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14 abr 2025
Editorial do jornal Massas n° 737
Recrudescimento da guerra comercial
Objetivo principal do governo Trump se concentra no ataque à China
A classe operária tem seu programa próprio para se defender
Trump iniciou seu plano da guerra comercial elegendo, primeiramente, o México e o Canadá como vítimas da elevação das taxas de importação de seus produtos agrícolas, manufaturados e tecnológicos. Em seguida, lançou a taxação do aço e alumínio, atingindo vários países, entre eles o Brasil. Em 2 de abril, apresentou a tabela das “tarifas recíprocas”, abrangendo 117 países. Ao lado da taxa geral de 10%, constam as taxas diferenciadas e mais altas. Nesse quadro, a administração Trump descarrega o maior peso tarifário nos países asiáticos, que estão intimamente vinculados à economia chinesa e à própria China – Camboja, Vietnã, Sri Lanka, Tailândia, China, Indonésia e Taiwan. A tarifa recíproca desses países vai de 49% a 32%, sendo a da China 34%. A União Europeia arcaria com 20%. Um rol de países, como a Argentina, Austrália, Brasil, Chile, Reino Unido etc., responderiam por 10%.
Esse plano foi anunciado como base para negociações com os Estados Unidos. No início de março, Trump colocaria em vigor as primeiras taxações e em abril acionaria a bateria das taxações recíprocas, abrindo uma crise de proporções desconhecidas desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Aguardou as reações dos aliados e dos adversários comerciais.
Os dois polos de maior capacidade de resistência são a União Europeia aliada e a China adversária. Trump passou a fazer o jogo do negociador tarimbado no uso de ameaças e chantagens. Submeteu inicialmente o México e procurou aliviar a resistência do Canadá. A União Europeia aprovou uma resposta retaliatória, mas foi a China que decretou a tarifa mais elevada às importações dos Estados Unidos e, politicamente, denunciou as medidas de Trump como um bombardeio à ordem mundial e, em especial, ao multilateralismo.
A tabela tarifária entraria em vigor no início de abril. Se fosse aplicada, estaria desencadeada a guerra comercial em toda a parte. Trump, porém, decidiu adiar por três meses, sob a alegação de que os países poderiam abrir negociações. Divulgou a notícia de que cerca de 50 países já haviam recorrido à procura de um entendimento com os Estados Unidos. A União Europeia respirou aliviada e suspendeu a “retaliação”.
Com essa manobra, a burguesia imperialista expôs a China como alvo aberto. Trump iniciou a tarifação contra a China com 10% e logo passou para 20%, 54%, 104% e, finalmente, totalizou 145%. A taxação da China aos Estados Unidos se manteve em 84%.
Desde as promessas eleitorais de Trump de recorrer a medidas protecionistas, ficou claro que o alvo principal da guerra comercial era a China. A União Europeia, certamente, deve se ajustar a essa ofensiva e os países semicoloniais, por sua vez, têm de arcar com as consequências já que não têm força econômica e militar para responder aos ataques do imperialismo norte-americano.
Não se sabe ainda até que ponto as potências europeias terão êxito nas negociatas. O Japão já se curvou em nome do entendimento. Vem ganhando força a tese de que antes de qualquer “retaliação”, os países devem cada um por si recorrer à diplomacia pacificadora. Como os ataques de Trump não incluíram a Rússia, que se acha envolvida na discussão de um acordo de “paz” na Ucrânia e que arca com as duras sanções impostas por Biden, a China caminha sozinha em uma rota de colisão com os Estados Unidos. Trump colocou a espada de Dâmocles sobre a cabeça de Xi Jinping e diz que espera um gesto de boa vontade de seu adversário, para abrir negociações e, assim, romper o último elo de resistência à ofensiva econômica e comercial dos Estados Unidos, que necessitam descarregar sua crise interna sobre os demais países, principalmente os semicoloniais e a potente China.
O imperialismo norte-americano conta com a crescente dificuldade da China em manter o crescimento econômico e continuar se projetando internacionalmente. Caso consiga isolá-la, o governo chinês poderá ceder. A guerra comercial de Trump está dando apenas os seus primeiros passos.
