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31 mar 2018
28 de março de 2018
Declaração do Partido Operário Revolucionário
Era esperado que a campanha política de Lula, no Sul do País, se deparasse com a resistência dos adversários. Os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná se caracterizam pela forte presença de fazendeiros, agroindustriais, comerciantes e uma camada da alta classe média urbana que se opõem ao reformismo, ainda que ultralimitado.
Apesar do conservadorismo e do reacionarismo dessa fração burguesa e pequeno-burguesa, o PT teve no passado projeção eleitoral no Rio Grande do Sul. O MST se originou justamente nos estados sulistas. O movimento camponês, nessa região, expressou uma resistência à ofensiva da agroindústria, ao deslocamento de parcelas de pequenos agricultores e ao crescimento do número de sem-terra. Está aí por que confluiu com a organização do PT, nos anos 80. O Encontro de Cascavel, no Paraná, em 1984, que fundou o MST, indicou o ascenso do movimento reformista. Certamente, tratava-se de um fenômeno que não se limitava ao Sul do Brasil.
O Rio Grande do Sul, por ser o estado mais desenvolvido economicamente e mais avançado politicamente da região, possibilitou o florescimento das ideias e do movimento reformista, encarnado pelo PT. É preciso ter em consideração as heranças do nacionalismo burguês, que marcou e marca a história desse estado. A reação mais orgânica e radical contra o reformismo petista coube, principalmente, aos estados do Paraná e Santa Catarina. O PT não chegou a ganhar projeção eleitoral nesses dois estados profundamente marcados pelo conservadorismo pequeno-burguês. De maneira que o prato da balança pendia a favor do petismo no Rio Grande do Sul. A experiência com o democratismo e o reformismo se encarregou de mostrar a inviabilidade dessa política, tanto em nível regional, quanto nacional. Hoje, o governo do estado está nas mãos do MDB e a prefeitura de Porto Alegre, controlada por muitos anos pelo PT, está com o PSDB. O PT perdeu terreno também no controle de prefeituras, no Paraná.
Os escândalos de corrupção, a ofensiva da Operação Lava Jato e impeachment de Dilma Rousseff evidenciaram o fracasso do reformismo e o avanço da direita burguesa. Esse fenômeno de nível nacional, inevitavelmente, atingiu os estados do Sul. O fato da sede da Operação Lava Jato estar em Curitiba e o juiz Sérgio Moro concentrar em suas mãos o poder de caçar os petistas politizou pela direita, em particular, a região. A condenação de Lula e a possibilidade de sua prisão inflamaram as camadas burguesas e pequeno-burguesas reacionárias e organicamente antirreformistas e antipetistas.
A burguesia em geral, à exceção deste ou daquele representante a velha oligarquia nordestina, se colocou pela prisão de Lula. O PT e a Frente Brasil Popular tiveram de organizar a campanha de defesa de seu dirigente máximo. Destituído de poder, com a derrubada de seu governo, o PT foi empurrado para a oposição parlamentar e eleitoral. O que forçou os petistas a depositar esperanças nas eleições de outubro e, portanto, na candidatura de seu caudilho.
A CUT, o MST e as correntes que integram a Frente Brasil Popular canalizaram o descontentamento das massas, revoltadas com as reformas antinacionais e antipopulares da ditadura civil de Temer para a defesa da “democracia” e candidatura de Lula. Chegaram a desarmar o movimento grevista, que teve o seu ponto alto na greve geral de 28 de abril de 2017. Passada a onda dos movimentos contra as reformas trabalhista e previdenciária, o PT se lançou às caravanas.
Distintamente das facilidades de propaganda eleitoral entre os explorados nordestinos, a caravana petista, no Sul, foi confrontada pela reação. Setores da burguesia agrária e da pequena burguesia conservadora se organizaram para impedir a marcha da caravana. Montaram bloqueios e atacaram fisicamente os petistas e, em especial, Lula. Foi uma afronta ao direito democrático de manifestação política. Evidenciaram um traço fascistizante da oposição ao PT, ao MST e a Lula. As hostilidades refletiram a bandeira policial de “prisão a Lula”, bem como apoio a Moro e ao TRF-4. Esperavam o julgamento do último recurso de Lula no TRF-4, que todos sabiam que seria negado. É o que faltava para Moro ordenar a prisão. O fato do STF adiar a decisão sobre o habeas corpus frustrou essa expectativa. Toda imprensa questionou o STF e agitou a bandeira de prisão de Lula. O candidato Jair Bolsonaro, num gesto de clara provocação, armou um comício em Curitiba no dia do encerramento da caravana petista. Criou-se um clima de histeria contra o candidato do PT.
A caravana, quando percorria a estrada entre Quedas do Iguaçu e Laranjeiras do Sul, foi atingida por disparos, que perfuraram a lataria de um dos ônibus. Esse episódio se caracterizou por um atentado terrorista, que seguiu aos ataques sofridos pelos petistas em municípios do Rio Grande do Sul. O comício de Bolsonaro, que pedia a prisão de Lula e que deu apoio aos tiros contra a caravana, retratou perfeitamente a condenação política de Lula no processo da Lava Jato. Num primeiro momento, o governador de São Paulo e candidato à presidência da República pelo PSDB apoiou o atentado terrorista, culpando o próprio PT e Lula. Aconselhado a não se emblocar com a direita bolsonarista, Geraldo Alckmin, demagogicamente, voltou atrás, posando de pacifista. Temer e seu ministro Jungmann correram a dizer que se tratava de um ato “absolutamente inaceitável”. A imprensa, em franca campanha pela prisão de Lula, teve de lamentar o episódio, em nome da democracia.
