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25 out 2024
Editorial do Jornal Massas nº 726
107 anos da Revolução Russa
Do capitalismo em decomposição emergem as guerras, e das guerras emerge o programa da revolução social
O capitalismo no século XX ficou marcado por guerras, revoluções e contrarrevoluções. A Primeira e Segunda Guerras Mundiais evidenciaram plenamente que o capitalismo da época imperialista se caracteriza pela contradição entre as forças produtivas altamente desenvolvidas e as relações de produção baseadas no capital monopolista. Faz parte dessa contradição as fronteiras nacionais que obstaculizam o livre desenvolvimento das forças produtivas. Um punhado de nações controla os monopólios, o capital financeiro, a ciência e a alta tecnologia. Essa posição na economia mundial lhes permitiu dominar, colonizar e saquear a imensa maioria das nações. A alta concentração de riquezas e o mar de atraso e pobreza se elevaram a tal magnitude que se transbordaram e se transbordam em dilacerantes crises econômicas. A divisão do mundo em Estados nacionais já não pode servir ao desenvolvimento das forças produtivas. De forma que as crises econômicas se convertem em destruição de riquezas, choques de interesses entre as potências, escalada bélica e guerras. Recrudescem a exploração do trabalho e a opressão nacional.
A transformação do capitalismo da época liberal em capitalismo imperialista foi de qualidade. As forças produtivas altamente desenvolvidas passaram a se chocar com as relações de produção e com as fronteiras nacionais. As guerras da época liberal, que estiveram na base da formação dos Estados nacionais e superação definitiva do regime feudal, cederam lugar às guerras mundiais. Amadureceram-se as condições históricas para as revoluções proletárias.
O período de relativa estabilidade econômica das últimas décadas do século XIX deram lugar aos desequilíbrios estruturais do século XX. A passagem do capitalismo liberal para a época imperialista foi marcada pela Primeira Guerra Mundial, iniciada em 1914. É nesse marco que, em Outubro de 1917, o proletariado russo, aliado ao campesinato pobre, derrubou a burguesia e expropriou os meios de produção. Constituiu-se o primeiro Estado operário vitorioso.
O capitalismo da época imperialista, portanto, carrega em suas entranhas o seu esgotamento histórico e as premissas materiais de sua transição ao socialismo. Não por acaso, a Revolução Russa se gestou nas condições de putrefação do regime imperial czarista e de eclosão da Primeira Guerra. Entre 1905 e 1917, a classe operária russa marchou em direção à revolução e se apoiou na revolta dos camponeses contra o servilismo.
O Partido Bolchevique, surgido inicialmente como uma fração do Partido Socialdemocrata Russo, sob a liderança de Lênin, foi o fator decisivo para o proletariado se levantar em armas contra o governo liberal-burguês da Revolução de Fevereiro de 1917. Na Rússia – o mais atrasado país da Europa -, a revolução socialista rompia um dos elos débeis da cadeia de dominação imperialista e iniciava a transição do capitalismo ao socialismo.
O envolvimento das inúmeras nacionalidades oprimidas pelo império russo na revolução foi imprescindível para o triunfo do proletariado. A defesa pelo bolchevismo do direito à autodeterminação e de separação da nação oprimida pôs à luz do dia que somente o programa da revolução proletária pode acabar com a dominação de classe e nacional. A constituição da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) em 1922 comprovou na prática a justeza da orientação marxista-leninista.
A URSS se ergueu como posto mais avançado da luta internacional pela transição do capitalismo ao socialismo. A fundação da III Internacional deu origem ao Partido Mundial da Revolução Socialista. Com esse instrumento, preparava-se o combate ao imperialismo que voltava todas as suas forças para derrubar a URSS e restaurar o capitalismo. A III Internacional refletiu não só a luta do proletariado russo, mas também a do proletariado mundial, que avançava no sentido de construir os partidos comunistas. A elaboração do programa nos seus Quatro Primeiros Congressos permitiu estabelecer uma orientação centralizada no objetivo das revoluções proletárias.
A necessidade de constituir a III Internacional surgiu antes da Revolução de Outubro. Nos primeiros anos da guerra imperialista, a II Internacional socialdemocrata não suportou as pressões nacionais e sucumbiu agarrada ao socialchauvinismo. Evidenciou que sua direção não havia aplicado o socialismo científico de acordo com a época imperialista, que é de guerras, revoluções e contrarrevoluções. A linha traçada por Lênin em combate à falência da II Internacional estava de acordo, portanto, com a marcha da revolução. E a socialdemocracia passava a auxiliar a contrarrevolução.
