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18 mar 2021
Declaração do Partido Operário Revolucionário
Brasil, epicentro da pandemia
Criminosa conduta política e administrativa do governo Bolsonaro
Fracasso da política burguesa do isolamento social
Incapacidade dos governantes de imunizar a maioria oprimida
Responsabilidade da política de colaboração de classes da burocracia sindical e das direções políticas
Somente a classe operária organizada e em luta pode defender a si e à maioria dos explorados!
18 de março de 2021
Os governadores e prefeitos se mostram desnorteados, devido à violenta arremetida da pandemia. Mantém-se uma média de mais de duas mil mortes diárias. Assustou as autoridades burguesas, o pico de 2798 mortes, no dia 16 de março, representando 116 mortes por hora. Somente no estado de São Paulo, foram 679. Em 24 municípios paulistas, 88 afetados pelo coronavírus morreram nas filas, à espera de um leito. Em todo o país, estimam-se que 72 mil pessoas perderam a vida, aguardando socorro. Sem dúvida, o reconhecimento de que a pandemia, não só se alastrou, como se tornou mais mortífera, devido a novas variantes do Covid-19, e a previsão de que o sistema de saúde está em situação de colapso, demonstram a incapacidade dos governantes e da burguesia, de agirem centralizadamente e lançarem mão de todos os recursos materiais, para defender a população, principalmente a maioria oprimida.
Retomou-se o conflito inicial, entre os governantes, em torno à necessidade de aplicar o isolamento social, ao ponto de se chegar à discussão sobre a necessidade de lockdown nacional. A flexibilização que havia sido tomada, sob a avaliação de que a pandemia perdia força, foi varrida pela nova onda de alta contaminação e óbitos. Os atritos entre os governantes – polarizados por Bolsonaro e Doria –, que se haviam deslocado para a aquisição de vacinas e o plano de imunização, agora, se fundiram em um só problema. Estendeu-se o cabo de guerra do isolamento social e do escandaloso atraso da vacinação. A experiência demonstrou que a possibilidade de realizar um amplo, rigoroso e duradouro isolamento social é inviável, por motivos econômicos. A solução, de fato, depende da vacinação. Solução essa que ainda não se sabe até que ponto é possível chegar, nas condições do capitalismo em desintegração. O problema concreto do momento está em que o cabo de guerra entre governadores e governo federal empurra diariamente centenas e centenas de infectados à morte. De nada tem adiantado que Doria esbraveje contra a falta de humanidade e compaixão de Bolsonaro. De nada tem adiantado que a frente de governadores e prefeitos exija, urgentemente, um plano centralizado de imunização, e farta compra de vacinas.
Bolsonaro e seus generais resistem às pressões de seus adversários no campo das respostas à pandemia. A queda do general Eduardo Pazuello do ministério da Saúde compareceu como resultado do agravamento da crise sanitária e das recomendações dos aliados de Bolsonaro – o “Centrão” –, no Congresso Nacional. Tudo indica que seja correta a avaliação de que a possibilidade de Lula vir a se candidatar estremeceu a confiança eleitoral dos bolsonaristas, e também influenciou a troca do ministro. Está claro que os governadores e a oposição como um todo têm em suas mãos um farto arsenal para responsabilizar o governo federal pela tragédia, que se abate de norte a sul do país. E têm a seu favor a defesa e a aplicação do isolamento social, ainda que parcial, bem como a insistência de que era preciso recorrer rapidamente à vacina. O ressurgimento do caudilho Lula nessas condições políticas pode galvanizar a atenção de uma grande parcela das massas, cansadas das disputas em torno ao isolamento social e à vacinação. Está mais ou menos claro que Doria não capitalizará eleitoralmente as vantagens obtidas diante de Bolsonaro “negacionista” e desumano. Lula e o PT sabem disso, e correm a levantar a estrela lulista como defensora da linha desenvolvida pelo governador Doria, que foi apoiada pelos governadores do PT e PCdoB.
A situação dramática das massas e a ausência de uma direção revolucionária implantada no seio do proletariado não lhe permite ver o quanto os politiqueiros da burguesia se valem da tragédia para se preparem, com muita antecipação, às eleições presidenciais. A oposição, em geral, já tem demarcado o seu campo da disputa eleitoral de 2022. E Bolsonaro está obrigado demarcar o seu campo, de maneira que não tem como se livrar da maior responsabilidade diante da catástrofe. A troca de ministro da Saúde se tornou inevitável, no momento em que Pazuello concentrou a responsabilidade de não ter sido capaz de reagir, assim que esgotou a fase de descenso da contaminação, e se abriu a nova fase de mortandade. O processo de responsabilização no Supremo Tribunal Federal (STF) e o movimento por uma CPI da saúde no Congresso Nacional, motivados pela barbárie em Manaus, tornaram insustentável a permanência do general no ministério da Saúde.
