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28 maio 2022
Não naturalizar a guerra!
Trabalhar pela superação da crise mundial de direção
Massas 665 – editorial – 29 de maio de 2022
Completaram-se três meses de guerra na Ucrânia. A imprensa, no Brasil, e provavelmente na América Latina, já não tem dado muita importância. No entanto, não se têm sinais de um acordo de paz. Os Estados Unidos continuam forçando a continuidade do confronto. Os seus aliados europeus não podem se colocar por um recuo. E a Rússia se bate por controlar a região estratégica de Donbass.
A intenção explícita do governo Biden é a de levar, ao máximo, as forças armadas e a economia russas à exaustão. O que expressa o objetivo da potência do Norte de avançar o cerco econômico-militar à Rússia, e pôr fim ao governo nacionalista de Putin. A guerra na Ucrânia acabou por antecipar o caminho pelo qual os Estados Unidos desenvolvem o conflito com a China.
Na base das tendências bélicas e da escalada armamentista, estão os impasses da economia norte-americana, os seus amplos reflexos degenerativos na economia mundial, e o impulso dado à guerra comercial. Principalmente, a partir da debacle econômico-financeira de 2008, a “concórdia”, confabulada, desde meados dos anos de 1970, entre os Estados Unidos e a China restauracionista, se tem deteriorado e dado lugar à animosidade belicosa.
O estreitamento do mercado mundial, o baixo crescimento, a tendência à estagnação, a recessão (como a de 2009) e o gigantesco acúmulo de capital financeiro empurram os Estados Unidos a imporem novas condições comerciais em todo o mundo, e, fundamentalmente, à China. A Rússia é parte dessa ofensiva. As forças cegas da economia mundial – movidas pela contradição entre as forças produtivas altamente desenvolvidas e as relações de produção capitalistas – levaram o imperialismo a arriscar uma guerra com a Rússia, arrastando a Ucrânia para sua inclusão na OTAN.
Não estavam dadas as condições para uma guerra que se espalhasse pela Europa, mas estavam dadas para a utilização do povo ucraniano como bucha de canhão, conforme os objetivos expansionistas dos Estados Unidos e da União Europeia, de saltarem por cima das fronteiras da ex-repúblicas soviéticas. O que facilitaria concluir o cerco à Rússia, que controla vastos recursos naturais e conserva sua independência, mesmo nas condições de avanço do processo de restauração capitalista. É o que explica o envio, pelos Estados Unidos e aliados, de poderosas armas e abundantes recursos financeiros ao governo de Zelenski.
A Rússia tem capacidade militar para vencer rapidamente as Forças Armadas da Ucrânia, mas teria de se valer de uma carnificina arrasadora. O que não é possível nas condições de equilíbrio de forças mundiais. Os Estados Unidos se valem dessa vantagem para comparecer de “mãos limpas”, como se fossem a vítima dos russos, tal qual tem sido o povo ucraniano.
Ao prolongarem o confronto militar, e obrigarem a Rússia a se manter nos limites de Donbass, as potências passaram a naturalizar a guerra. Contam, para isso, com a divisão e a inércia da classe operária europeia e mundial.
O fato mais recente, noticiado pela imprensa, foi a decisão dos Estados Unidos de usarem a experiência da Ucrânia para justificar a escalada militar contra a China. O epicentro se encontra em Taiwan. Há muito, a Ilha, que historicamente faz parte da China, vem sendo armada com mísseis pela potência imperialista. Mas, neste momento, Biden anunciou a modernização do aparato bélico de Taiwan, expressamente referida à China, tomando por base o que se passa na Ucrânia.
O esforço dos Estados Unidos de criarem o novo bloco econômico com países da Ásia dá a dimensão do quanto a guerra comercial impulsiona a escalada militar. A tentativa de Biden de viabilizar a extinta “Parceria Transpacífico” pelo “Quadro Econômico do Indopacífico” será levada adiante no marco do recrudescimento do cerco militar à China.
Os Estados Unidos esperam que Putin não vá além de uma vitória de Pirro, que seria considerada uma derrota. Se assim ocorrer, Biden se concentrará em apertar o cerco econômico-militar à China. As discórdias entre os participantes da aliança montada contra a Rússia e no interior dos Estados Unidos têm tudo para se agudizar. É o que se verifica com a contestação da Turquia e Hungria às sanções econômicas contra a Rússia, e às negociações em torno do ingresso da Finlândia e Suécia na OTAN.
A crise econômica dará um salto à frente neste ano e no próximo, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). Nem bem a Pandemia arrefecia seu ímpeto mortífero, sobreveio a guerra da Ucrânia. O desarranjo das cadeias produtivas e do comércio mundiais se faz sentir na queda do crescimento econômico e no agravamento das condições de trabalho e de existência das massas oprimidas. A classe operária vai despertar para o sentido e consequências da guerra. Não há como prever com precisão. Mas, os ataques sofridos se chocam com a passividade e com a política de conciliação de classes que predominam nos sindicatos e movimentos.
A vanguarda com consciência de classe tem o dever de explicar o vínculo da guerra com a decomposição do capitalismo e com o salto dado à frente pelo desemprego, pobreza, miséria e fome. Deve fortalecer a campanha internacional do Comitê de Enlace pela Reconstrução da IV Internacional (CERQUI) pelo fim da guerra e pela organização independente do proletariado. Essa é uma das condições para impulsionar a luta pela superação da crise mundial de direção.