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16 mar 2019
Nota do POR sobre o massacre na Escola Estadual Raul Brasil
Como entender tamanha insanidade?
15 de março de 2019
Não é a primeira e não será a última vez que ocorrerão assassinatos coletivos, sem que se tenha um motivo claramente exposto. Dois jovens, um de 17 anos, Guilherme Taucci Monteiro, e outro de 25 anos, Luiz Henrique de Castro, adentraram a escola, onde foram alunos, um deles retirou a arma da mochila e atirou indiscriminadamente na fila de espera de atendimento da secretaria. Abateu a Coordenadora Marilena Umezu, a agente escolar Eliana Regina Xavier e os estudantes Kaio Lucas, Samuel Melquíades, Douglas Murilo, Caio Oliveira, Claiton Antônio. Em seguida, Luiz Henrique entrou e golpeou com uma machadinha as vítimas já abatidas, num gesto de confirmação do massacre. Guilherme avança e continua atirando. No final, segundo informação da polícia, um dos atiradores mata seu parceiro e se suicida.
As cenas de ódio, loucura e perversidade exigiram explicações das autoridades, psicólogos, educadores, etc. Uma das mães disse que poderia ser devido ao bullyng que sofreu Guilherme. Mas, não passou de uma palavra solta por uma mãe desesperada. O fato é que, imediatamente, não apareceu um motivo concreto. Policiais e promotores especializados suspeitam de “terrorismo doméstico”. A linha de investigação tem como principal pista o vínculo dos jovens com um fórum da internet , que promove a violência, entre elas, a apologia contra homossexuais, negros, mulheres, nordestinos e judeus. A internet abriga um submundo do crime e da mentalidade fascista. A suspeita da polícia é de que os jovens teriam sido influenciados por esse submundo clandestino – dark web. Nesse canal da internet, tanto se incentivam ações criminosas e fascistas, quanto se aplaude o “heroísmo” dos matadores.
É provável que Guilherme e Luiz Henrique tenham se inspirado nesse ideal de violência individual e indiscriminada. É bem provável, também, que procuraram, com a explosão de ódio mortal, atingir a instituição escola. Pode ser que a investigação acabe revelando outros elementos e aspectos da fúria juvenil. Temos a certeza de que, nem a polícia, nem os psicólogos, irão à procura da raiz da tragédia.
É explícita e bem conhecida a proliferação de uma cultura da violência individual e institucional. Trata-se de um enorme retrocesso civilizatório do capitalismo em decomposição. Não por acaso, a sua matriz se encontra na maior potência mundial, que são os Estados Unidos. De lá, não apenas se emana o que há de mais bestial e degradante da cultura, como também os seus exemplos práticos. O Brasil é um dos países mais americanizados do mundo. É um grande importador de sua produção “cultural” enlatada. A internet é praticamente um monopólio norte-americano. Em sua base, está o poder econômico imperialista.
Essa linha de explicação pode parecer distante do que ocorreu numa das escolas de Suzano. Mas, não há caminho mais seguro para a explicação de um fato aparentemente caótico e de difícil compreensão. É sintomático que os meios de comunicação tenham lembrado que o massacre na Escola Raul Brasil não foi um raio no céu azul. Que, no Brasil, há uma sequência, que o precedeu. E lembraram, também, as inúmeras chacinas ocorridas nos Estados Unidos. A repetição de tais acontecimentos exige uma explicação, que vá além da superfície e da aparência do fenômeno.