Os embates entre os governantes, no entanto, de nada serviram para responder ao problema fundamental: como defender a maioria oprimida do novo surto da pandemia. As divergências refletiram a impotência dos governantes, submetidos aos interesses dos capitalistas e às pressões de importantes setores da classe média, pequenos e médios comerciantes. Impotência determinada estruturalmente pelo capitalismo em decomposição, e pelo recrudescimento da dominação imperialista. Vários são os fatores, como se pode ver, que compõem e determinam a impossibilidade de a burguesia e seus governantes usarem todos os recursos para defender vida das massas, atingidas por uma das pandemias mais globais e fulminantes, de todos os tempos.
O fato mais recente, que chama a atenção, foi o encontro da CUT, Força Sindical e outras centrais com Doria. A iniciativa tem por base estabelecer laços do governador com as multinacionais e demais setores empresariais. Assim, se poderia alcançar “um pacto conjunto” entre os sindicatos operários e organizações empresariais, como a Anfavea e o Sindipeças, “de enfrentamento à pandemia”. Wagner Santana, presidente do Sindicato Metalúrgico do ABC, principal esteio da CUT, pretende que as montadoras “participem do projeto de compra privada de vacinas para doar ao SUS, e pressionem o governo pela recriação da medida provisória para liberar corte de salários e jornadas”.
Logo no início e no decorrer da pandemia, em 2020, quando o POR denunciou as centrais, sindicatos e partidos políticos que se reivindicam dos trabalhadores de se submeterem à política burguesa de isolamento social, e colaborarem com a aplicação da MP 936, parecia mentira ou exagero. Agora, nos deparamos com “um pacto” entre a CUT, Força Sindical e sindicato metalúrgico com as multinacionais, suas organizações empresariais e o governador Doria. Ao mesmo tempo, o governador do Piauí, PT, Wellington Dias, foi escalado para ser “emissário do ex-presidente Lula”, para conversar com o PSDB e figuras do “centrão”. A pretensão é unir os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso, Michel Temer e Lula, para promover a campanha de compra de vacinas e insumos no exterior. No centro dessa movimentação está o objetivo de fazer uma frente com Doria, que, segundo Dias, “se não fosse o governador Doria, não teríamos a vacinação”.
Com a pandemia em alta, vale tudo para os petistas e a burocracia sindical, desde que possam transparecer que tudo esteja em oposição a Bolsonaro. Segundo essa política, e o parecer do próprio Lula, é hora de pôr de lado as desavenças com o PSDB e MDB, que, juntamente com o DEM, arquitetaram e promoveram o golpe de Estado, em 2016. Não há, certamente, nada de estranho nessa conduta. Fazem parte da política burguesa, as alianças mais espúrias. Para os petistas, é o caminho para fortalecer a candidatura de Lula – “os fins justificam os meios”.
As conversações com as multinacionais e os sindicatos patronais para viabilizar a compra de vacinas, sob o argumento de abastecer o SUS, favorece o movimento de grupos capitalistas, que têm interesse em explorar o amplo e rico mercado das vacinas. Esse é um dos objetivos de Bolsonaro e do Congresso Nacional, que abriu brechas para a mercantilização da tão almejada mercadoria. Chegou a formar uma aliança empresarial para comprar as vacinas, realizarem vacinações próprias “em seus trabalhadores” e parte da compra ser “doada” ao SUS. Os hospitais e clínicas estão ávidos em ganhar dinheiro, vacinando os ricos. Isso se passou com as demais vacinas, e vai acontecer com o imunizante anti-Covid-19. Assim, se romperia o princípio da vacinação universal, sob a inteira responsabilidade do Estado e do SUS. Confiar que as multinacionais e seus sindicatos vão auxiliar na tarefa de romper os obstáculos da vacinação significa confiar nos laboratórios e na indústria químico-farmacêutica monopolistas, que controlam a descoberta e a produção das vacinas. Está à vista que foi desencadeada uma guerra comercial em torno à vacina. Está mais do que claro que os países ricos estão se protegendo, enquanto a imensa maioria dos países semicoloniais aguardam a disposição das potências e de seus monopólios. Recorrer às montadoras é o mesmo que ajudar os exploradores internacionais a apertar ainda mais a corda que enlaça a garganta das nações oprimidas.
