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17 jun 2020
Ataque dos bolsonaristas à bandeira da revolução e ditadura proletárias
16 de junho de 2020
Não pretendemos responder aos vulgares e grosseiros comentários dos bolsonaristas sobre a bandeira do Partido Operário Revolucionário (POR), desfraldada na manifestação contrária às ameaças golpistas de Bolsonaro, e em defesa da democracia, ocorrida em 14 de junho, na Av. Paulista. Apenas assinalamos o ataque do senador Flávio Bolsonaro à consigna “Em defesa da revolução e ditadura proletárias”, e a investida do ex-deputado Roberto Jefferson, cuja biografia de corrupto é muito bem conhecida.
É necessário, ainda, fazer referência ao comentário do editor do “Metrópoles”, que divulgou a frase “Pura contradição: em ato pró-democracia, manifestantes pregam ´ditadura proletária´“. Comete o erro de identificar o POR com a extinta organização pablo-posadista, fundada em 1953, que se dissolveu no PT. Frisa, em tom de denúncia, que “o POR não tem registro na Justiça Eleitoral”, e conclui “não existe formalmente como partido”, não tendo, portanto, “representação no Congresso”. O mais relevante, porém, é a narrativa do jornalista do Globo News: “Todos dizendo que defendem a democracia. Apesar disso, a gente viu algumas faixas defendendo ditadura proletária”. E sentenciou como “inconstitucional”. No “Fantástico”, de 14 de junho, a reportagem da Globo voltou a acentuar a inconstitucionalidade da bandeira “Em defesa da Revolução e Ditadura Proletárias”.
No dia seguinte, publicamos uma breve nota de esclarecimento sobre a real identidade do POR. Em seguida, divulgamos um documento de 1990, “O que é o POR”. Ambos se encontram no site do partido www.pormassas.org, bem como no Jornal Massas, nº 612.
De fato, o POR não é legalizado. Não porque se nega a participar em eleições. Mas porque as leis que regem a legalização partidária são antidemocráticas. Foram talhadas para permitir somente a legalização de aparatos partidários da burguesia. As correntes de esquerda que conseguiram o registro dependeram de reunir fundos financeiros, e recorrer ao artifício de assinaturas, que nem sempre correspondem à real representação. É questão de tempo para que parte dessas correntes percam o registro, como indica o cerco da reforma política que impõe a cláusula de barreira. O POR tem por objetivo se construir como programa no seio da classe operária e da maioria oprimida. A sua legalização, se vier a ocorrer, depende da elevação da consciência política dos explorados, que imporão a existência de seu partido contra a vontade da burguesia e de suas leis antidemocráticas.
Sobre a inconstitucionalidade, referida pela imprensa, temos a dizer que apenas são constitucionais os partidos da burguesia, uma vez que o fundamento da Constituição é a propriedade privada dos meios de produção. De maneira que qualquer partido que se declare socialista, formalmente, é inconstitucional. É antiga a luta dos marxistas pelo direito democrático de lutar por um programa de transformação da propriedade privada dos meios de produção em propriedade social. Quem deve julgar o direito de o partido existir são os explorados, que constituem a maioria. Temos visto os bolsonaristas levantarem a bandeira, não só de fechamento do Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, mas também de criminalização do comunismo. Nota-se que não se tem dado importância à tal investida antidemocrática da ultradireita. Lembremos que, na década de 1940, o Partido Comunista foi cassado, e seus parlamentares expulsos do Congresso Nacional, embora estivesse adaptado ao capitalismo, e submetido à democracia burguesa.
Incontáveis vezes, em manifestações, o POR levantou a bandeira em defesa da revolução e ditadura proletárias. Dessa vez, a repercussão se deveu à conjunção de crises. Os atos pró-democracia vêm procurando responder à ameaça do governo Bolsonaro de recorrer ao golpe militar, caso avance o movimento institucional por sua destituição. São também uma contrapartida às inúmeras manifestações dos bolsonaristas, que defendem o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. Em resumo, que incitam um golpe de Estado.
