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20 abr 2020
19 de abril de 2020
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), movida pelo partido Rede Sustentabilidade, que questionava a cláusula da MP 936, que exclui os sindicatos da negociação entre patrão e empregado, caiu por terra. O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) pisoteou as ilusões legalistas da burocracia sindical. Bolsonaro não daria ponto sem nó, em uma medida que permite aos capitalistas reduzirem os salários. Não fez senão aplicar as novas leis trabalhistas, criadas pela ditadura civil de Temer. Foram extraídos poderes institucionais alcançados pelos sindicatos com a Constituição de 1988.
A destruição da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e o desmonte do Ministério do Trabalho diminuíram a possibilidade de ingerência dos sindicatos nos conflitos entre capital e trabalho. No âmbito da reforma trabalhista, Temer atendeu ao pedido da burguesia para cortar a crista da burocracia sindical, que havia crescido, desde o governo de Lula. Lembremos que a eliminação do imposto sindical significou a retirada de poderosos recursos materiais, com os quais os sindicalistas se projetavam, inclusive na política eleitoral e parlamentar. Nesse mesmo sentido, foi-lhes restringido o campo de manobra judicial. Fartos recursos e bons advogados trabalhistas constituem corpo e alma da burocracia sindical e pilares da estatização dos sindicatos.
A diminuição de poderes políticos e judiciais às centrais e aos sindicatos corresponde à regressão do PT e aliados. O golpe de Estado de 2016, não apenas afastou o reformismo do manejo da burocracia estatal e enfraqueceu sua influência no Congresso Nacional, mas também cortou as asas dos aparatos sindicais, que haviam alcançado uma autonomia de voo, incompatível com as condições da crise econômica e desintegração do capitalismo.
As condições excepcionais gestadas pela pandemia deram uma dimensão mais precisa da subserviência das direções sindicais perante a política burguesa. Seguiram automaticamente as respostas governamentais. Não foram capazes de distinguir o método científico, do isolamento social, da política burguesa do isolamento social. Era e é obrigatório determinar as condições práticas da medida, ou seja, as condições econômicas e de classe. Os poderes governamentais podem divergir, quanto à forma do isolamento social, se radical ou brando. O que não podem é romper o princípio da sociedade de classes de que, em primeiro lugar, vem a proteção aos interesses dos capitalistas e, por último, as necessidades das massas. Mais precisamente, as necessidades das massas têm de estar subordinadas aos interesses dos capitalistas. Era óbvio que a desativação da indústria, comércio e serviço colocaria a contradição entre capital e trabalho em uma situação de choque extremo.
A MP 936 se originou da necessidade da burguesia compatibilizar seus negócios com o contingente da força de trabalho a ser desativado. Segundo Bolsonaro, ao permitir os capitalistas de reduzirem a jornada, ou suspenderem os contratos de trabalho por tempo determinado, com redução dos salários, estariam garantindo os empregos. Os empregadores, que não teriam como se valer desse mecanismo, poderiam simplesmente demitir. Ao trabalhador, portanto, só restaria uma alternativa: arcar com a redução salarial, não importando as consequências para sua subsistência.
A burocracia sindical, seguindo os preceitos da economia burguesa, aceitou esse pressuposto, capitulando diante do argumento de que, somente é possível defender os empregos, mantendo os negócios dos capitalistas. Concretamente, segundo essa posição, a classe operária e demais explorados devem sacrificar parte de seus salários para evitar a quebra de parte dos capitalistas. É como se houvesse solidariedade entre exploradores e explorados, no momento em que a economia se desintegra.
Cansamos de ver e ouvir os meios de comunicação criarem a falsa imagem da igualdade entre as classes diante da pandemia. Os capitalistas reagiriam, brutalmente, caso as organizações operárias exigissem a quebra do sigilo financeiro e comercial da classe burguesa; como se sabe, a renda média de 1% mais rico é 38 vezes a renda de 5% mais pobres; os 10% mais ricos detêm 43,1% da massa de rendimento, os 10% mais pobres, 0,8%. Uma pequena fração dessa imensa riqueza, concentrada nas mãos de poucos, poderia erguer a saúde pública e proteger a vida dos explorados. A burguesia e seus governantes não vão tocar em seus capitais. Alguns grupos econômicos “doaram”, segundo informações, R$ 2,7 bilhões. Os bancos compareceram como os maiores “doadores”. Somente o Itaú fez a caridade de R$ 1,2 bilhão (entregues à rede privada de saúde). Sua lucratividade, em 2019, atingiu R$ 26,583 bilhões. O lucro líquido dos 4 maiores bancos foi de R$ 81,5 bilhões. De repente, é acionado o mecanismo de “solidariedade humana”, manejado pelas igrejas e instituições “sem fins lucrativos”. Assistimos ao governador Doria listar, em seu discurso à população, uma relação de empresários e organizações que se comoveram com os chamados “vulneráveis”, palavra que vem substituindo miseráveis e famintos. Foram 81 empresas, que doaram R$ 341 milhões, no total. Uma fração ínfima do que receberam como subsídio governamental.
