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02 abr 2020
Impactos econômicos e sociais da pandemia
Preparar o caminho para a retomada da luta da classe operária e demais explorados
31 de março de 2020
Está se confirmando a previsão de que a contaminação do coronavírus aceleraria o processo da crise econômica mundial. Embora o imperialismo e seus serviçais procurassem atribuir à pandemia a responsabilidade da desorganização mundial, os acontecimentos expõem a anarquia da produção social, os impasses do agigantamento do parasitismo financeiro, a guerra comercial, entre outros aspectos. Os monumentais recursos utilizados para amparar os interesses dos monopólios e dos sistemas financeiros, diante da hecatombe de 2008-2009, já haviam indicado o seu esgotamento, quando a pandemia se originou na China e se espalhou por toda a parte. A necessidade de lançar mão do “isolamento social”, em todas as potências e na maioria dos países de economia atrasada, levou a um abrupto estancamento nas economias nacionais e no mercado mundial. Essa situação antecipou o que viria a ocorrer um pouco mais tarde, segundo as previsões de organismos do próprio imperialismo, como o Fundo Monetário Internacional (FMI).
A burguesia, em certo sentido, foi salva pela pandemia. Passou a utilizá-la como principal motivo da derrocada econômica, para exigir dos Estados abundantes recursos, desativar a luta de classes, que avançava e atemorizava os capitalistas. Contou, para isso, com a crise de direção mundial do proletariado. Sem a resistência das massas, e com a colaboração das burocracias sindicais, os capitalistas e seus governos procuram formas de se protegerem e descarregarem a crise sobre os explorados.
O Congresso norte-americano, finalmente, aprovou o plano de US$ 2 trilhões. O Banco Central Europeu disponibilizou € 750 bilhões (US$ 809 bilhões). Somados com os gastos previstos de cada país da Europa, atingirão muito mais que US$ 1 trilhão. O G-20 estimou um gasto de US$ 5 trilhões. A maior parte desse caudaloso rio de dinheiro será canalizada para recompra de títulos, refinanciamento de dívidas, empréstimos, subsídios, etc. Uma pequena parte servirá para amenizar um pouco a contundência da crise social. A dívida pública dos países mais poderosos saltou de “59% do PIB, em 2007, para 91%, em 2013”, segundo The Economist. Esse salto leva à previsão de que o endividamento dos Estados crescerá em escala ainda desconhecida.
As potências suportam tamanha carga, estabelecendo juros negativos ou quase negativos. O fator fundamental, de um lado, porém, se encontra no saque aos países semicoloniais, que constituem a maioria; de outro, no aumento da exploração das massas e redução do valor da força de trabalho. Em última instância, os explorados e os débeis países pagam a orgia financeira das potências. Está aí a explicação do porquê o sistema de saúde público, e a proteção sanitária das massas, evidenciam a falência diante da pandemia. A Itália e Espanha, para citar dois países europeus mais afetados, exibem, não somente o horror das mortes causadas pelo coronavírus, como também a sua quebra econômica pré-existente, o empobrecimento da maioria da população, e a incapacidade do sistema de saúde. Certamente, a demora em implantar o isolamento explica a alta incidência de letalidade do vírus, mas somente em parte. O governo italiano se mostrou descontente, diante do pequeno montante de ajuda estipulado pela União Europeia. A Espanha seguiu a mesma linha. Não comportam mais endividamento, e não podem contar com uma “ajuda” do Banco Central e Conselho Europeu. A Alemanha teme um desequilíbrio nas relações monetárias e fiscais da Zona do Euro. O plano do Banco Central está voltado a atender os monopólios industriais, comerciais e o capital financeiro. O que, obrigatoriamente, marginaliza os países mais decadentes da União Europeia. Os interesses da Alemanha se sobrepõem aos dos demais países, que já não podem usufruir da Zona do Euro. O conflito da Itália e Espanha com a Alemanha, Áustria e Holanda retrata o imperativo das fronteiras e dos Estados nacionais. Cada um deve resolver o seu problema econômico e sanitário, embora a diretriz da Organização Mundial da Saúde (OMS) deva ser aplicada universalmente.