Apenas as esquerdas rechaçaram a violência. A candidata do PCdoB, Manuela D’Ávila, exortou a união “para derrotar o fascismo”. O candidato do PSOL, Guilhermo Boulos, denunciou Jair Bolsonaro. Fernando Haddad, possível candidato do PT, caso Lula esteja impedido, qualificou o comício de encerramento da caravana, em Curitiba, como “início de uma nova campanha para derrotar os fascistas”. O PSTU, que defende a prisão de Lula, foi obrigado a denunciar os ataques.
É preciso caracterizar os disparos contra a caravana como um ato terrorista. O que não foi feito por nenhum dos candidatos da burguesia, que se limitaram a lamentar a violência. Nem mesmo o PT, até onde pudemos constatar, fez essa caracterização, apesar de denunciar como um ato fascista e um atentado à democracia.
Duas semanas antes, a ativista do PSOL, Marielle Franco, foi assassinada no Rio de Janeiro. Inúmeros têm sido os assassínios de camponeses e indígenas. O caso da caravana petista tem a particularidade de estar vinculado ao golpe de Estado, que derrubou Dilma Rousseff. O caso de Marielle, por sua vez, ocorreu logo após a intervenção militar de Temer no estado do Rio de Janeiro.
É bom lembrar que o movimento da direita burguesa pelo impeachment potenciou grupos e organizações antidemocráticos. A camada da classe média urbana mais acomodada tem servido de base a tais expressões políticas da reação. Não por acaso, desfraldou-se a bandeira de “volta dos militares ao poder”. Não se deve desconsiderar, também, o fato de Temer ter fortalecido a presença dos generais na política de governo.
Um acontecimento que não ganhou a devida proporção política foi o ataque aos venezuelanos, em Boa Vista, Roraima. Uma horda de 300 pessoas invadiu o abrigo e expulsou os imigrantes. Um dos líderes do ataque foi identificado como sendo o pastor evangélico João Batista, que acusa os venezuelanos de serem ladrões. Nesse interim, em Pocaraima, que faz fronteira com a Venezuela, foi organizado uma manifestação em protesto à construção de um abrigo na quadra de esporte. Esse movimento xenofóbico, sem dúvida, é parte do mesmo problema. Desenvolve-se, no Brasil, uma campanha contra o governo nacionalista da Venezuela, orquestrada pelos Estados Unidos. O golpe de Estado e a mudança de governo promoveram um realinhamento do País por trás da política norte-americana.
É visível o desenvolvimento das tendências autoritárias no seio do Estado. A profunda crise econômica, que recrudesceu entre 2014 e 2016, esteve e está na base dessas tendências. Observa-se que isso se passa em nível mundial. Em grande medida, a política da socialdemocracia internacional tem se esgotado diante da persistência da crise geral, aberta em 2008. É sintomático que, na Europa, venha emergindo as correntes e partidos francamente adeptos ao fascismo. O que não quer dizer que sejam iguais em toda parte. O fundamental é reconhecer as tendências antidemocráticas e ditatoriais, que se originam da política burguesa nas condições de desintegração do capitalismo. Está mais do que claro que, no Brasil, o golpe de Estado provocou uma ruptura democrática, não apenas por derrubar um governo eleito, mas por derrubar um governo que ainda conservava apoio popular. Ao se constituir uma ditadura civil, abriu-se caminho ao fortalecimento das posições direitistas, a exemplo do ex-militar Jair Bolsonaro.
Há uma propensão de uma ala da esquerda, inclusive do PT, de levantar a bandeira de uma frente eleitoral antifascista. A menção a essa bandeira foi feita pelo ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. O problema está em que as forças políticas de esquerda mais ligadas ao lulismo condicionam e limitam a resistência antifascista à disputa eleitoral. Por essa via, não é possível combater e derrotar as posições direitistas da burguesia, que não se restringem ao campo da reação que se articula em torno de Bolsonaro. Os principais candidatos que se vestem de democratas estiveram e estão comprometidos com o golpe de Estado e constituição da ditadura civil de Temer.
O combate sério e eficaz às tendências antidemocráticas, ditatoriais ou fascistizantes se dará por meio da luta de classes. Em outras palavras, pela luta independente do proletariado contra a frente golpista, que deu lugar à ditadura civil. É preciso retomar as reivindicações que levaram as massas à greve geral de 28 de abril e às inúmeras manifestações em todo o País. É a partir das necessidades mais prementes dos explorados que se pode potenciar as bandeiras políticas de fim da intervenção militar no Rio de Janeiro, direito de livre manifestação e de organização da autodefesa contra os ataques da reação. A bandeira de punição àqueles que fizeram o atentado terrorista contra a caravana de Lula e aos responsáveis pelo assassinato de Marielle deve se vincular à defesa de constituição de um Tribunal Popular. Devemos rejeitar, terminantemente, os pedidos para que a própria justiça burguesa puna os agressores. É nesses momentos que se deve mostrar aos explorados que nenhuma justiça será feita pela burguesia e seus governantes.
De nossa parte, chamamos o PT, a Frente Brasil Popular, o MST, a CUT, os sindicatos e os movimentos populares a organizarem uma frente prática, de mobilização e de combate à ditadura civil de Temer, propagandeando e agitando as reivindicações de emprego, salário, anulação da reforma trabalhista, fim da terceirização e retirada definitiva do projeto de reforma da previdência. Uma frente contra a intervenção militar no Rio de Janeiro. Uma frente que se apoie nos métodos e táticas da ação direta. Uma frente que se organize sobre a base de comitês de mobilização e autodefesa. Enfrentemos as tendências antidemocráticas, ditatoriais e fascistizante com a política do proletariado.
Não à prisão de Lula! Pelo direito de se candidatar!
Somente um Tribunal Popular pode julgar e punir o atentado terrorista contra o PT!