Essa onda burguesa arrastou os sindicatos, que passaram a fazer campanha de cesta-básica e outras doações. Na falta de espaço do SUS para instalar leitos, os burocratas chegaram ao ponto de oferecer as dependências dos sindicatos. Os magnânimos serviçais da burguesia se contentaram com os R$ 600,00, a serem despendidos aos miseráveis, cantando vitória do Congresso Nacional contra o governo Bolsonaro. Submetidos à política burguesa do isolamento social, reproduzem tudo o que obscurece a visão e a consciência de classe do proletariado e demais explorados. Ocultam que a burguesia e seus governos não têm como proteger coletivamente a população da pandemia, e não têm como impor o isolamento social, sem causar redução salarial e demissões de milhões. A burocracia sindical, reformista, direitista e centrista, se uniu em torno ao isolamento social, como se fosse uma política de defesa real dos trabalhadores. Criticou a MP 936 em palavras, mas a adotou na prática. Com os operários atomizados em suas casas, aceitou as pressões dos capitalistas, que se valeram da MP 936. Sem nenhum pudor, os burocratas assumiram as “assembleias virtuais”. Utilizaram essa fraude como se fosse um instrumento da democracia operária, nas condições excepcionais criadas pela pandemia. Até mesmo a CSP-Conlutas, dirigida pelo PSTU morenista, embarcou no carrossel das multinacionais. A Força Sindical, no Sindicato Metalúrgico de São Paulo, chegou ao ponto de criar um aplicativo para negociar diretamente com o patronato. O Sindicato Metalúrgico do ABC, CUT, facilitou às montadoras e autopeças, agilizando os acordos de redução salarial. A classe operária, imobilizada pelo isolamento social, tem de suportar a ofensiva dos exploradores aos empregos e salários, e carregar em suas costas a parasitária burocracia sindical pró-capitalista, bem como aquela que se diz socialista.
A classe operária e demais explorados não tiveram a possibilidade de se reunir em assembleias para discutir e decidir sobre o isolamento social e suas consequências. A CSP-Conlutas fez uma paródia de assembleia presencial, em São José dos Campos, no momento em que o isolamento social já estava imposto, com a anuência das centrais. A assembleia foi para que as empresas acatassem o isolamento, nos moldes em que as autoridades haviam determinado. De fato, as multinacionais já tinham decido pelas férias coletivas. A CSP-Conlutas levantou a bandeira de “greve geral”, para que todos acatassem o isolamento, afirmando as diretrizes da política burguesa. O marco da adesão de conjunto das centrais foi o cancelamento do “Dia Nacional de Luta”, 18 de março. A justificativa foi de que era necessário aderir à orientação da OMS e dos governadores. Abriu-se, assim, o caminho para a aprovação e implantação da MP 936, forjada pelo governo Bolsonaro.
A cláusula que faculta aos capitalistas imporem acordos individuais de redução salarial, sem a participação dos sindicatos, resultou da reforma trabalhista e da pressão do empresariado, para que fosse garantida a segurança jurídica da aplicação da MP 936. Essa foi a única divergência, de fato, das centrais. A CUT referiu-se à necessidade de aperfeiçoar a Medida Provisória. Pretendia a revogação dessa cláusula. Reivindicou o papel de mediação dos sindicatos nas negociações. De maneira que acertaria com o patronato as condições de redução da jornada e salário. Na verdade, pretendia servir de fiscal, uma vez que a medida detalhava tais condições. O afastamento da burocracia dos acordos de redução salarial de até 25% demonstrava a inutilidade dos burocratas para a concretização da política burguesa de isolamento social.
A liminar do ministro do STF, Ricardo Lewandowski, em resposta à ADI, indicando que os acordos apenas teriam validade após o posicionamento dos sindicatos, insuflou a ilusão de que poderia ser derrubada a cláusula. Sem demora, o que não é típico do STF, os ministros derrubaram a ADI. Apesar do conteúdo antioperário e antissindical da MP, os sindicatos se dispuseram a fazer acordos online de redução salarial, com as multinacionais e grandes empresas nacionais. Estima-se que 25 milhões de trabalhadores terão seus vencimentos diminuídos, abrangendo pequenas, médias e grandes empresas. Não se deve confiar em que a redução será por alguns meses, até que perdure o isolamento social. Os capitalistas precisam rebaixar o preço geral da força de trabalho.
Somente a política revolucionária do proletariado pode responder com seu programa a essas contradições do capitalismo. O retorno ao trabalho o recolocará como força social. Nesse momento, verá que o desastre imposto pela burguesia não recai simplesmente sobre o indivíduo, mas sobre os explorados como um todo. A vanguarda revolucionária e a militância de esquerda, que foram capazes de enxergar a capitulação geral da burocracia sindical e o papel reacionário do reformismo, estão obrigadas a fazer uma ampla campanha pela convocação de assembleias. É por meio da democracia operária e dos métodos da luta de classes que se rechaçarão os acordos online. Os empregos e salários serão a base por onde a propaganda e agitação revolucionárias penetrarão no seio dos explorados e impulsionarão seus instintos de revolta.