O POR tem firmado o princípio de que somente o proletariado organizado e em luta pode se defender e defender a maioria oprimida. Com a política de Bolsonaro de esperar que a pandemia passasse por si só, com sua aversão ao isolamento social – e até mesmo ao uso de máscara – e com o bloqueio à compra e desenvolvimento interno do imunizante, foram erguidos poderosos obstáculos ao combate à pandemia. Com a impotência dos governadores em impor um amplo e duradouro isolamento social, e a incapacidade de derrubar as barreiras de Bolsonaro à vacinação, o Covid-19 teve tempo para se adaptar, se modificar, tomar conta das massas empobrecidas e miseráveis, e provocar um segundo surto, mais disseminado e muito mais mortal.
Com as implicações econômico-financeiras das quarentenas parciais, vieram os fechamentos de negócios, as demissões em massa, a redução dos salários, a quebra de direitos trabalhistas, e toda sorte de precarização das condições de trabalho. A maioria oprimida se viu cercada pela pandemia e premida pela desintegração econômica. O peso quase total da crise sanitária e econômico-financeira recaiu e recai sobre a classe operária e os demais trabalhadores. O grande capital se ajustou e se ajusta, preservando sua capacidade de explorar e oprimir. O capital médio sofreu abalos, mas tem como se ajustar. E os pequenos foram os mais atingidos pelas quebras. Esse é o quadro geral, que expõe o funcionamento do capitalismo em qualquer crise.
O fundamental está em que as massas exploradas é que pagam com a moeda do empobrecimento, da miséria, da fome e da desintegração física e social. Os governantes, indistintamente, ocultam esse processo, por motivos ditados pela preservação do capitalismo em decomposição. E a aristocracia sindical, vinculada a determinados partidos da ordem burguesa, sendo que os principais são da esquerda reformista – entre eles se destaca o PT – ambos, aristocracia sindical e partidos reformistas, ocultam as leis de funcionamento do capitalismo e das tendências históricas de sua desintegração. Isso porque são movidos pela política de conciliação de classes. O resultado de um ano de pandemia nessas relações e manifestações políticas é catastrófico para as massas, que encarnam a força de trabalho e para as forças produtivas do país. A burocracia sindical, o PT e aliados não teriam como melhor evidenciar sua adaptação às disputas interburguesas, do que se arrastarem por trás de Doria, recorrendo às montadoras como cacife político, e oferecendo em troca ao capital multinacional o pedido uma frente com Doria, pela reedição da maldita MP 936.
A população sofrida já não sabe em quem confiar. Doria, governadores do PT e centrais sindicais têm a vantagem diante de Bolsonaro, pelo fato de fincarem e se agarrarem ao mastro da bandeira da vacinação. O isolamento social, no entanto, fracassou e não tem como ser reeditado de forma mais eficaz, porque o poder econômico já o reprovou, colocando-se do lado de Bolsonaro. Os assalariados estão esgotados e têm de viver, a despeito do risco de morte pela contaminação; a pequena burguesia, ligada ao comércio e serviços, não pode acatar o fechamento das portas por quinze dias, que é o tempo de reprodução e transmissão do vírus. Estão aí os motivos políticos, econômicos e sociais, que explicam por que o Brasil, país populoso e marcado pela pobreza, passou a ocupar, no lugar dos Estados Unidos, o epicentro da crise sanitária. E, sobretudo, porque os sacrificados são os pobres e miseráveis.
A tragédia das tragédias se reflete no desarme ideológico, político e organizativo da classe operária. O que resultou na passividade da maioria oprimida, diante da incapacidade dos governantes e da burguesia, de reagirem com todos os meios e recursos econômicos, científicos, sanitários e humanos de que o País dispõe. Somente pela via da luta de classes era possível contrariar os interesses do grande capital e do imperialismo, bem como contrapor-se às manobras políticas, realizadas pelos governantes em torno ao isolamento social e ao plano nacional de vacinação. Deixar nas mãos de Bolsonaro e Doria o destino da população e do país resultaria na hecatombe social, que hoje chega ao auge da tragédia. E que pode manter-se com o crescente número de mortes, que se aproxima dos trezentos mil.
Os burocratas sindicais dizem que não podem recorrer às ruas, às greves, aos piquetes, etc., porque provocaria aglomerações e romperia o isolamento social. Mas, a imensa maioria vai ao trabalho, superlota os transportes urbanos, ou vai às ruas para comprar ou vender os produtos. A imensa maioria mora em bairros populares, favelas e cortiços, meio social em que a pandemia está firmemente instalada. Não, senhores burocratas e serviçais da burguesia, vocês fecharam as portas dos sindicatos e mergulharam nas redes sociais, porque abraçaram a política burguesa do isolamento social, e se alinharam por trás do choque entre Bolsonaro e Doria. Não, senhores burocratas, vejam como vocês não tiveram a honestidade e a coragem de condenar os levantes massivos nos Estados Unidos, contra o assassinato do negro George Floyd.