O POR luta ao lado daqueles que estão contra os bandos fascistas, e contra qualquer forma de golpe. Tem por tradição a defesa das liberdades democráticas. O que não quer dizer que esteja obrigado a se colocar sob a bandeira geral de defesa da democracia. E não há nenhuma contradição em lutar ao lado das correntes políticas que erguem a bandeira da democracia contra o golpe. Para aqueles que defendem a democracia como um fim em si mesmo, não importa saber que não existe democracia em abstrato, e que se trata de uma forma de regime político, o mais avançado que a burguesia pôde constituir. Hoje, em estado adiantado de decomposição.
O marxismo revelou que a mais perfeita democracia não deixa de ser expressão e um meio da burguesia exercer sua ditadura de classe sobre o proletariado e demais oprimidos. Esse fundamento indica aos explorados que não devem se enganar e se sujeitar à democracia burguesa. Todos aqueles que levantam a bandeira em defesa da democracia precisam ocultar seu caráter de classe, ou seja, a ditadura de classe da burguesia. Não há oposição entre democracia e ditadura de classe, o que há é oposição entre regime democrático e regime ditatorial, seja bonapartista ou fascista. Ambos os regimes conservam a ditadura de classe da burguesia. A democracia pode melhor ocultar e disfarçar o domínio da classe capitalista sobre a maioria oprimida. Não se deve desconhecer que a mais avançada democracia contém elementos do regime ditatorial, que advêm do antagonismo entre as classes sociais, entre outros fatores.
Os reformistas insistiram, no passado, em encontrar um valor universal da democracia – uma essência. Assim, tiveram de eliminar o caráter de classe da democracia, e passar por cima das particularidades de cada país. Essa operação metafísica retira ou deforma as determinações econômicas e de classe da democracia vigente, concreta.
A democracia no Brasil não pôde superar sua origem oligárquica, uma vez que a burguesia manteve essa formação original, apesar de importantes mudanças e adaptações. Esse caráter corresponde, em última instância, ao atraso das forças produtivas do país, e ao domínio do imperialismo. É o que explica a constante instabilidade da democracia, golpes de Estado e longos períodos ditatoriais. Não faz muito tempo, em 2016, um golpe institucional derrubou o governo do PT, deu lugar a uma ditadura civil e, finalmente, o governo eleito assumiu feições militaristas, e põe em risco a continuidade da democracia oligárquica. De passagem, citamos o fato de o Congresso Nacional chegar ao ponto de ser controlado por bancadas fisiológicas e reacionárias. Bastam essas considerações para se perguntar que sentido tem a defesa da democracia. As direções políticas das manifestações pela democracia não esclarecem, afinal, se estão defendendo a democracia oligárquica. É decisivo ter claro essa caracterização, uma vez que o golpe de Estado se gesta no seio da democracia de carne e osso.
A luta democrática contra o golpe, para os marxistas, não tem um fim em si mesmo. Comparece como uma imposição das condições objetivas, para o proletariado desenvolver sua luta de classe contra o governo burguês golpista e, assim, se fortalecer como classe independente diante da burguesia. Nesse terreno, se criam as condições para erguer as organizações coletivas das massas, e desenvolver a estratégia própria de poder. Estamos distantes subjetivamente da revolução proletária, mas muito perto objetivamente, devido à desintegração do capitalismo, cujos reflexos na política burguesa são visivelmente sentidos.
A revolução e a ditadura proletárias não estão em choque com a democracia em geral, mas sim com o governo burguês do momento, e a democracia que o sustenta. Isso por que a ditadura do proletariado é de classe, o que só é possível historicamente se estiver assentada na democracia proletária. A luta democrática, portanto, não está em contradição com o programa da revolução e ditadura proletárias. Distintamente, a luta democrática de setores da burguesia e da pequena burguesia contra as ameaças de golpe de Bolsonaro se mostra limitada pelo caráter de classe da democracia burguesa. O que não ocorre com a luta democrática do proletariado.
