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09 maio 2020
Pior dos mundos para a classe operária e demais explorados
Suportam o maior peso da crise sanitária e econômica
Editorial Massas 609, 10 de maio de 2020
Bolsonaro age para que as fábricas, comércio e serviços voltem a funcionar plenamente. Doria, aliados, parte do Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) persistem no isolamento social. Nesse embate, os governadores admitiram o meio-termo – flexibilizar gradualmente.
A divergência em torno à política burguesa de isolamento tem em sua base os interesses gerais dos capitalistas. Isso impulsiona a discussão interburguesa, se convém arcar com as consequências econômicas provenientes do confinamento, para garantir o futuro; ou arcar com as consequências sanitárias provenientes da volta às atividades produtivas e comerciais, para diminuir os impactos econômicos.
A retórica da politicagem se transformou em “cabo de guerra” entre o poder central e os poderes regionais. Ou seja, entre a presidência da República e os governadores. Quem acabará decidindo é o poder econômico. É o que vem acontecendo com as dificuldades crescentes dos governadores, de manterem o isolamento social, precisamente quando crescem, exponencialmente, a contaminação e as mortes, em vários estados.
O receio inicial, de que o País não contasse com uma estrutura médico-hospitalar, para amparar infectados em massa e mortes instantâneas crescentes, apesar de ter um sistema público de saúde (SUS), louvado pelos governantes aos quatro ventos, se confirmou. Os governadores e prefeitos, responsáveis pela degradação do SUS, tanto quanto o governo federal, e pelo apoio ao sistema privado, contam nos dedos os leitos e as UTIs. O isolamento parcial – não é possível, no capitalismo, estabelecer o isolamento geral – é a forma de retardar o avanço da contaminação e graduar no tempo as mortes.
A experiência mostrou, não apenas a eficácia mais ou menos limitada do isolamento social, para conter a pandemia, mas também a enorme incapacidade da saúde pública, para proteger os pobres e miseráveis. Essa relação diz respeito à situação da maioria da população, diante da avassaladora contaminação. A minoria rica – burguesa e alta classe média – guarda outra relação de classe com o coronavírus. Podem se proteger com o isolamento que for necessário, e contam com o avançado sistema médico-hospitalar privado. É por cima da maioria oprimida, que Bolsonaro e governadores medem força com seu “cabo de guerra”.
Apesar da crise que dilacera o governo federal, são os governadores que cedem terreno. Já não conseguem sustentar o isolamento nos níveis exigidos. As mortes dão saltos dantescos. O SUS está em via de colapso. Os cemitérios se apequenaram. Nos estados mais atingidos, tendo São Paulo no epicentro, se prescreve o fechamento total (lockdown). Mas, se sabe que apenas se remediará. A infecção se instalou nas vastas camadas de pobres e miseráveis. E as necessidades prementes de existência as empurram ao trabalho. Os assalariados, ligados à produção e ao comércio, são puxados pelos capitalistas, que dizem ter chegado ao limite da sustentabilidade econômica.
Ontem, 7 de maio, o País assistiu a uma cena inédita na política burguesa. Uma comitiva de empresários, representando várias Associações da Indústria, liderada por Bolsonaro, e rodeada de ministros, entre eles, Paulo Guedes, se dirigiu ao STF, para cobrar uma posição de seu presidente, Dias Toffoli, sobre a flexibilização do confinamento social. A procissão empresarial adentrou ao recinto, e obrigou o ministro do STF a manobrar com o discurso de união entre os entes federados. Com esse gesto, Bolsonaro indicou o STF como um dos obstáculos ao retorno às atividades econômicas. Concretamente, o STF havia desautorizado o poder central de disciplinar a política dos governadores e prefeitos, afirmando a autonomia federativa. A resposta de Bolsonaro, seguindo conselho de Toffoli, e ainda que tardia, foi a de baixar um decreto, que classifica a construção civil (especificamente) e atividades industriais (gerais) como essenciais. Anulou, na prática, portanto, a decisão do STF, com esse ato de força. Assinalou, assim, que se os ministros togados discordarem, que se batam contra o poder econômico. A pandemia dinamizou, ao mesmo tempo, as crises econômica e política, que não foram superadas pelo golpe de Estado de 2016.
Depois de dois meses de pandemia, se pode ter um balanço, quanto ao fundamental. Oficialmente, as mortes saltaram para 9.265, com 137 mil contaminados. A Covid-19 continua a avançar em todo o País. Essa é a face da crise sanitária. A da crise social, se evidencia com as longas filas daqueles que precisam dos R$ 600, com a redução salarial, demissões em massa, inchaço do subemprego e informalidade.
A classe operária e demais explorados foram empurrados ao pior dos mundos. Fragmentados, individualizados, dissolvidos e temerosos, não puderam se defender, com reivindicações e métodos próprios de luta. A saída do precipício passará por uma ampla revolta e pelo rompimento do muro de contenção, levantado pela política de conciliação de classes das direções burocráticas, que controlam as centrais, sindicatos e movimentos. Somente a classe operária, organizada e apoiada na democracia das assembleias, pode enfrentar a próxima etapa da crise capitalista, erguendo sua resposta própria à catástrofe da pandemia e crise econômica.