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03 set 2024
Em 3 de setembro de 1938, foi fundada a IV Internacional, tendo por base o “A agonia mortal do capitalismo e as tarefas da Quarta Internacional – Programa de Transição”. Um ano depois, em 1º de setembro de 1939, se desencadeou a Segunda Guerra Mundial, com a invasão da Polônia pelo exército de Hitler. A posição de Trotsky de erguer uma nova Internacional se gestou em 1933, quando Hitler foi nomeado como primeiro ministro pelo presidente alemão Paul von Hindenburg. Fato que ocorreu em 30 de janeiro de 1933. De sua expulsão da URSS em 1929 até a essa data, Trotsky concebia a possibilidade de reformar o sistema soviético e arrancar a III Internacional do controle da burocracia estalinista revisionista. A Oposição de Esquerda Internacional, portanto, se proclamava fração marxista-leninista. A ascensão do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (Partido Nazista), fundado em 1920, e sua projeção ao poder em 1933, se deveu, em grande medida, às traições da socialdemocracia e à política da III Internacional que se mostrou incapaz de organizar o combate do proletariado pelo poder.
De 1929 a 1932, a Oposição de Esquerda se dedicou à questão da potenciação do fascismo, formulando uma linha para um período de grande turbulência mundial. Assinalou que a retomada dos fatores da decomposição do capitalismo que levaram à Primeira Guerra Mundial se apresentavam mais potentes. As derrotas na Alemanha logo após à vitória do proletariado na Rússia bloqueariam o desenvolvimento da revolução socialista na Europa e mundialmente. O fascismo se despontava como o último recurso totalitário da burguesia para esmagar as tendências revolucionárias das massas. Somente o proletariado organizado poderia demover a pequena burguesia desesperançada de servir de instrumento da política burguesa ultradireitista fascistizante.
O VI Congresso da III Internacional, no entanto, aprovava uma linha ultraesquerdista, que se considerou ajustada ao que se denominou “Terceiro Período”. Os estalinistas acreditavam que a revolução estava às portas. Desconheciam a real situação da luta de classes que exigia a organização do proletariado como dirigente das massas. O Partido Comunista Alemão foi orientado a não constituir uma frente única com a socialdemocracia porque essa havia se tornado socialfascista. Essa linha permitiu ao fascismo canalizar a pequena burguesia contra o proletariado. O nazifascismo concentrou sua política no objetivo de destruir as organizações operárias e liquidar fisicamente suas direções.
Trotsky analisou pormenorizadamente os erros do “Terceiro Período”, evidenciando que a política ultraesquerdista conduzia o Partido Comunista Alemão a capitular diante das brutais pressões da crise. Indicou em 1931, portanto, cerca de dois anos antes da ascensão de Hitler ao poder, que “a vitória do fascismo na Alemanha significará uma ruptura no desenvolvimento da tradição revolucionária, o desmoronamento da Internacional Comunista, o triunfo do imperialismo mundial nos seus aspectos mais odiosos e mais sanguinários”. A III Internacional estalinizada seria um fator favorável à “ruptura no desenvolvimento da tradição revolucionária”.
Assim, em julho de 1933, Trotsky fez um chamado à “construir Partidos Comunistas e uma nova Internacional”. Essa decisão se mostrou historicamente necessária e impostergável. A tarefa de pôr em pé a IV Internacional se encontrava na razão direta do objetivo estratégico de derrubar a burocracia estalinista, varrer as forças restauracionistas e manter a defesa da URSS, fustigada pelos fascistas e ameaçada pela Segunda Guerra que se preparava. A Oposição de Esquerda respondeu passo a passo à movimentação das forças imperialistas em direção à guerra e às alianças que se formavam. Aplicaram-se rigorosamente o programa bolchevique e as diretrizes internacionalistas para a guerra imperialista. No centro de suas respostas, se encontrava a defesa incondicional da URSS e se expunha o imperativo de derrubar a burocracia que levava às últimas consequências as deformações revisionistas do estalinismo.
Nas condições objetivas da desintegração do capitalismo, da guerra que se avizinhava e dos alinhamentos de forças militares, Trotsky vai expondo as etapas e elos da burocratização e do abandono do marxismo-leninismo pela camarilha dirigente do Estado operário, de forma a estabelecer um prognóstico das tendências internas à URSS que abrigavam a possibilidade da restauração capitalista. Da posição inicial de reformar a democracia soviética pela via da luta fracional, encabeçada pela Oposição de Esquerda, Trotsky passa à caracterização de que a sedimentação da ditadura burocrática estava concluída e que para derrotá-la se colocava uma revolução política.