A reação das potências atingidas, principalmente as europeias, e a apreensão de uma das frações burguesas norte-americanas deram os primeiros sinais dos obstáculos políticos com os quais os Republicanos se confrontam. A queda abrupta nas Bolsas de Valores, a corrida especulativa em torno aos títulos da dívida pública americana e a instabilidade do dólar expressam as tendências caóticas da economia mundial impulsionadas pela guerra comercial de Trump. Os analistas quase unanimemente avaliam que o esgarçamento das relações comerciais resultará em desequilíbrios internos aos Estados Unidos e provável recessão que repercutirá em todo mundo. Os Democratas permanecem à espera das repercussões negativas, mas não têm outra alternativa que não seja a de manter a guerra comercial com a China e sustentar o cerco da OTAN à Rússia. É sintomático que se iniciaram manifestações da pequena burguesia em várias capitais dos Estados Unidos.
Democratas e Republicanos não se diferenciam substancialmente quanto à diretriz de potenciar a escalada bélica. Um feito extraordinário nesse sentido foi o de desatar na União Europeia a decisão de elevar os gastos com a indústria bélica e dar início a um maior rearmamento após a Segunda Guerra. A guerra comercial está na base do militarismo imperialista e das guerras de dominação.
Trump não se limitou a pôr em prática um plano de guerra comercial. Faz parte desse plano as anexações, como explicitou em relação à Groenlândia, ao Canal do Panamá e mesmo ao Canadá. O chamado de “paz” à Ucrânia e à Rússia é uma das peças do plano mais geral de sobreposição dos interesses dos Estados Unidos sobre países e regiões que não se encontram totalmente sob seu controle. No Oriente Médio, Trump alimenta o genocídio do povo palestino, levado a cabo por Israel, e pretende controlar a Faixa de Gaza e submeter o Irã.
As tendências bélicas no Oriente Médio são impulsionadas como parte das tendências mundiais que correspondem à necessidade dos Estados Unidos e demais potências ditarem uma nova partilha do mundo. A Rússia e a China terão de ceder, ou se preparar para a guerra. A solução de Trump no caso da Ucrânia não é de pacificação, mas de anexação, partilha e saque.
Não é preciso ser marxista para reconhecer que a ordem mundial erigida depois da Segunda Guerra se desmorona em ritmo mais acelerado. Mas os analistas burgueses colocam esse reconhecimento a serviço de uma “nova ordem mundial”. O que é uma ilusão e uma fraude.
A derrocada do edifício montado desde os acordos Yalta e Potsdam advém das contradições históricas do capitalismo que levaram à Primeira e Segunda Guerras Mundiais. As forças produtivas altamente desenvolvidas se chocam com as relações capitalistas de produção e com as fronteiras dos Estados nacionais. A derrubada da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e o ingresso da China à ordem capitalista aliviaram conjunturalmente tais contradições estruturais. Para servirem ao poder dominante dos Estados Unidos e aliados, devem se submeter até a última gota de suor suas economias e seus trabalhadores. A guerra comercial de Trump e seus objetivos anexionistas são expressões dos Estados nacionais e da organização monopolista da produção que aprisionam e sufocam as forças produtivas mundiais.
Os acordos que Trump possa obter não reerguerão os Estados Unidos como potência que emergiu da Segunda Guerra. Em sua decadência, continuarão alimentando as tendências bélicas e se preparando para uma possível guerra com a China e a Rússia.
A vanguarda com consciência de classe que luta contra o capitalismo em decomposição não pode perder de vista essa perspectiva histórica. A regressão sofrida pela classe operária causada pelas vitórias da contrarrevolução, sendo a liquidação da URSS a mais significativa, não deve obscurecer essa compreensão e retardar o combate pela superação da crise de direção. Objetivamente, está colocada a luta de classes no sentido da revolução social, que por seu conteúdo é proletária e internacionalista. As forças produtivas têm de ser libertadas das relações capitalistas de produção e das fronteiras nacionais. Essa transformação virá com a retomada das revoluções que abriram o curso da transição do capitalismo ao socialismo no século XX.
As experiências, o programa e a teoria que permitiram ao proletariado combater com seus métodos próprios e chegar a conquistar o poder, como na Revolução Russa, Chinesa e Cubana, estão vivos e prontos para serem encarnados pela vanguarda marxista-leninista-trotskista. O movimento ascendente dos explorados, certamente, se apoiará nas reivindicações mais elementares e se alçará à estratégia da revolução socialista. É por essa via que os trabalhadores e os povos oprimidos responderão à guerra comercial e à escalada bélica. É fundamental, nesse sentido, fortalecer o Comitê de Enlace pela Reconstrução da IV Internacional (CERQUI), que luta pela reconstrução do Partido Mundial da Revolução Socialista.