O marxismo elevou a teoria do Estado ao seu ponto mais alto, com a sistematização e contribuição de Lênin para a fundamentação da ditadura do proletariado, como expressão da democracia proletária, e da transformação da propriedade privada dos meios de produção em propriedade social. Está aí por que a ditadura do proletariado corresponde à sua hegemonia de classe, conquistada por meio da revolução social. Essa hegemonia permanece enquanto a transição do capitalismo para o socialismo não se converter mundialmente em comunismo, regime social em que se extinguem definitivamente as classes e, portanto, se extingue a exploração do homem pelo homem. Não é o caso aqui de adentrar à experiência da degeneração da ditadura do proletariado pela política revisionista do estalinismo. Constata-se que a transformação da ditadura do proletariado em ditadura burocrática teve como antecedente a deformação da democracia operária, e que, finalmente, foi eliminada, com a burocratização e o processo de restauração capitalista. Apenas de passagem, afirmamos que a derrocada da ditadura do proletariado na ex-União Soviética provocou um retrocesso histórico incalculável. A crise de direção se tornou o grande problema a ser resolvido pela vanguarda com consciência de classe. Uma última observação sobre essa consideração. As correntes de esquerda, que se reivindicavam da revolução proletária, se adaptaram a esse retrocesso histórico, renunciando à estratégia da ditadura proletária.
É natural que a burguesia e seus ideólogos não admitam a existência da democracia proletária. Insistem que somente pode haver a democracia criada por ela, quando se ergueu como classe revolucionária, diante do modo de produção feudal e do regime monárquico. Ao se tornar uma classe parasitária e esgotada, a burguesia degenerou a democracia no seu berço de origem, e impossibilitou seu desenvolvimento nos países semicoloniais. O nazifascismo resultou da mais profunda decomposição da democracia na Alemanha. Concomitante a esse processo, a burguesia reprimiu sistematicamente o avanço da democracia proletária. Contou e conta, para isso, com as direções reformistas e traidoras. Não são compatíveis com a democracia burguesa, a existência e a potenciação da democracia, encarnada pelas massas oprimidas. As direções reformistas e colaboracionistas, ao assumirem a defesa estratégica da democracia burguesa, combatem a democracia operária, e a elevação da consciência dos explorados diante da tarefa da revolução proletária, que lhes cabe. Somente triunfará a revolução proletária e se constituirá a ditadura do proletariado nas condições em que se desenvolva a democracia revolucionária. A experiência plena, nesse sentido, se espelha na criação dos conselhos (sovietes) de operários, camponeses e soldados na Rússia, de 1905 e 1917. Os agentes da burguesia necessitam recorrer a frases absurdas, para opor ditadura proletária à democracia em geral.
O surpreendente dessa discussão – e o mais importante – se encontra nas condições objetivas da crise econômica e política, agravadas pela crise sanitária, por que passa o País. A democracia vigente, da qual faz parte o governo ultradireitista e golpista de Bolsonaro, se acha em completa contradição com as condições de existência da maioria oprimida. O desemprego, subemprego, baixos salários, pauperização no campo, miséria e fome estão em choque com a gigantesca concentração de propriedade e riqueza, controladas pela minoria burguesa. A democracia e a governabilidade se assentam nessa realidade social. Ou seja, na brutal exploração das massas e na barbárie. A pobreza e miserabilidade da maioria não é conjuntural, mas sim estrutural. Ocorre que o bloqueio das forças produtivas, encarceradas pelos monopólios, e obstaculizadas pela monstruosa dívida pública, agrava essa condição estrutural, e desmorona o que resta da democracia oligárquica. Está aí por que a democracia e a governabilidade, no país semicolonial, estão condicionadas pelo imperialismo. No caso do Brasil, principalmente, pelos Estados Unidos.
O período mais democrático da história republicana do Brasil se processou sob o governo reformista do PT. Que sobreviveu às crises políticas, graças ao excepcional crescimento econômico, e às ilusões de que seria possível superar a miséria, por meio de pequenas reformas e do assistencialismo estatal. Assim que o País foi atingido pela crise econômica mundial, e se deparou com a mais longa recessão, os partidos da burguesia se uniram em uma frente antidemocrática, e promoveram o golpe de Estado. Esse abalo evidenciou a predominância das tendências ditatoriais da burguesia sobre as democráticas. Não será com o palavreado de defesa da democracia que se mudará essa equação de forças.