A cultura da violência e os incentivos às discriminações não são causas em si mesmas. Basta investigar, de forma livre e independente, para se chegar à sua base material. A cultura da violência individual e institucional (a polícia é um dos instrumentos da violência do capitalismo) é um reflexo das contradições econômicas e sociais do capitalismo, em sua fase imperialista de decomposição. O desemprego crescente, subemprego, baixos salários e vasta miséria são semeeiros de profundos desequilíbrios sociais, de desajuste na psicologia coletiva das massas, e da criminalidade, que arrasta parte da juventude. O narcotráfico, as milícias constituídas na própria policia, a expansão do comércio da droga entre as massas, e o fortalecimento do Estado policial são parte dessa materialidade, que condiciona a cultura da violência. O racismo, a misogenia, a homofobia e todo tipo de discriminação germinam e florescem nesse semeeiro. São exemplificativos os gestos e ideias de Bolsonaro, Witzel, Doria e outros governantes de que “bandido bom, é bandido morto”. E de que é preciso aumentar a capacidade letal da polícia. Essa mentalidade e orientação policial retrata a incapacidade do Estado em resolver as contradições capitalistas, que vêm projetando a barbárie social. Não é difícil encontrar a confluência de tais ideias fascistizantes do plano da legalidade burguesa com o plano do submundo da dark web.
Não temos dúvida de que os responsáveis pelo massacre em Suzano são a burguesia, seu Estado, sua cultura da violência, e sua mentalidade de armamento individual. Guilherme e Luiz Henrique também são vítimas. O assassinato frio começou pelo seu tio-empregador, e concluiu com a matança na escola. Está aí por que comparecem aos olhos da população como monstros. É melhor assim, para ocultar os verdadeiros responsáveis pela tragédia. É mais fácil, também, estigmatizar a família dos matadores, sem ter em conta que perderam os filhos e carregam a culpa pelo desvario dos jovens. A cegueira política da população a leva a voltar sua raiva contra os assassinos e a sua família. As instituições burguesas lhes cercam com um falso e hipócrita sentimento de dor. A dor real das famílias, que perderam seus filhos, de maneira aparentemente incompreensível e injustificada, é usada pelos governantes e religiosos, separando-a da dor sentida pelos pais de Guilherme e Luiz e Henrique.
Essa forma de desconhecer a tragédia dos próprios jovens, que cometeram tamanha insanidade, é típica da política burguesa. Não poderia ser de outra maneira, uma vez que se oculta o processo de decomposição social, que arrasta uma expressiva parcela da juventude aos profundos desequilíbrios, ao desespero e à loucura. O que é incompreensível é a atitude de organizações de esquerda, que correram a se solidarizar com os familiares e amigos de todas as vítimas, sem reconhecerem que Guilherme e Luiz Henrique também são vítimas. Pior ainda, atribuem a desgraça à falta de segurança nas escolas. Questionam a atual política de segurança pública do PSDB em São Paulo, e de Bolsonaro em todo o país, por agravar a violência. Se é certo que a segurança pública dos governantes de direita é um agravante, também é certo que não há segurança pública de qualquer governo burguês que não agrave a violência. Dizer que o problema é de segurança é juntar-se aos argumentos burgueses, de que é possível uma segurança em favor da população. Doria não demorou em prometer maior segurança nas escolas. Discute-se, inclusive, colocar a polícia em seu interior. A esquerda, que atribui à falta de segurança ao que aconteceu em Suzano, oculta as verdadeiras causas da insanidade juvenil.
É preciso admitir que o capitalismo envelhecido não pode impulsionar o desenvolvimento econômico, social e cultural. Sua decomposição se manifesta na forma de barbárie. Há pouco tempo, o rompimento da barragem de Brumadinho enterrou na lama mais de 300 pessoas. São assassinados no País mais de 60 mil pessoas por ano, dentre elas, uma grande quantidade de jovens. Não é preciso se estender nos números tétricos. Basta entender que a matança da Escola Raul Brasil é parte do mesmo problema.
É preciso ir à raiz dessas tragédias, para organizar a juventude em torno à política socialista da classe operária. A desorganização da juventude e a sua pouca elevação política impossibilitam que reaja a tais acontecimentos, responsabilizando a burguesia e seu Estado. A juventude tem um papel de imensa importância na luta contra a barbárie e em defesa do programa da revolução proletária. É preciso que tome consciência do avanço da barbárie e de suas causas materiais. Uma tarefa que se coloca de forma premente é a de construir o partido da revolução proletária.