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10 jun 2020
Resolução do Partido Operário Revolucionário (POR) sobre as crises pandêmica e econômica
- A desaceleração econômica mundial estava em curso, quando a pandemia se manifestou. As suas consequências têm sido tão profundas, que se constituiu em um marco de uma nova etapa de desintegração do capitalismo, marcada pela eclosão da crise nos Estados Unidos e no mundo, em 2008. A recessão mundial, que se apresentou nesses três meses de pandemia, expôs o impulso da destruição maciça de forças produtivas;
- Os organismos internacionais do imperialismo estimam a eliminação de dezenas de milhões de postos de trabalho. O desemprego será ainda mais elevado às alturas, nos próximos meses. A perda salarial ocorre em toda a parte. A miséria estrutural dos países semicoloniais receberá novos contingentes, e será mais agravada. Não se trata de previsões que podem não ocorrer. Já nesses 90 dias de pandemia, a queda econômica é generalizada, bem como as demissões em massa. É o que se verifica, inclusive, nas potências. Os Estados Unidos continuam no epicentro da crise mundial, potenciados pela pandemia;
- As massas mundiais vivenciam a incapacidade da burguesia de defendê-las diante do perigo, que, inicialmente, parecia se restringir a um fenômeno da natureza. O desenvolvimento da crise sanitária, no entanto, expôs os seus condicionamentos econômicos, sociais e políticos. Já não se verifica apenas o saldo de milhares de mortos pelo coronavírus – no momento, mais de 400 mil –, mas também os milhões que perdem seus empregos, os milhões de trabalhadores informais, que já não conseguem ganhar o pouco que ganhavam anteriormente, e os milhões que são empurrados da pobreza à miséria. A combinação da crise sanitária com a crise econômico-social reflete e impulsiona a decomposição do capitalismo;
- O Brasil é um dos países que mais sente dessa combinação catastrófica. É líquido e certo que, em 2020, ocorrerá uma queda no PIB acima de 5%. Há estimativas que indicam próximo a 10%. Para uma economia que enfrentou uma recessão de dois anos seguidos (2015-2016) – considerada a maior da história econômica do País –, que mal conseguia um crescimento vegetativo nos três anos seguintes, com tamanho tombo, avançarão em grande escala o desemprego, subemprego e miséria estruturais;
- O fato de a pandemia ter contaminado, segundo dados oficiais, cerca de 700 mil, e tirado a vida de quase 40 mil, estar em fase ascendente; e o fato de os governos decidirem, generalizadamente, retomar as atividades econômicas, retratam o fracasso da burguesia em combater a pandemia, e proteger a vida da maioria oprimida. Essa constatação geral conduz à conclusão de que fracassou a política burguesa de isolamento social;
- Os protestos massivos nos Estados Unidos puseram às claras que não há outra via para os explorados, senão reagirem à crise pandêmica e econômica, com seus próprios métodos. Mesmo no auge da aplicação da política burguesa do isolamento social, trabalhadores brasileiros da saúde tiveram de se manifestar coletivamente, bem como trabalhadores de vários ramos de atividades usaram a greve e as assembleias para exigir os salários e os empregos. Ainda que pontuais e isoladas, tais manifestações expressaram a única via de resistência da classe operária e demais explorados. Mas, foi a explosão popular contra o assassinato do trabalhador negro nos Estados Unidos, George Floyd, que deu o ponto de partida da retomada do movimento internacional. Ao saírem às ruas, os manifestantes superaram o medo inoculado pela campanha burguesa;
- O retorno às lutas, quando ainda não se esgotou o ciclo da pandemia, e as mortes continuavam e continuam altas, coincide, por sua vez, com as pressões do poder econômico para acabar com o isolamento social. Ficou claro que o confinamento de parte das massas seguiu determinações da burguesia, independente das necessidades da maioria explorada. Ainda que tenha provocado divergências e grandes discussões no interior dos governos, sempre seguiu cálculos elaborados pelos agentes do capital. As considerações médico-científicas, provenientes das instituições internacionais e nacionais, estiveram subordinadas aos cálculos e interesses do grande capital. Está aí por que o fracasso do isolamento social era previsível. Desgraçadamente, quem está pagando pela incapacidade da burguesia e seus governantes são as amplas camadas da população, de pobres e miseráveis;
- Falsearam-se a natureza e o alcance do isolamento social, precisamente, porque se ocultou o conteúdo da política burguesa que o dirigia e o manejava, seguindo os interesses do poder econômico, e da impossibilidade de dar resposta universal à ação da pandemia sobre a maioria empobrecida e miserável. As falsificações que envolveram a aplicação do confinamento tiveram enorme impacto sobre a vida social, porque as direções sindicais e partidárias, vinculadas ao movimento dos explorados, se submeteram à política burguesa do isolamento social. Colaboraram, direta ou indiretamente, para que os governos e os capitalistas descarregassem a crise sobre as massas;