No momento, o movimento pela democracia se encontra sob as bandeiras de “Fora Bolsonaro” e “impeachment”, ainda que existam diferenças entre as correntes. Essa via pressupõe uma ampla frente burguesa, e a transformação do Congresso Nacional em completa oposição ao governo. Mais ainda, implica o consentimento das Forças Armadas. Podemos, assim, afirmar que esse é o último recurso da burguesia no caso da crise política tornar a administração bolsonarista insustentável. E se tornará insustentável, caso as massas saiam às ruas para pôr fim ao governo burguês ultradireitista. Não se pode desconhecer que esse movimento, recém iniciado, mesmo que a pandemia continue matando os pobres, objetiva canalizar o descontentamento dos explorados para o terreno das disputas interburguesas. O que condiciona as suas tendências de revolta ao jogo parlamentar e eleitoral. Nada que se faça, nesse sentido, quebrará as tendências ditatoriais da burguesia, e o esmagamento das condições de vida da maioria oprimida. Nota-se que são duas tendências em choque, a revolucionária e a contrarrevolucionária.
A defesa do plano de reivindicações dos explorados, vinculado à estratégia de poder do proletariado, impulsiona as tendências democráticas e revolucionárias das massas, em contraposição às tendências antidemocráticas e contrarrevolucionárias da burguesia. Esse é o problema fundamental da presente situação, em que o governo ameaça se impor com um golpe de Estado. Evidentemente, o movimento pequeno-burguês pela democracia esteve e está muito longe de expressar essa realidade objetiva. A classe operária retorna aos seus postos na produção, desorganizada, golpeada e temerosa. A burocracia sindical empurrou-a para o isolamento social, de acordo com a política e os interesses da burguesia. As direções das centrais e sindicatos continuam amarradas na política burguesa de isolamento social, no momento em que o poder econômico já rompeu essa política, e os explorados sentem a necessidade de se lançarem à luta. Sem uma resposta própria, os trabalhadores foram afastados da produção social, e empurrados de volta ao trabalho, não podendo, portanto, se defenderem com suas próprias forças. Não por acaso, o movimento pela democracia não empunhou as reivindicações que unem a classe operária e demais explorados contra o governo Bolsonaro, e contra a própria oposição burguesa. Isso quando é um imperativo unir empregados e desempregados, em defesa dos empregos e salários; unir operários e camponeses contra a miséria e a fome.
Na manifestação de 14 de junho, o POR compareceu, não só com a bandeira estratégica, mas também com as reivindicações mais sentidas de defesa dos empregos e salários. Inclusive, propagandeou no cartaz a luta dos metalúrgicos contra o fechamento da Kostal, no ABC. O destaque da reportagem à bandeira da revolução e ditadura proletárias se deveu às condições objetivas da crise política por que passa o País. As demais correntes permaneceram agarradas à defesa abstrata da democracia, e à propaganda do “Fora Bolsonaro”. Isso explica o silêncio das esquerdas, que se reivindicam do marxismo, diante das imposturas da reportagem e dos ataques dos bolsonaristas à bandeira da revolução e ditadura proletárias.
A relevância desse acontecimento não indica que estamos próximos à revolução social. Indica que as condições objetivas estão maduras para o proletariado derrubar a burguesia do poder, constituir um governo operário e camponês, que expressará a ditadura de classe da maioria oprimida, a expropriação do grande capital, a transformação da propriedade privada dos meios de produção em propriedade coletiva, e a resolução das tarefas democráticas, como as da independência nacional, revolução agrária e erradicação da miséria. Partindo dessas condições objetivas, está colocada a luta democrática contra as tendências ditatoriais da burguesia, que, no momento, se concentram no combate ao governo militarista, fascistizante, antinacional e antipopular de Bolsonaro.
O caráter embrionário do POR e o desvio de uma importante parcela da vanguarda para o reformismo e centrismo configuram as dificuldades de superar a crise de direção revolucionária. É imprescindível a existência de um poderoso partido, organizado no seio da classe operária, para avançar a luta de classes no caminho da revolução proletária. A constituição do partido-programa é um passo importante para resolver essa tarefa. O POR é consciente da necessidade de se construir no seio do proletariado, e reconstruir o Partido Mundial da Revolução Socialista. A presença da consigna revolução e ditadura proletárias nos movimentos norteia a luta pela superação da crise de direção.