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02 maio 2021
A crise avança
De onde vem a tranquilidade de Bolsonaro?
Massas 635, Editorial,1 de maio de 2021
O presidente da República diz estar tranquilo com a situação política. Isso porque não têm ocorrido manifestações que contestassem o seu governo. Entre os partidos da oposição, a avaliação é de que o impeachment não caminha porque não conta com mobilizações de rua. Mas, o fato é que as forças políticas opositoras não estão dispostas a promover nenhuma manifestação.
A preocupação de Bolsonaro com a CPI da Covid é a de que sirva de instrumento eleitoral da oposição. A confirmação no plenário do STF da suspeição de Moro restabeleceu os direitos políticos de Lula. O que não foi bom, nem para Bolsonaro, nem para a oposição de centro-direita, chefiada pelo PSDB. A CPI e a candidatura de Lula pavimentam o caminho da disputa eleitoral, ainda que as eleições estejam distantes.
Bolsonaro, seus generais e politiqueiros do Centrão estão em posição de realizar a virada que for necessária, para preservar a governabilidade, em meio ao ritmo frenético da crise, objetivando diminuir a margem de manobra da oposição, que se alargou, com o descontrole da pandemia e os mais de 400 mil mortos.
A adaptação do governo às diretrizes mundiais de Biden, sem precisar rechaçar o seu trumpismo, é a mais recente virada. Bolsonaro e o seu quarto ministro da Saúde esperam que o acordo de compra da vacina do laboratório norte-americano Pfizer contrabalance a investida de Doria com a Coronavac chinesa. A China poderá começar a perder a guerra comercial das vacinas, assim que os EUA estiverem imunizados, e se sentirem relativamente seguros para liberar suas multinacionais à ofensiva mundial. Por estranho que pareça, Bolsonaro está obrigado a passar para o lado de Biden, se quiser fazer frente à pecha de genocida, e aos resultados da CPI.
O fundamental para a governabilidade é que não se perca a iniciativa política e se mantenha a luta de classes amortecida. Depois de debandar para o lado de Biden, na Cúpula do Clima, Bolsonaro correu a ativar a entrega da Base de Alcântara ao imperialismo. O plano de privatizações de Paulo Guedes já vinha sendo impulsionado, com os leilões dos aeroportos. Estão em andamento as privatizações da Eletrobras, das refinarias da Petrobras e das ferrovias. A abertura de capital da Caixa de Seguridade na Bolsa de Valores revela a disposição de Bolsonaro de ir longe com a desestatização e desnacionalização.
Não há, porém, como apenas contentar o grande capital e o imperialismo com as oferendas. Observa-se que fez parte desse jogo a aprovação do Orçamento, em que se entregam bilhões de reais em verba para os parlamentares, e se desoneram, em muitos bilhões, setores capitalistas e igrejas. O capital financeiro não aprovou a manobra que contorna o Teto dos Gastos, critério que rege a diretriz orçamentária voltada a garantir o superávit primário e o pagamento da gigantesca carga de juros, proveniente da dívida pública.
É visível a decomposição da política burguesa, e a continuidade da crise sanitária e econômica, que recaem sobre a maioria oprimida. O movimento de aproximação e distanciamento do grande capital a Bolsonaro é típico do quadro de instabilidade. O país passa por uma profunda divisão interburguesa, que tem abalado o seu funcionamento federativo. Inúmeros foram os abalos sofridos pelo governo militarista-fascistizante. Nesse exato momento, o ministro Paulo Guedes acaba de trocar quase toda a equipe econômica, refletindo os embates interno e externo ao governo em torno ao Orçamento.
Os choques viscerais nos marcos do poder e da política burguesa, porém, se processam nas condições de profundo recuo das massas e de contenção das lutas operárias. A quebra recente da luta contra o fechamento da Ford e, agora, a da LG, ainda em andamento, foram e são fundamentais para a tranquilidade de Bolsonaro.
Chegamos ao 1º de Maio com as centrais e sindicatos refugiados no mundo virtual, completamente inofensivo à burguesia e aos governantes. Bolsonaro aproveitou a passividade das direções sindicais para reeditar a maldita MP 936, na forma da MP 1045, que atinge mais profundamente os trabalhadores. É correto, portanto, afirmar que Bolsonaro continua em pé, atravancando as limitadas medidas de contenção da pandemia, atacando os empregos e salários, cortando recursos da educação e saúde, e privatizando, graças à política de colaboração de classes da burocracia sindical e da impotente oposição reformista, liderada pelo PT. O combate ao governo Bolsonaro só depende da retomada da luta organizada do proletariado e da maioria oprimida. Essa é a tarefa a ser cumprida imediatamente.