O POR afirmou exatamente o contrário: somente com levantes de massa era possível defender um programa de emergência próprio dos explorados, e não ficar à mercê da disposição da burguesia. Somente erguendo um movimento sobre a base da democracia operária, era possível defender a vida dos pobres e miseráveis, e não aguardando a boa vontade do Congresso Nacional. Um isolamento social amplo e relativamente eficaz dependia da classe operária organizada, e munida de respostas próprias, e não das disputas entre governantes e da autorização dos poderosos capitalistas. Neste ponto particular, somente os explorados tinham total interesse no isolamento social, mas organizado segundo as condições de existência da população, e não segundo as condições de negócio e lucro dos capitalistas. As massas nas ruas derrotariam o bloqueio de Bolsonaro à vacinação universal, e não com as imposturas de Doria e aliados. Os explorados organizados para o combate travariam o choque no campo da divisão e luta de classes, e não subordinados à burguesia e aos seus governos. Assim, o SUS poderia ser controlado pelos comitês de base, e toda a rede privada se submeteria ao movimento de defesa da vida da população, rompendo a divisão de classe na saúde.
Somente com uma correta e ampla preparação ideológica, política e organizativa, fundada em princípios classistas, a classe operária poderia se erguer como força motriz de combate à pandemia, às suas causas e consequências. É falso que o proletariado não tem um programa distinto e oposto ao da burguesia, diante de uma crise sanitária de tamanha proporção. Não só tem, como objetivamente foi e está colocado pelos acontecimentos. Trata-se do programa de expropriação da propriedade privada dos meios de produção e sua transformação em propriedade social. Certamente, a luta começaria pelo programa emergencial dos explorados, contraposto ao do governo e do Congresso Nacional. Mas, para formular o programa emergencial era necessário que as centrais, sindicatos e movimentos recorressem à democracia das assembleias, às mobilizações e à organização independe, diante dos governos e do patronato.
Pode-se contestar que os trabalhadores teriam receio em se manifestarem coletivamente. Tudo indica que assim seria, mas cabia às direções não se adaptarem à passividade e cumprirem seu dever revolucionário. As experiências negativas com as respostas e campanha de intimidação dos governos acabariam por criar as condições para as massas procurarem confiar em suas próprias forças. Dependia, portanto, em grande medida, da clareza política e da firmeza das direções, para superar o atraso e o temor dos trabalhadores. A burocracia e os partidos reformistas seguiram o caminho oposto. Juntaram-se aos partidos da burguesia e aos governos, em torno ao plano capitalista de emergência, antioperário e antipopular. As duras consequências para as massas são enormes. Estar no epicentro da pandemia significa estar à frente dos sacrifícios da maioria explorada em todo o mundo.
A vanguarda com consciência de classe deve insistir na defesa do programa de emergência, dos métodos da ação direta e da organização independente. Trata-se de exigir, das direções, que rompam com a política de conciliação de classes, que não coloquem os sindicatos a reboque de Doria, que não recorram às multinacionais para resolver o problema da vacinação, e que não utilizem a desgraça da população para se potenciar eleitoralmente. Trata-se de mostrar às massas que fracassou a política burguesa do isolamento social, e que a vacinação está condicionada à guerra comercial, ditada pelo imperialismo. Trata-se de convocar as assembleias presenciais em todo o país, e pôr em marcha um movimento por um programa de emergência próprio dos explorados.
Que as centrais sindicais convoquem imediatamente um primeiro dia de manifestações: 1) pela vacinação universal, a começar pelos pobres e miseráveis; 2) controle pelas organizações operárias sobre a Anvisa, Butantan, Fiocruz e indústria químico-farmacêutica; 3) por uma ajuda emergencial de um salário mínimo calculado pelo Dieese; 4) pela subordinação do sistema privado de saúde ao SUS, que deve ser controlado pelos comitês e assembleias populares; 5) reabertura dos negócios fechados, por meio de um plano do Estado e recontratação dos demitidos; 6) estatização sem indenização das fábricas fechadas, e controle operário da produção; 7) expropriação dos capitalistas que oferecerem resistência ao isolamento social; 8) não pagamento da dívida pública, e utilização de seus recursos para o combate da pandemia e da crise econômica. Com esse programa e com uma direção disposta à luta, a classe operária e demais explorados vencerão o medo, a passividade e a dependência política.