Os acontecimentos históricos mostram que a criação da III Internacional e a edificação da URSS formaram os dois pilares para enfrentar a contrarrevolução burguesa e impulsionar as revoluções proletárias. Lênin, tendo a seu lado Trotsky, não apenas indicou que a sustentação da Revolução de Outubro e o impulso das forças produtivas sob as novas relações de produção dependiam da revolução na Alemanha que se achava mais amadurecida para derrubar a burguesia, como também colocou toda energia do bolchevismo para erguer a cidadela da III Internacional e da URSS.
Nestes 107 anos da Revolução Russa, o proletariado não conta com nenhuma das duas conquistas de ordem estratégia para a revolução mundial. A III Internacional foi liquidada por Stalin em maio de 1943, quando a Segunda Guerra Mundial ainda estava em sua plenitude. Esse ato criminoso revelou a orientação contrarrevolucionária da ditadura burocrática soviética e do revisionismo estalinista do marxismo-leninismo. Foi um passo de grande importância para a consecução da política de coexistência pacífica e de subordinação da URSS aos ditames do imperialismo.
Sua orientação contrarrevolucionária se manifestou vigorosamente no combate à Oposição de Esquerda e nos monstruosos Processos de Moscou, que levaram finalmente ao assassinato de Trotsky. O movimento pela criação da IV Internacional se assentou no programa da revolução política voltado a derrotar da contrarrevolução restauracionista e no programa da revolução social, como continuidade do programa dos Quatro Primeiros Congressos da Internacional Comunista.
Os herdeiros de Stalin não poderiam garantir a manutenção da URSS, levando-a à derrocada em dezembro de 1991. O próprio Partido Comunista estalinizado se encarregou de preparar a hecatombe restauracionista. Serviu aos objetivos do imperialismo de liquidar a URSS e, assim, as conquistas da Revolução de Outubro. Interrompeu-se o processo de transição do capitalismo ao socialismo, ainda que provisório, cuja durabilidade depende da retomada das revoluções proletárias.
A vitória do imperialismo contra a Revolução Russa levou 74 anos para se realizar plenamente. Vitória essa que ocorreu nos marcos da decomposição do capitalismo, da retomada das crises, da escalada bélica e das guerras. O breve período de ajuste com o fim da “Guerra Fria” deu lugar a emersão dos velhos desequilíbrios, que estiveram nos alicerces das guerras mundiais. É parte desse processo a restauração capitalista na China e sua nova condição de potência baseada nas relações capitalistas de produção.
A guerra na Ucrânia, iniciada em fevereiro de 2022, resulta da fragilidade da Rússia diante dos Estados Unidos e sua aliança europeia voltados a anexar as ex-repúblicas soviéticas, subordinando-as à OTAN. O imperialismo impulsionou o rompimento dos laços econômicos e históricos da Ucrânia com a Rússia e levou as duas ex-repúblicas soviéticas à guerra. Na base desse acontecimento, se encontra a restauração capitalista, o retorno às raízes da opressão nacional e a necessidade do imperialismo de reconquistar o terreno perdido para a Revolução de Outubro.
A guerra de Israel, que começou contra os palestinos na Faixa de Gaza, se estendeu para o Líbano e chegou ao Irã, por sua vez, corresponde as mesmas causas da crise mundial do capitalismo.
É nas condições de ampliação dos confrontos gerados pelo imperialismo, tendo os Estados Unidos à frente, que emergem objetivamente o programa da revolução social e a necessidade das massas se colocarem no terreno das conquistas da Revolução Russa. As guerras alimentam a luta de classes e exigem do proletariado e de sua vanguarda respostas revolucionárias.
A crise de direção é um fato dramático, mas que vai se resolvendo em meio aos combates ao capitalismo. A construção dos partidos revolucionários vem se realizando, apesar da lentidão. Torna-se mais sensível à vanguarda com consciência de classe o imperativo de reconstruir o Partido Mundial da Revolução Socialista, a IV Internacional. Essas são as premissas que afloram nesses 107 anos da Revolução Russa.