira de “diretas já”, que corresponde institucionalmente ao “Fora Temer”. Há quem na esquerda oportunista afirme ser melhor com Temer do que com Maia. Certamente, esse argumento peregrino não chama atenção nem dos petistas. O que de fato os motiva é o objetivo de se fortalecer como oposição agarrados na campanha de eleições para presidente e na justificativa de que é necessário retomar a democracia, dando ao País um “governo legítimo”. A caracterização de “governo ilegítimo” é puramente eleitoral. Se se Temer renunciasse ou fosse afastado e se se convocassem as eleições antecipadas, seja lá quem fosse o eleito ou que partido ganhasse o poder, estaria restabelecida a ordem democrática e a legitimidade do governo. Essa politicagem liberaloide oculta a real natureza ditatorial do governo nascido do golpe, bem como a caracterização do Congresso Nacional como órgão do golpe.
Temer teve de negociar com sua base de sustentação a continuidade do governo, mas tal feito somente teve êxito porque conta com apoio de importantes setores da burguesia, haja vista o desempenho do agronegócio. O capital financeiro está desconcertado com a fraqueza do governo diante das pressões setoriais, que se valem de fartos subsídios. Nem por isso, abandonou o governo à sua própria sorte. Há alguma esperança de que ainda é possível negociar alguma saída para a reforma da previdência. A aprovação da reforma trabalhista foi um feito de grande envergadura. Impôs uma derrota à classe operária, mas graças à traição da burocracia que comanda as centrais. A desativação do movimento que se agigantou com a greve geral de 28 de abril deu fôlego político ao governo e deixou o Senado livre para dar o golpe de misericórdia nas velhas conquistas trabalhistas da classe operária. Não se pode e não é possível desvincular a permanência de Temer do desmonte do movimento nacional contra as reformas antinacional e antipopular. Estava claro que a derrubada do governo golpista somente viria da luta direta das massas contra as medidas que as sacrificam ainda mais em favor do capital financeiro, industrial, agroindustrial e comercial. A probabilidade de a própria burguesia se desfazer do governo que se originou do golpe de Estado e que se armou de um plano que pôs em marcha mudanças nas relações trabalhistas e previdenciárias esperadas há trinta anos era pequena. Além dessa ofensiva contra os explorados, Temer retomou os programas de privatizações montados nos governos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Os governos petistas não acabaram com as privatizações, mas estreitaram seu caminho. O governo golpista se encarregou de arreganhá-lo. Como se vê, não se tratava e não se trata de simplesmente trocar o governo golpista por outro eleito, mas de derrubar e enterrar por meio da luta direta dos explorados a política e as medidas antinacional e antipopular. A renúncia das Centrais em cumprir essa tarefa auxiliou a permanência de Temer em condições de luta de classes mais favoráveis hoje do que ontem. O espetáculo do Solidariedade votando com o carrasco da classe operária retratou bem a traição da Força Sindical ao movimento de combate às reformas. O dramalhão dos petistas e pecedobistas agitando a bandeira do Fora Temer, eleições e Lula para presidente, por sua vez, retratou bem a impotência do reformismo e o amargo papel da CUT em contribuir decisivamente para o desvio do curso da luta contra as reformas.
Os atritos, choques e enfrentamentos em torno da corrupção dizem respeito à política burguesa. O que assistimos na Câmara dos Deputados foi mais um episódio da crise de governabilidade, que tem por base a recessão econômica, as dificuldades do retorno ao crescimento, da reversão da alta taxa de desemprego, a quebra orçamentária dos estados da federação, o retrocesso dos serviços sociais, a miséria que ronda milhões de famílias e o impulso na criminalidade. Pouco antes da votação sobre a admissibilidade da denúncia, Temer, em comum acordo com o governador, enviou mais de oito mil homens das Forças Armadas para o Rio de Janeiro. Um dos estados mais importantes se encontra em situação falimentar. Há algum tempo vem gestando revoltas populares.
Os explorados estão diante do avanço da barbárie social e de governos que não têm outras respostas a não ser aumentar a exploração do trabalho, impulsionar a concentração de riqueza, fortalecer os monopólios e servir de instrumento do imperialismo. O nacional reformismo petista que pretendeu servir aos capitalistas e aos trabalhadores veio ao chão. Mostrou-se incapaz de se apoiar nas massas para enfrentar o movimento golpista. Seu principal aliado, o PMDB, conspirou para derrubar o governo de Dilma, recém-eleito para um segundo mandato. Sitiado pela frente golpista, sujeitou-se à degola. Temer é salvo da denúncia de corrupção pelo Congresso oligárquico e Lula é condenado pelo juiz Sérgio Moro. Temer exibia força política barrando o Ministério Público, e Moro convocava Lula a depor em um segundo processo.