- A classe operária e demais explorados, submetidos à política burguesa do isolamento social, não tiveram como se defender com um plano de emergência, democracia proletária, método e estratégia próprios. Todos aqueles que não demonstraram o conteúdo burguês das medidas tomadas pelos governos, e que se submeteram às pressões do isolamento social, acabaram colaborando, de uma forma ou de outra, com a burguesia. Eis por que não se colocaram em uma posição de independência diante das divisões interburguesas e das manobras governamentais. Negaram ou ocultaram a premissa da luta de classes, de que somente a classe operária na produção social e organizada independentemente poderia se levantar com uma política própria, em contraposição aos interesses do poder econômico, e em defesa dos interesses da maioria oprimida;
- A revolta popular nos Estados Unidos comprova essa premissa. A classe operária organizada e com seu plano próprio de emergência poderia enfrentar, ao mesmo tempo, as crises sanitária e a econômica. Em hipótese alguma, os explorados podem confiar seu destino aos exploradores, aos seus escravizadores e aos seus esfomeadores. Somente as direções de má fé, ou aquelas decompostas pelo cretinismo pequeno-burguês, poderiam acreditar e trabalhar para que os explorados acreditassem que o isolamento social, dirigido pelos governos burgueses, estaria a serviço da proteção da vida dos pobres e miseráveis. Por se colocarem em uma posição seguidista, agiram contra as mobilizações em meio à pandemia. Os protestos isolados, no transcurso da crise sanitária, e, agora, a gigantesca mobilização em várias partes do mundo, deixaram essas direções na retaguarda;
- A revolta instintiva dos explorados, no entanto, expõe a terrível crise de direção revolucionária. As direções colaboracionistas e a esquerda centrista correm, agora, a sair da retaguarda, para se colocar à frente das mobilizações, com o claro objetivo de amortecer a luta de classes, e canalizar o descontentamento para o democratismo burguês e pequeno-burguês. É o que estamos assistindo nos Estados Unidos, e em vários países em que as massas reagem ao desemprego, subemprego, contrarreformas, pobreza, miséria e discriminação racial. Isso sem que tenham uma direção que expresse as necessidades concretas e transforme o instinto de revolta em programa e política revolucionárias. Não por acaso, não comparece nas manifestações a plataforma de reivindicações da classe operária e demais oprimidos. Sabemos, porém, que são essas as causas mais profundas que levaram as massas jovens, pretas e brancas, a inundarem as avenidas das grandes cidades dos Estados Unidos. E, sem dúvida, a desencadearem manifestações na Europa, África, Ásia e América Latina;
- No Brasil, os reformistas, democratizantes e esquerdistas seguidistas, que até ontem se colocavam contra as manifestações coletivas, antecipam a possibilidade de uma revolta operária e popular contra a burguesia e o governo massacrador, erguendo a bandeira abstrata de defesa da democracia. Procuram canalizar o crescente descontentamento da população para a solução parlamentar da crise política, que se agrava dia a dia. A bandeira de “Fora Bolsonaro” está claramente condicionada à via do impeachment. Independentemente do uso verbal que se faça da bandeira “Fora Bolsonaro”, tingindo-a de cores mais à esquerda, não há como livrá-la da estratégia do impeachment, manejada pela oposição burguesa. É sintomático que a esquerda oportunista tenha aderido ao impeachment. O retorno ao movimento de rua – contra a vontade das direções dominantes – teve esse conteúdo, encarnado pela política pequeno-burguesa. Não estiveram presentes as bandeiras da classe operária e demais explorados. Predominou o palavreado da “democracia” e do “antifascismo” abstratos;
- A pandemia teve uma projeção extraordinária na crise política. Ampliou e aprofundou a divisão interburguesa. As consequências econômicas, financeiras e sociais encurralaram o governo ultradireitista e fascistizante de Bolsonaro. Os choques entre os poderes da República desorganizam a política burguesa, que necessita de uma rígida centralização, para disciplinar as frações da classe capitalista, e conter a luta de classes. É desse conflito que emergiram a via institucional do impeachment, de um lado; e as ameaças de golpe militar, de outro. As manifestações dos bolsonaristas têm um claro conteúdo golpista, ao defenderem o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. E expressam o fascismo, ao exigirem a criminalização do comunismo. A gestação de um movimento de unidade da oposição, por seu lado, inclui até mesmo setores da direita liberal, indicando que a burguesia se prepara para uma eventual derrocada total do governo Bolsonaro, e a possibilidade de uma aventura golpista. Observa-se que se alargou o campo da oposição, que já não se limita aos reformistas. É necessário distinguir as tendências reais da crise, em relação às manobras políticas, tanto do governo quanto da oposição. O campo das manobras se constituiu entre o governo militarista e a oposição, investida da bandeira da democracia. As condições políticas para um golpe fascista não estão dadas, bem como não estão dadas para a derrubada do governo pelo impeachment. Esse conflito terá de ser resolvido ou dissipado no momento em que a crise econômica e social se manifestar plenamente, no próximo período;