A virada de Trump pesou definitivamente na balança em favor do “isolamento social”. Na realidade, a maior potência se viu obrigada a liderar o movimento mundial de proteção aos monopólios e ao capital financeiro. Os Estados Unidos, não apenas passaram a ser o epicentro da crise sanitária, assim qualificado pela OMS, como não deixaram de ser o epicentro da crise mundial, eclodida em 2008. Avalia-se que US$ 2 trilhões é maior que o volume utilizado na quebra do subprime, que arrastou o sistema financeiro do país e do mundo. O alinhamento de Trump unificou as potências em torno do confinamento, mas não em favor de um plano único, que servisse de proteção aos países mais débeis economicamente, e mais afetados pela pandemia. Combinaram-se, assim, o fechamento parcial das fronteiras nacionais com o confinamento massivo da população. Não foram poucos os países que decretaram à força a suspensão de atividades econômicas e a reclusão das famílias.
As potências, com seus vastos recursos, se colocaram em posição de proteger suas economias internas, em detrimento da maioria dos países. Observa-se que essa via coincide com a tendência do protecionismo das potências e a guerra comercial, tendo à frente os Estados Unidos. A manutenção do bloqueio econômico ao Irã e à Venezuela mostra a que ponto chega a prepotência dos Estados Unidos, e o quanto são responsáveis pela ruína das economias desses países.
O abrupto estancamento das economias nacionais, e a provável recessão mundial, se converterão em destruição, em grande escala, de forças produtivas e queima de valores. Retoma-se o curso destrutivo de 2008-2009, podendo ser mais devastador. O desemprego e a pobreza mundiais darão um salto à frente. São sintomas da desintegração do capitalismo mundial, cujos marcos se encontram na Primeira e Segunda Guerra Mundiais. As forças produtivas já não cabem na camisa de força das relações de produção monopolistas e das fronteiras nacionais.
A reclusão de cada país, se defendendo das consequências econômicas e sociais da pandemia, potenciará a regressão mundial. A hipótese mais provável é a de que a guerra comercial tomará formas mais agressivas. O conflito entre Estados Unidos e China será retomado, em um patamar mais elevado. As manifestações do nacionalismo fascistizante e xenofóbico vão se ampliar e se acelerar. Essa probabilidade se assenta na maior submissão das economias dos países atrasados à voracidade dos países imperialistas, às disputas entre as potências, e ao empobrecimento generalizado das massas mundiais. Em particular, os países fornecedores de matérias-primas terão de ceder ainda mais à desnacionalização dos recursos naturais. Não por acaso, o petróleo compareceu, imediatamente, como um fator de grande peso na crise econômica que se avizinhava.
A América Latina estava mergulhando na queda econômica, quando a pandemia a cobriu como um vendaval. As três maiores economias – Brasil, Argentina e México – procuravam evitar a recessão, contentando-se com o baixo crescimento. A previsão para o Brasil, agora, é de crescimento negativo. A burguesia e seus governos levantam as mãos aos céus, pedindo que não se confirme a pior das previsões. Os países latino-americanos refratam a economia mundial e, internamente, refratam a interdependência econômica, tendo como carro-chefe o Brasil, Argentina e México. A nova etapa da crise, marcada pela pandemia, se caracteriza pelo crescimento do desemprego e subemprego, que já eram insuportáveis, desde o momento em que o continente foi arrastado pela crise mundial de 2008. O agravamento da pobreza, miséria e fome já está sendo contabilizado pelo Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial e Organização Internacional do Trabalho (OIT). Pedem aos governos que distribuam migalhas aos desempregados e subempregados, aos miseráveis e famintos, temendo que a potenciação da crise social resulte em levantes populares, como ocorreu recentemente no Chile.