Em inúmeros escritos, expõe os fundamentos históricos da burocratização do Estado operário – edificado em um país atrasado do ponto de vista capitalista como a Rússia e arruinado pelos anos de guerra, que combinaram fatores da guerra mundial e da guerra civil. O programa da revolução política se distingue da revolução social precisamente devido ao reconhecimento de que a restauração estava a caminho, mas não concluída. Admite a possibilidade de a burocracia vitoriosa contra a Oposição de Esquerda levar a restauração às últimas consequências, o que implicaria a derrubada da URSS. A revolução política se tornou um guia da Oposição de Esquerda e do processo de construção da IV Internacional a partir de 1933.
Uma vasta documentação sobre os avanços e recuos da restauração, bem como dos marcos que indicavam a possibilidade da derrocada da URSS, forma o patrimônio programático da IV Internacional. Como marxista-leninista, Trotsky trabalhou incessantemente pelo fortalecimento da Oposição de Esquerda e pela constituição da IV Internacional, apoiando-se nas fases do processo histórico da Revolução de Outubro, da transição do capitalismo ao socialismo, da luta de classes mundial, das traições políticas, das derrotas do proletariado na Europa, principalmente, e, assim, nas fases do processo de burocratização do Estado operário como um fenômeno novo e determinado pela luta de classes internacional, em última instância.
O dirigente da Revolução Russa ao lado de Lênin não deixou de admitir a importância da derrota da Oposição de Esquerda Russa, das enormes dificuldades em manter a sua continuidade estando no exílio e, evidentemente, da grave fraqueza do movimento pela edificação da IV Internacional, como continuidade do Partido Mundial da Revolução Socialista, que caracterizou a III Internacional dos seus Primeiros Quatro Congressos, de 1919 a 1922.
As divergências e fracionamentos no interior da Oposição de Esquerda Internacional foram atrozes e refletiram a fraqueza de suas seções em assimilar as caracterizações de Trotsky sobre a emersão do termidor e a constituição da ditadura bonapartista nas entranhas do Estado operário. A IV Internacional tinha de obrigatoriamente combater o revisionismo estalinista e erguer o programa da revolução política, ao mesmo tempo enfrentar o imperialismo com a bandeira de defesa incondicional da URSS.
Vários de seus escritos revelam a consciência de que o problema fundamental naquela circunstância era o de conservar e defender as posições programáticas e ideológicas do marxismo-leninismo, bem como as experiências tanto da Revolução quanto da constituição do Estado operário e da URSS. Contava com as repostas das massas à guerra que se aproximava para modificar as relações de forças em favor da revolução política na URSS e da revolução social nos países capitalistas. A IV Internacional deixaria de combater na contracorrente e seria um fator decisivo para superar a crise de direção. Ao mesmo tempo, tinha claro que, se essa mudança na luta de classes não ocorresse, a burocracia se sedimentaria e o imperialismo encontraria melhores condições para golpear as conquistas da primeira revolução social vitoriosa e a transição do capitalismo ao socialismo.
Tornou-se uma questão de vida ou morte para a Oposição de Esquerda Internacional a elaboração de um programa que daria continuidade aos Primeiros Quatro Congressos da Internacional Comunista. Em meio a conflitos internos ao movimento, a perseguição sistemática a Trotsky, a ataques brutais da ditadura estalinista que chegou ao ponto de montar a farsa dos Processos de Moscou e a derrotas como a da revolução espanhola, emergiu o “Programa de Transição” e assim a organização mundial do proletariado, a IV Internacional.
Distintamente do nascimento da Primeira, Segunda e Terceira Internacionais, a IV Internacional ganhou a luz do dia nas condições de destroçamento das direções e da independência das organizações mundiais da classe operária. O “Programa de Transição” é iniciado com a seguinte premissa: “A situação política mundial no seu conjunto caracteriza-se antes de mais nada pela crise histórica da direção do proletariado”. Ao mesmo tempo, define que “os requisitos econômicos da revolução proletária atingiram já o mais elevado grau de maturidade que pode ser atingido sob o capitalismo”. (…) “Sem a revolução social, no próximo período histórico, toda civilização humana está ameaçada de ser arrastada para uma catástrofe. Tudo depende do proletariado, e antes de mais nada de sua vanguarda revolucionária. A crise histórica da humanidade reduz-se à crise de direção revolucionária”.
Trotsky foi assassinado em 20 de agosto de 1940, portanto, um ano depois do início da Segunda Guerra Mundial. A direção que deveria dar continuidade à luta pela consolidação da IV Internacional não se mostrou à altura de suportar o fortalecimento do aparato estalinista do pós-guerra. A participação da URSS na aliança imperialista, liderada pelos Estados Unidos, iria levar à dissolução da III Internacional em 1943. Essa traição ao programa do internacionalismo marxista-leninista se constituiria em mais um marco do revisionismo, que, para justificar sua política nacionalista, inventou a tese da possibilidade de construção do “socialismo em um só pais” e de “coexistência pacífica” com as forças do imperialismo. A URSS saiu da guerra preservada e fortalecida. A projeção do aparato estalinista acabou por golpear a direção da IV Internacional, que capitulou em meados de 1950 e levou à sua divisão e dissolução. A direção pequeno-burguesa evidenciou toda a sua incompreensão das formulações de Trotsky sobre o termidor e a inevitabilidade da derrocada da URSS caso o proletariado não encarnasse o programa da revolução política, como parte do programa da revolução social.