Esses acontecimentos ocorreram no mesmo momento sem que a CUT, sindicatos, movimentos e da Frente Brasil Popular mexessem um dedo para mobilizar. O último intento ocorreu em defesa de Lula e de sua candidatura a presidente. As pequenas manifestações expuseram as contradições da situação política. As centrais romperam a unidade grevista e mostraram para os explorados que não estavam de fato por derrubar e enterrar as reformas reacionárias de Temer/Meirelles pela via do combate das massas. E essas não têm nenhum interesse em servir às disputas interburguesas em torno da corrupção, dos espetáculos da Lava Jato e das eleições de um novo presidente. Odeiam Temer. Mas tal manifestação somente importa ao governo golpista se se transformar em luta nas fábricas, nos bairros pobres, nas escolas, no comércio, nos transportes, no campo e em toda parte em que os oprimidos possam expressar-se coletivamente.
A impopularidade de Temer em si e passiva somente serve às disputas eleitorais. Por esse caminho, a burguesia continuará a impor sua política de crise estrutural do capitalismo. Não tem como o PT, a CUT, MST, MTST, UNE e sua Frente Popular fugirem de sua responsabilidade histórica de submeter os explorados a uma das variantes da política burguesa, que é o reformismo. A conclusão mais importante da vitória de Temer na Câmara dos Deputados é que em mais esse acontecimento a oposição reformista mostrou a impotência diante do governo golpista e da disposição da burguesia em mantê-lo à frente do Estado. Isso quer dizer que os explorados continuarão nas mãos do Congresso Nacional, que deverá decidir o que fazer com a reforma da previdência.
Ou a classe operária, os camponeses e as camadas pobres da classe média reagem e voltam às ruas, ou a ditadura civil de Temer continuará a atacar fundo suas condições de existência e a favorecer os interesses do capital financeiro, do agronegócio, dos latifundiários e dos monopólios industriais. Ou reorganizemos a greve geral, ou a marcha da barbárie progredirá. A enorme e devastadora crise em escala mundial põe à luz do dia as leis econômicas e sociais do capitalismo da época imperialista. Suas contradições não apenas não permitem melhorar as condições da maioria explorada, como as empurram para trás. Em toda parte, a classe capitalista e seus governos necessitam recrudescer a exploração do trabalho.
As potências, por sua vez, necessitam descarregar a crise sobre os países de economia atrasada. As massas dos países semicoloniais têm de suportar o peso da burguesia nacional e do imperialismo. Os governos que se arvoraram reformadores ou se sujeitam completamente às diretrizes do imperialismo, ou têm de ceder passagem a governos francamente pró-imperialistas. É o que se passa no Brasil e na América Latina. A situação da Venezuela que beira à guerra civil é o ponto mais alto dessa tendência geral. O golpe no Brasil é apenas uma variante da promoção de governos reacionários, antidemocráticos e autoritários no continente.
O problema é que o proletariado se acha desorganizado, submetido às políticas burguesas e pressionado pelas políticas pequeno-burguesas. Quando desperta para a luta, como na greve geral de 28 de abril, é contido pelas direções conciliadoras e pró-capitalistas.
A vanguarda consciente, verdadeiramente classista e socialista, têm de assumir o programa da revolução proletária. A experiência desse último período tem sido riquíssima em ensinamentos. Um dos mais significativos é que as condições da luta de classes exigem combater a ofensiva da burguesia e seu governo com a estratégia própria de poder. Sem esse guia, os explorados continuarão a se arrastar por trás das variantes burguesas. A posição do PT de remover institucionalmente o governo golpista e constituir um novo governo eleito corresponde à estratégia de poder da burguesia, embora no momento os capitalistas estejam por sustentar a ditadura civil de Temer. É necessário, portanto, combater todas as vias que alienam a independência de classe do proletariado.
A luta consequente para derrubar as reformas antinacional e antipopular exige que o movimento esteja sob a estratégia própria de poder. Eis por que é fundamental explicar para as massas que é necessário e possível combater o governo golpista sob a bandeira do governo operário e camponês. A estratégia de poder faz parte do programa proletário para a crise estrutural do capitalismo, que não se limita às reivindicações imediatas. Em sua essência, o programa conduz a luta dos explorados à expropriação do grande capital, ao controle operário da produção, à nacionalização das terras, à estatização do sistema financeiro e ao controle total do mercado exterior. O não pagamento da dívida pública é uma das primeiras medidas revolucionárias do governo operário e camponês.
Chamamos os explorados a exigir dos sindicatos a retomada das assembleias e a formação dos comitês de base para enfrentar a implantação da reforma trabalhista, da terceirização e impedir que o governo golpista imponha a reforma da previdência. Voltemos a organizar a greve geral! Abaixo do governo golpista e corrupto de Temer! Por um governo operário e camponês!