A explicação ideológica de que a pandemia não tem classe, raça e nacionalidade sedimenta a orientação de que a união de todas as forças políticas é a condição para melhor enfrentar o coronavírus, seguindo as diretrizes da OMS. Concretamente, a “união nacional” resulta em submissão da classe operária e demais explorados às decisões da burguesia e de seus governos. Por cima deles, prevalece o alinhamento internacional, ditado pelo imperialismo às nações oprimidas. É sintomático que, no Brasil, o governo Bolsonaro procurou seguir os passos iniciais de Trump. Em outras palavras, implantar o confinamento seletivo da população considerada mais vulnerável à pandemia. A virada de Trump ajustou a linha geral do imperialismo, e Bolsonaro passou a destoar. Ocorre que a frente burguesa montada em torno da bandeira de “união nacional” já havia dado passos decisivos em favor do “isolamento social”. O ministério da Saúde seguiu o curso das pressões mundiais, mas o núcleo governamental não teve como fazer a mesma virada de Trump. O motivo está em que, do baixo crescimento econômico, o país despencará no precipício.
O violento “ajuste” fiscal ditado pelo capital financeiro se despedaçou. O próprio governo pediu ao Congresso Nacional medidas de emergência, que implicam a revogação da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Lei do Teto. Ao ser retirada a base da política econômica, traçada pelo ministro dos banqueiros, Paulo Guedes, o governo de Bolsonaro naufragará. Essa é a razão principal do núcleo militar do governo resistir à linha do “isolamento social”. É preciso acrescentar que Bolsonaro se viu pressionado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) a evitar uma pane na produção e no mercado. Os setores do comércio e serviços, juntamente com a pequena e média indústria nacional, temem a paralisia de seus negócios, crescimento de suas dívidas, e a possibilidade de falências em cascata. As multinacionais e grandes empresas nacionais têm como se valer de meios de proteção, como as férias coletivas, lay-off, etc. A teimosia do presidente da República em contrariar a diretriz geral do confinamento beira ao desespero. Não tendo como se apoiar em Trump, Bolsonaro se isolou interna e internacionalmente, dando margem a um movimento de frente burguesa, apoiado nos governadores e nos principais partidos do Congresso Nacional, pelo confinamento. A oposição, liderada pelo PT, aproveita para pleitear a responsabilização do presidente da República, e pedir a sua renúncia, ou impeachment. O Brasil, como se vê, está diante da crise sanitária, econômica e política, que se entrelaçam.
Essa situação favorece a confusão reinante entre os explorados. Não veem outra solução, senão a do confinamento geral (“horizontal”), e a do parcial (“vertical”). A luta intestina no interior da política burguesa visa a manter a classe operária e demais oprimidos submetidos aos planos que protegem os capitalistas, e sacrificam a maioria. Não há divergência entre Bolsonaro, governadores e Congresso Nacional quanto a despender recursos para os empresários, e dar-lhes poderes para recorrerem a férias coletivas, redução da jornada com redução salarial, suspensão temporária dos trabalhadores e liberdade para demitir.
O esvaziamento das grandes fábricas e o funcionamento parcial de parte delas retiram da classe operária a capacidade coletiva de reagir diante da crise econômica, sanitária e política. A burguesia sabe que, com o proletariado desorganizado e pulverizado pelo confinamento, as demais camadas de trabalhadores e populares não têm como empunhar um plano de emergência, e marchar sob sua estratégia própria de poder. É nessas condições que a burocracia sindical se alinha com as forças políticas que conduzem o confinamento. Apoia o chamado à “união nacional”. Ao lado de reivindicações emergenciais corretas, desfralda apoio ao empresariado, em nome da proteção ao parque produtivo. Essas mesmas forças burguesas estão de acordo com Bolsonaro, de que o plano de emergência inclui a redução da jornada com redução salarial, suspensão do trabalho com redução salarial, etc.
No momento, trata-se de lutar pelo rompimento das centrais, sindicatos e movimentos com a política de conciliação de classes, com a “união nacional”. Trata-se de propagandear e explicar o programa de emergência próprio da classe operária e demais explorados. Trata-se de preparar o terreno para resistir ao desemprego, subemprego, fome e miséria. E trata-se de demonstrar aos explorados que o capitalismo é um regime social em decomposição, e que deve ceder lugar ao socialismo, por meio da revolução proletária, que se inicia num país, e se desenvolve internacionalmente. É preciso aproveitar a situação para evidenciar a crise de direção revolucionária, e trabalhar pela reconstrução do Partido Mundial da Revolução Socialista, constituído pela III Internacional, da época de Lênin, e mantido programaticamente pela IV Internacional, da época de Trotsky.