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20 nov 2024
Mês da Consciência Negra – Manifesto do POR
Lutar pelas condições de vida das massas negras sob a estratégia da revolução socialista
O mês da Consciência Negra, em particular o dia 20 de novembro, que no Brasil faz referência a Zumbi dos Palmares e luta dos negros contra a dominação escravista, acontece neste ano de 2024 em um contexto de profunda decomposição do capitalismo, de avanço das tendências fascistizantes e xenofóbicas em todo o mundo, de atraso social e cultural das massas em geral, e aumento da opressão, sob todas as formas, contra os trabalhadores. Esse peso econômico-social destrutivo recai com um peso particular sobre a maioria preta e pobre no país. A partir dos aspectos gerais, brotam ramificações que dão um contorno preciso de até que ponto chegou a opressão capitalista sobre as massas negras no Brasil. As principais ramificações são a opressão sobre a força de trabalho e a violência e matança policial.
O capitalismo vai de uma bancarrota a outra. Mal começa uma recuperação tímida de uma crise, e outra sobrevém, não permitindo que a economia mundial recupere o patamar de alguns anos atrás. Internacionalmente, a situação está marcada pela guerra comercial entre os EUA e a China, que com o retorno de Trump à presidência dos Estados Unidos tem grandes chances de recrudescer. Projeta-se a escalada bélica no mundo todo, que passa pelo aumento do investimento em armas, munições e outros artefatos por parte dos países imperialistas. A guerra na Ucrânia, que se aproxima aos três anos, e o genocídio praticado pelo Estado sionista de Israel sobre os palestinos, são manifestações desse cenário destrutivo. Esse quadro de avanço das tendências destrutivas expressam o esgotamento da partilha do mundo do pós Segunda Guerra Mundial, somado à crise do capitalismo do último período.
Diante disso, os governos nacionais são obrigados – não porque seja contra sua vontade, mas por seu caráter de classe – a despejar a crise sobre as costas da maioria oprimida, além de não serem capazes de reverter os profundos ataques dos governos anteriores. Sejam os governos de centro-esquerda, direita ou extrema-direita, todos vêm aplicando medidas de ajuste fiscal, determinadas pelo poder econômico, em particular pelo capital financeiro internacional.
O governo Lula, neste sentido, é exemplar: não reverteu nenhuma reforma aprovada nos governos Temer e Bolsonaro, e ainda aprofundou os ataques com a reforma tributária, o arcabouço fiscal e, agora, com um conjunto de cortes que incluem a saúde, a educação e direitos sociais importantes como o seguro-desemprego, o Benefício de Prestação Continuada (BPC), entre outros.
As tentativas da base militante dos reformistas de tentar blindar Lula, responsabilizando somente Haddad e Tebet por esse pacote, não passam de uma manobra grosseira, que deve ser prontamente rejeitada por qualquer trabalhador consciente.
Sem dúvida, serão as massas negras do país as mais impactadas por esse conjunto de medidas do governo burguês de Lula. O fato de ser a maioria pobre do país obriga os negros mais velhos a dependerem fortemente do BPC, e os mais jovens padecerem dos efeitos dos cortes, além dos problemas que já assombram as massas pretas em geral e que governo nenhum resolve: a violência e matança policial, o subemprego, o encarceramento da juventude etc.
É nesse contexto, de aprofundamento do arrocho sobre as condições de vida da maioria por parte do governo petista, que surgiu um movimento contra a escala 6×1. Tal luta é de primeira ordem para a maioria preta e pobre, já que os setores que costumam se utilizar dessa escala são justamente os que têm os menores salários e as piores condições de trabalho, como o setor de serviços, de comércio e uma parte considerável da classe operária. No último dia 15, um grande contingente saiu às ruas para defender o fim dessa escala. Estiveram, no entanto, submetidos à política pró-capitalista do PT, PCdoB e PSOL, que instrumentalizam a luta nas ruas em favor das disputas e métodos parlamentares.
