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12 fev 2023
Editorial, Massas 682, 12 de fevereiro de 2023
O encontro de Lula com Biden consta de um ponto fundamental, que é a exigência dos Estados Unidos para que o Brasil se alinhe à coalizão, portanto, à OTAN, em seu esforço de guerra contra a Rússia, que se trava em solo ucraniano. A posição de neutralidade aspirada pelo governo recém-empossado e pelo Partido dos Trabalhadores (PT) será questionada na reunião que ocorrerá na Casa Branca.
A recente visita do chanceler alemão, Olaf Scholz, ao Brasil, objetivou discutir com Lula o envio de munições para os tanques Leopard, e, evidentemente, um alinhamento à coligação imperialista chefiada pelos Estados Unidos. A notícia de que Lula não teria atendido à solicitação de Scholz veio acompanhada da informação de que o governo brasileiro tenderia à neutralidade e à posição de servir de intermediador entre as partes em conflito.
Mas, o chanceler alemão conseguiu de Lula uma mudança de versão quanto aos fatos. Anteriormente, o petista havia, de certa forma, justificado a invasão da Ucrânia pela Rússia, em função do cerco sofrido pela OTAN. Agora, o presidente brasileiro muda a versão desresponsabilizando os Estados Unidos e a sua coalizão europeia. É com essa nova fisionomia que Lula ouvirá de Biden a proposição de alinhar o Brasil por detrás das forças imperialistas que fizeram da Ucrânia bucha de canhão.
É bem provável que seja verdadeira a notícia de que será oferecida ao governo brasileiro a proposta de ativar as relações comerciais em torno à indústria militar e à produção de produtos de alta tecnologia, atando o Brasil às cadeias de produção avançada, controladas pelos monopólios norte-americanos, como é o caso dos semicondutores. A Base de Alcântara, que passou a ser utilizada pelos Estados Unidos, ainda é uma incógnita no jogo de pressões, que envolve a guerra comercial da América do Norte contra a China e o novo impulso à escalada militar dado sob as condições da guerra na Ucrânia.
Pouco antes do encontro de Lula com Biden, um caça derrubou um balão chinês que sobrevoava o território norte-americano. Segundo as autoridades chinesas, o artefato havia perdido a rota. O secretário de Estado americano, Antony Blinken, cancelou uma viagem à China, e Biden propagandeou a ideia de que os Estados Unidos sofreram uma violação de sua soberania. Esse episódio evidencia o agravamento da guerra comercial travada pelo Estado norte-americano contra o avanço chinês em conquistar espaço no mercado mundial.
A penetração dos produtos chineses na América Latina e o crescimento da dependência do agronegócio e commodities minerais em relação à China vêm provocando reações dos Estados Unidos e da União Europeia. É nas condições de recrudescimento da guerra comercial e de potenciação da escalada militar impulsionada com a guerra na Ucrânia que Lula enfrentará a crise econômica, que vem abalando a estabilidade política no Brasil. Nota-se o quanto a decomposição do capitalismo mundial tem afetado profundamente a América Latina e o Brasil, que detém um terço de seu Produto Interno Bruto (PIB).
O prolongamento da guerra na Ucrânia e a ampliação do cerco econômico à China tendem a destroçar ainda mais as relações mundiais. Eis por que se torna mais visível o espectro de uma pré-guerra mundial. A peregrinação do presidente da Ucrânia pelos parlamentos europeus, exortando um volume maior de armas avançadas, segue a estratégia do Pentágono de prolongar a guerra ao ponto de esgotar as forças da Rússia, que, no momento, retomaram a iniciativa na região de Donbass, antecipando à chegada dos tanques de guerra alemães e ingleses.
A Alemanha acabou cedendo às pressões dos Estados Unidos para que enviasse os tanques Leopard. O próximo passo será o envio de caças. O que tornará a intervenção da OTAN mais direta, e mais propensa a tornar a guerra mais ampla, podendo ultrapassar os marcos da Ucrânia. É sintomático que o presidente da França tenha declarado que o fornecimento de caças é possível. Até pouco tempo, a recusa ao pedido de Zelensky se devia ao risco de a OTAN se envolver diretamente no conflito e abrir caminho para um enfrentamento aberto com a Rússia.
A guerra completará um ano em 24 de fevereiro. Tudo indica que a reconquista pelas forças russas de parte significativa de Donbass não resultará em fim do confronto. Novas sanções econômicas à Rússia anunciadas pela Comissão Europeia e maior aparelhamento militar das Forças Armadas da Ucrânia correspondem à escalada bélica em pleno vapor.
O governo de Lula está diante desse quadro de crescente barbárie capitalista. Poderá manobrar por um tempo sob a diretriz da neutralidade, mas, diante de um maior agravamento do choque bélico, se verá pressionado por poderosos setores da burguesia nacional e pelos generais a se alinhar por detrás dos Estados Unidos e do seu bloco europeu. O primeiro sinal foi o de condenar a Rússia e livrar o imperialismo de responsabilidade, quando, de fato, as potências têm transformado a Ucrânia em bucha de canhão, para atingir objetivos expansionistas e anexacionistas. Não poderíamos esperar outra conduta de Lula e do PT, que encarnaram plenamente a política burguesa de dominação dos explorados. Inevitavelmente, caminhariam para posições pró-imperialistas.
A luta da vanguarda com consciência de classe é de unir o proletariado sob a bandeira de fim da guerra e por uma paz sem anexação, que garantam o desmonte do cerco da OTAN à Rússia, imponham a autodeterminação da Ucrânia, interrompam a escalada militar e obstaculizem o curso de uma conflagração generalizada. Esse combate somente pode se dar sob o programa da revolução e do internacionalismo proletário. O Comitê de Enlace pela Reconstrução da IV Internacional (CERQUI) chama a vanguarda revolucionária a combater nesse terreno de classe.