- O fator decisivo que define o curso da crise política é a luta de classes. Os explorados ainda não se deram conta do golpe sofrido nesses meses de pandemia, embora sintam que foram empurrados ainda mais para a borda do precipício. O movimento democratizante, como uma via para desviar a ação revolucionária das massas, depende de um deslocamento da pequena burguesia. Ainda está por ocorrer uma separação entre as camadas mais pobres e as mais ricas, que serviram de base à ascensão de Bolsonaro. Os reformistas começam a tomar posição para criar esse conduto. A política de colaboração de classes com a burguesia passa a depender de como se desenvolverá a frente burguesa pela democracia. A luta independente dos explorados, diante da falência do governo bolsonarista, e da arregimentação da frente burguesa opositora (ou frentes burguesas), ocorrerá no caso da classe operária encarnar o programa de reivindicações próprias. Não é por acaso que as direções sindicais se negam a colocar em marcha um movimento em defesa dos empregos, salários e direitos trabalhistas. Isso quando as demissões se expandem, o subemprego se agiganta, e a miséria se alastra. É com o programa de reivindicações operárias e populares, que o proletariado pode encabeçar um movimento de maioria oprimida contra o governo e a burguesia, de conjunto;
- O ponto de partida está em responder às consequências imediatas da crise sanitária e da crise econômica. As demissões, reduções salariais e aumento de desemprego e subemprego atingem milhões. Está colocada a defesa da unidade entre empregados e desempregados, entre trabalhadores formais e informais, para enfrentar a pobreza e a miséria. Devem-se desenvolver entre os explorados as bandeiras correspondentes. A pandemia evidenciou ainda mais a incapacidade da burguesia de garantir um sistema de saúde à altura das necessidades das massas. Pôs à luz do dia o predomínio do sistema privado, que serve à minoria burguesa e a uma camada da classe média. A defesa da saúde pública converge para a tarefa de expropriar a rede privada, e fortalecer o sistema único estatal, sob o controle da classe operária e demais explorados. É nessas condições que se tornam visíveis os vínculos entre o mar de pobreza, as doenças, o sucateamento do SUS e o requinte dos hospitais privados. Sobre essa base, se coloca um plano de emergência de proteção à vida da maioria oprimida;
- As condições sociais e as relações econômicas em que a pandemia tomou conta do País dão a dimensão da brutal exploração do trabalho, da concentração de riqueza e do gigantesco batalhão de miseráveis. Não é de hoje que a carência de condições elementares e a fome de milhões são reconhecidas como estruturais do capitalismo brasileiro. É recorrente a exposição de indicadores que revelam tais condições, que vão, desde o grau de miséria absoluta, até a inexistência de água e saneamento nos grandes conglomerados de favelas e bairros operários pobres. A burguesia não resolveu e não resolverá a relação estrutural entre exploração, concentração de riqueza e miséria. Os programas voltados aos famintos – Bolsa Família, etc. – só fazem reforçar a constatação de que se agravam as condições estruturais da exploração capitalista e miséria. Dessa realidade social, se erguem as reivindicações que unificam a maioria oprimida, e se colocam os fundamentos e a estratégia da revolução proletária. É nas condições de profunda crise, como a atual, que se expõem os vínculos entre as reivindicações mais elementares e a estratégia de poder do proletariado, que é a do governo operário e camponês, como expressão governamental da ditadura do proletariado. As massas e sua vanguarda com consciência de classe somente podem defender, consequentemente, a vida dos explorados, estando sob o objetivo histórico de derrubar a burguesia do poder, e transformar a propriedade privada dos meios de produção em propriedade social, coletiva, socialista;