O conteúdo de classe desse movimento, no entanto, supera os estreitos limites do parlamento burguês, trata-se da necessidade de reduzir a jornada de trabalho sem reduzir os salários, o que significa uma expressão da luta de morte entre o capital e o trabalho. As massas exploradas, pretas e brancas, devem tomar essa luta em suas mãos, dando a ela seu caráter de classe, e transformando no ponto de partida para um movimento mais amplo, pela revogação das reformas trabalhista e previdenciária, pelo fim das terceirizações, e por um salário mínimo vital, que cubra as necessidades da família trabalhadora e que seja reajustado automaticamente de acordo com a carestia do custo de vida. Certamente, essa tarefa colocaria também para as massas oprimidas do país a necessidade de superar a crise de direção revolucionária forjando, na própria luta, seus instrumentos próprios de organização.
Se as massas negras tomarem para si a luta pelo fim da escala 6×1, que não deve significar outra coisa senão a redução da jornada sem redução dos salários, certamente se colocarão em outro patamar na luta de classes, com condições de superar assim os divisionismos identitários que lhes são impostos, revelando toda a profundidade da tese de que a opressão racial é uma manifestação da opressão de classe.
A matança da juventude preta e pobre
Não bastasse a opressão sobre força de trabalho explorada no capitalismo, as massas negras, em especial a juventude, sofrem com a violência e matança promovidas pelo próprio Estado. Os números são fartos e estarrecedores, bastam alguns para exemplificar: o relatório Pele Alvo, que monitorou 9 estados, indica que as polícias mataram ao menos 7 pessoas negras por dia em 2023. Ao todo, foram 4.025 vítimas. Destas, 3.169 casos foram disponibilizados os dados de raça e cor, sendo que 2.782 (87,8%) dos mortos eram pessoas negras. A ausência de dados da maioria dos estados, no relatório, deixa claro que os números são bem maiores.
Este 20 de novembro de 2024 está marcado pela permanência dessa violência. O caso recente do jovem Gabriel Soares, assassinado na frente do mercado Oxxo com 8 tiros, por um policial de folga, marca com sangue preto essa data. Por outro lado, as pesquisas acadêmicas pululam, as políticas afirmativas dos governos são inúmeras, a criminalização do racismo tem aumentado, sem, no entanto, modificar o quadro geral e, sequer, amenizá-lo. O que explica essa aparente contradição?
Em primeiro lugar, o fato de o racismo ser uma manifestação particular da opressão de classe, o que o coloca em íntima relação com o modo de produção capitalista e sua manutenção. Não poderá ser superado nos marcos da propriedade privada dos meios de produção. As pseudoteorias que separam a opressão racial da social, de classe, não fazem senão desviar a luta das massas negras por sua emancipação definitiva como parte da emancipação de todos os trabalhadores da escravidão capitalista.
Em segundo lugar, pelo fato de o movimento negro organizado refletir a crise de direção revolucionária que recai sobre os explorados como um todo. A traição da social-democracia da Segunda Internacional, de um lado, e do estalinismo que destruiu a Terceira Internacional e o Partido Bolchevique – primeiro programaticamente e depois fisicamente -, de outro, estão na base dessa crise. O fato de a Quarta Internacional ter sido dissolvida e não ter podido se firmar como Partido Mundial da Revolução Socialista completa a situação que mergulhou as massas exploradas no mundo todo em um grande atraso político e organizativo, que reverbera sobre todos os movimentos particulares, estudantil, camponês, negro etc. Esse fenômeno é de ordem histórica e só poderá ser superado na luta pela construção dos partidos operários revolucionários nacionais e pela reconstrução da Quarta Internacional.
O POR e o Comitê de Enlace pela Reconstrução da IV Internacional se colocam nessa tarefa e trabalham incansavelmente pela superação da crise de direção. Trata-se de unificar as reivindicações particulares que combatem a opressão racial, com as reivindicações mais sentidas dos trabalhadores em geral, e essas, por sua vez, com a luta revolucionária para substituir a propriedade privada pela propriedade social, base para a superação de todas as opressões.