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21 set 2024
Editorial do Jornal Massas nº 724
Guerras e escalada militar
Sem levantes da classe operária, avança a barbárie capitalista
O prolongamento da guerra na Ucrânia, que em mais alguns meses entra no terceiro ano, e da intervenção do Estado sionista de Israel na Faixa de Gaza, que no dia 7 de outubro completará um ano, marcam a fogo a crise mundial. Como pano de fundo, recrudesce a guerra comercial dos Estados Unidos com a China. A recente queda abrupta nas Bolsas de Valores iniciada no Japão é um sinal de que se aproximam convulsões econômicas mais amplas e profundas.
Nesse marco, emergem as crises políticas em vários países de alcance regional e internacional. As atribuladas eleições nos Estados Unidos estão no epicentro da decomposição das democracias burguesas. A Europa se viu estarrecida com a ascensão em dois estados da Alemanha do partido declaradamente nazista. Na França, as eleições parlamentares antecipadas por Emmanuel Macron aumentaram ainda mais a instabilidade política. Na América do Sul, as eleições na Venezuela foram motivos para os Estados Unidos exercerem uma forte pressão em favor da oposição pró-imperialista e pela remoção do regime chavista. Na Argentina, por sua vez, o governo ultradireitista de Javier Milei enfrenta resistência das massas às brutais contrarreformas.
O Brasil não escapa a esse quadro de instabilidade crescente. O governo Lula se sujeitou aos interesses da oligarquia, e a ultradireita força caminho para retornar ao comando do Estado. Essa polarização se reflete nas eleições municipais.
Na África, vários conflitos resultam em enfrentamentos armados, e mesmo em guerras civis. A situação econômica e política no sudeste asiático se movimenta sob a projeção da guerra comercial entre potenciais imperialistas e a China.
Os explorados em todo o mundo se ressentem da alta concentração de riqueza em poder da minoria capitalista e avanço da pobreza e miséria. Greves e manifestações ocorrem frequentemente, mas isoladas e controladas pelas direções pró-capitalistas e mesmo pró-imperialistas. Não deixam, porém, de refletir as tendências ao agravamento da luta de classes, por meio da qual os explorados influenciam o curso da crise mundial do capitalismo e podem erguer seu programa próprio e suas organizações independentes das forças burguesas.
Evidentemente, devido às direções pró-capitalistas e pró-imperialistas, que bloqueiam os sindicatos e sufocam os instintos de revolta das massas, a luta de classes se acha em atraso diante das contrarreformas, do aumento da pobreza, do recrudescimento da opressão nacional e das guerras em andamento. Esse atraso põe à luz do dia o significado histórico da crise de direção.
O imperialismo, tendo à frente os Estados Unidos, se acha com as mãos livres para gestar e promover as guerras, que destroem forças produtivas e impõem pelas armas os saques. As guerras na Ucrânia e Faixa de Gaza emergem da decomposição da ordem estabelecida após a Segunda Guerra Mundial. Distinguem-se das inúmeras guerras anteriores – Vietnã, Iraque, Síria, Líbia, Afeganistão etc. – pela sua projeção mundial. Ou seja, por colocar os Estados Unidos e aliados em posição de guerra com a Rússia e a China.
A derrocada da URSS – um objetivo histórico do imperialismo e motivo da criação da OTAN e, consequentemente, da formulação da estratégia da “Guerra Fria” – e as reformas restauracionistas assumidas pelo Partido Comunista da China não resolveram as contradições do capitalismo da época imperialista. As suas incorporações na ordem burguesa comandada hegemonicamente pelos Estados Unidos acabaram por evidenciar o esgotamento histórico do capitalismo.
A partilha do mundo da Segunda Guerra implicou acomodar a influência da URSS, por ter feito parte da aliança vencedora e ter sido fundamental para levar a Alemanha e o Japão à derrota. Essa partilha foi progressivamente perdendo vigência na medida em que a hegemonia norte-americana se impunha, as revoluções iam sendo contidas e a contrarrevolução esmagava a luta de classes mundial. Nesse terreno de estancamento do processo revolucionário, as tendências restauracionistas se agigantaram e desmoronaram as conquistas revolucionárias no Leste Europeu, empurraram a URSS para o precipício e abriram as comportas da China à penetração do capital imperialista, bem como facultaram o desmonte do sistema estatal originado na revolução de 1949 e gestaram o impulso das relações capitalistas de produção.
As vitórias do imperialismo após a Segunda Guerra – apesar da fervorosa vitória do Vietnã na década de 1970 – sendo as mais importantes a interrupção provisória da transição do capitalismo ao socialismo, prepararam o caminho para a nova etapa de desintegração do capitalismo que hoje se manifesta abertamente.
O perigo de a guerra na Ucrânia colocar frente a frente a OTAN e a Rússia e a guerra na Faixa de Gaza se ampliar com os ataques de Israel ao Líbano, Síria e Irã vem se tornando mais sensível. No dia 22 de setembro, ocorrerá a “Cúpula do Futuro”, da ONU, em Nova Yorque. Eis a apreensão de seu Secretário-geral, António Guterres: “Conflitos ferozes estão infligindo um sofrimento terrível. Divisões geopolíticas profundas estão criando tensões perigosas, multiplicadas por ameaças nucleares (…). E não temos uma resposta global eficaz para as ameaças novas e até mesmo existenciais.”
A invasão, pela primeira vez, do território russo pelas forças ucranianas e a possibilidade da aliança imperialista autorizar bombardeios com mísseis de longo alcance levaram a Rússia a retomar a ameaça do uso de armas nucleares. Esse é o ponto nevrálgico a que chegou a guerra. No Oriente Médio, Israel amplia seu raio de ação, negando-se até mesmo um cessar-fogo. A tentativa da China e Brasil de levar a Ucrânia e a Rússia à mesa de negociação tem sido rechaçada pelos Estados Unidos, que ditam as ordens ao governo ucraniano. Ao contrário de as potências caminharem para uma pausa na escalada militar, já se reconhece que o mundo está diante de uma “nova corrida nuclear” e que as “potências mergulham na primeira corrida nuclear do pós-Guerra Fria”. Elevam-se os orçamentos trilionários destinado ao militarismo.
Se a classe operária mundial não reagir a tempo, o imperialismo ampliará o horizonte de uma conflagração de dimensões incalculáveis. Somente um movimento revolucionário das massas pode erguer as barreiras à escalada militar e lutar com o programa da revolução social. É dever da vanguarda com consciência de classe trabalhar contra as guerras de dominação no campo da luta e da independência de classe.
Somente o proletariado pode combater a dominação imperialista com o programa de paz sem anexação e do direito à autodeterminação das nações oprimidas. É com esse mesmo programa que combate pela reconquista de posições revolucionárias diante da restauração capitalista.