- O capitalismo se decompõe a olhos vistos. Prolifera a barbárie, inclusive, nas potências, como se observa nos Estados Unidos. O avanço da barbárie é a expressão da contradição entre as forças produtivas altamente desenvolvidas e as arcaicas relações de produção capitalistas, sob a forma última dos monopólios e do capital financeiro. Está aí por que o reformismo e os sonhos de humanizar o capitalismo são contrarrevolucionários. Vimos o quanto prejudicial tem sido a participação das direções políticas e sindicais reformistas no transcurso de enfrentamento à pandemia. Sujeitaram-se às determinações do grande capital e de seus governos. O reformismo vai às últimas consequências, na negação da luta da classe operária pelos empregos e salários. Essa conduta contrária à luta de classes e à organização independente do proletariado corresponde à defesa estratégica da democracia burguesa. Não por acaso, os reformistas são inimigos da democracia operária e da constituição de organismos independentes, que unificam o proletariado e o colocam como direção da maioria oprimida desorganizada. Enquanto os explorados não romperem a camisa de força do reformismo, não terão como combater pela superação da miséria e fome estruturais. O que depende de a vanguarda com consciência de classe encarnar, na teoria e na prática, o programa da revolução e ditadura proletárias. Somente assim se darão passos na superação da crise de direção nacional e mundial;
- É preciso ter claro que a desintegração do capitalismo e a barbárie não se expressam da mesma maneira e extensão nos países de economia avançada (imperialistas) e nos de economia atrasada (semicoloniais). De forma generalizada, a burguesia em todos os países descarrega as consequências da crise sobre a classe operária e demais trabalhadores. De forma particularizada, o imperialismo descarrega a crise sobre as nações mais débeis. Não há como os explorados se defenderem das consequências da desintegração capitalista, senão responder à opressão imperialista sobre a nação oprimida. Em plena pandemia, os Estados Unidos agiram no sentido de potenciar o nacionalismo imperialista e a guerra comercial. O fechamento das fronteiras nacionais e a utilização de fartos recursos emitidos pelos Bancos Centrais comprometem ainda mais a economia dos países semicoloniais. O preço das commodities caiu, as moedas se desvalorizaram em relação ao dólar, expatriaram-se fabulosos recursos, ampliou-se a especulação nas Bolsas de Valores, as matrizes das multinacionais ordenaram fechamento de fábricas, redução de emprego, cortes de salários, etc. Um dos agravantes tem sido a brutal elevação da dívida pública. O capital financeiro, no Brasil, não comprometeu nenhum centavo de seus ganhos, provenientes do saque do Tesouro Nacional. Ao contrário, foi protegido por medidas do governo, Congresso Nacional e Banco Central. Por cima das divergências no interior da política burguesa de isolamento social, imperaram os interesses do capital financeiro. O bloqueio das forças produtivas tem como um dos fatores básicos a gigantesca dívida pública. Após a pandemia, pesará ainda mais. As bandeiras anti-imperialistas e as tarefas democráticas do país semicolonial, entre elas a entrega das terras aos camponeses, somente podem ser encarnadas pela classe operária, como dirigente da maioria oprimida. O programa de expropriação da grande propriedade e do capital financeiro, nacionalização das terras, cancelamento da dívida pública e superação da miséria, é a condição inicial para libertar as forças produtivas das travas dos monopólios e do domínio imperialista. As reivindicações mais elementares dos explorados estão vinculadas a essas tarefas. Certamente, na etapa de desintegração do capitalismo que se abre com a pandemia, se tornará mais imperativa a organização da frente única anti-imperialista, que expresse a luta por um governo operário e camponês, e responda às tarefas democráticas e socialistas;
- O novo marco da desintegração mundial do capitalismo terá amplo desdobramento com as quebras econômicas, a guerra comercial e o avanço das tendências bélicas. A luta de classes, portanto, também ganhará novas dimensões. Os explorados, não apenas terão de se defender da destruição maciça de forças produtivas, como também de recorrer aos caminhos da revolução social. Verão com maior facilidade a relação entre a preservação da força de trabalho com as necessárias transformações socialistas. Desde já, é obrigatório desenvolver o programa das reivindicações mais elementares ligado ao programa socialista. A classe operária e a sua vanguarda estão em grande atraso diante dessa exigência objetiva e histórica. Os embates vindouros permitirão recuperar as derrotas, que impuseram um retrocesso em grande escala nas revoluções proletárias. As vitórias do capitalismo sobre o movimento mundial da classe operária estão vindo abaixo. Demonstram a impossibilidade do capitalismo de superar a contradição entre as forças produtivas e as relações de produção, que refletem o seu esgotamento histórico, e a necessidade da transição para o socialismo. É com essa compreensão que a vanguarda com consciência de classe tem de trabalhar pela construção do partido da revolução proletária no seio dos explorados. O Partido Operário Revolucionário, baseado nessa compreensão, luta pela reconstrução do Partido Mundial da Revolução Socialista, a IV Internacional.
Comitê Central, 7 de junho de 2020