As inúmeras correntes que se reivindicam do trotskismo são produto do abandono do “Programa de Transição” e do total afastamento da tarefa de construir os partidos revolucionários no seio do proletariado, armando-se de um programa que se expresse as particularidades da revolução social em cada país. Em palavras, dizem que se apoiam no “Programa de Transição”, mas dele se divorciam na medida em que não constroem o partido elaborando o programa de revolução nacional, em suas particularidades, e internacional como expressão das leis gerais da transição do capitalismo ao socialismo. Não se pode confundir a miríade de correntes centristas que procuram se passar por “trotskistas”. A negativa em dar um passo concreto em favor da reconstrução da IV Internacional é um sintoma do abandono do “Programa de Transição”.
Os 86 anos da fundação da IV Internacional ocorrem nas condições de desmoronamento da ordem estabelecida pelos acordos da Conferência de Yalta, de fevereiro de 1945, que concluíram a Segunda Guerra Mundial. As forças produtivas reconstituídas voltam a se chocar abertamente com as relações capitalistas de produção. A partilha do mundo já não comporta as fronteiras nacionais. A guerra comercial, encabeçada pelos Estados Unidos em declínio, impulsiona as tendências bélicas. O processo de restauração capitalista – que liquidou a URSS, soterrou as mais avançadas conquistas da classe operária e arrastou a China para sua subordinação na ordem mundial regida pelo imperialismo – não solucionou a necessidade das potências estabelecerem uma nova partilha, que só pode ser o resultado de uma nova guerra mundial.
A guerra na Ucrânia, iniciada em fevereiro de 2022, colocou e coloca a via da confrontação da Rússia com a aliança imperialista montada pelos Estados Unidos e assentada no poderio militar da OTAN. A Europa se ressentiu do espectro das duas guerras mundiais. A ocupação da Faixa de Gaza pelas forças do Estado sionista de Israel, outubro de 2023, estremeceu a ordem já instável do Oriente Médio. O genocídio do povo palestino resulta e faz parte da dominação imperialista que se estabeleceu desde a Primeira Guerra Mundial. A abertura da China ao capital imperialista e seu ingresso nas relações mundiais do capitalismo já não podem sustentar o objetivo da coexistência pacífica que está na base da política de restauração do capitalismo.
A guerra na Ucrânia, a ocupação militar da Faixa de Gaza, o agravamento dos choques dos Estados Unidos com a China, o declínio da Europa, a agudização das disputas territoriais na África e a crescente instabilidade dos regimes políticos na América Latina evidenciam mais um período de decomposição do capitalismo da época imperialista. Objetivamente, trazem à tona o programa da revolução social que se sintetiza no “Programa de Transição” da IV Internacional. E ressaltam a necessidade histórica de retomar os elos das revoluções proletárias do século XX.
A crise de direção, sem dúvida, é mais profunda e ampla que a de 1938. A classe operária e sua vanguarda enfrentam uma regressão em suas conquistas, incluindo as mais elementares. Sobre essa base, os capitalistas contam a seu favor com a regressão ideológica e organizativa cuja responsabilidade do estalinismo é de ordem histórica. A vanguarda com consciência de classe que trabalha pela reconstrução da IV Internacional tem diante de si a tarefa de responder à regressão ideológica e política que bloqueia a organização independente do proletariado.
O Partido Operário Revolucionário, seção do Comitê de Enlace pela Reconstrução da IV Internacional, vem se esforçando por assimilar a luta heroica da Oposição de Esquerda e do movimento pela IV Internacional, liderada por Trotsky. O patrimônio programático e teórico do proletariado se materializou nas revoluções sociais. Delas fazem parte as derrotas e as traições das direções que se submeteram à ordem capitalista. A restauração capitalista e, sobretudo, a liquidação da URSS fazem parte das experiências que resultaram em contrarrevoluções. O marxismo-leninismo-trotskismo caracterizam o capitalismo da época imperialista de guerras, revoluções e contrarrevoluções. As contrarrevoluções apenas retardam a transição do capitalismo ao socialismo. De fato, preparam o caminho para novas revoluções de Outubro de 1917. A reconstrução do Partido Mundial da Revolução Socialista, a IV Internacional, é a condição para combater no dia a dia o avanço da barbárie capitalista que ameaça o futuro da humanidade.
Viva os 86 anos da fundação da IV Internacional!
Lutemos para pôr em pé o Partido Mundial da Revolução Socialista!
3 de setembro de 2024