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02 jul 2016
2 de julho
Há um consenso entre a burguesia, seus governos e seus partidos de que é inevitável um “ajuste fiscal”. Dizem unanimemente que os gastos do Tesouro Nacional são maiores que a arrecadação, o que têm gerado pesados déficits e que por isso é necessário diminuir os gastos. Quanto ao aumento da arrecadação, é mais difícil porque dependeria em grande medida de novos impostos, de forma que não se pode aumentar a carga tributária sobre as empresas e o capital.
O governo tem a opção de avançar os programas de privatização e incentivar a repatriação de bilhões que foram ilegalmente desviados do Brasil para o exterior. No Senado, voltou-se à discussão de legalização dos jogos de azar. Fora essas alternativas, somente o aumento da arrecadação de impostos de acordo com as regras vigentes desafogaria o orça- mento. Ocorre que essa via depende da volta do crescimento econômico, mais produção, mais venda e mais empregos, mais impostos e menos déficit. Mas o problema está justamente na recessão, ou seja, na crise de superprodução que é mundial.
Dizem os capitalistas e seu governo que com o “ajuste fiscal” viria o equilíbrio das finanças do Estado, que poderia investir mais e incentivar os capitalistas a disporem seus capitais para reativar a produção, com isso o comércio e os serviços. Fazem as contas e concluem que já não é possível continuar com alto déficit primário e com o desarranjo das contas públicas, que chegou ao ponto da ameaça de quebra de alguns estados da federação, como é o caso do Rio de Janeiro.
Sobre que classe social então tem recaído o ajuste fiscal? Sobre os capitalistas? Não! Sobre a classe operária? Sim! Sobre a classe média urbana? Sim! Sobre os camponeses pobres? Sim! Está aí o segredo do ajuste fiscal. Por que não recai sobre a classe capitalista? Justamente porque seus lucros, capitais, propriedades e luxo devem ser preservados. O “ajuste fiscal”, portanto, são medidas tomadas pelos exploradores contra os explorados.
Estão nos planos do governo golpista de Michel Temer a reforma da previdência, a reforma trabalhista, cortes de gastos com a saúde, educação e serviços sociais. O fundamento econômico-financeiro do ajuste fiscal é o seguinte: reduzir o máximo possível os gastos dos capitalistas com a contratação da força de trabalho (mão-de-obra), aumentar a sua exploração e despender o mínimo com as aposentadorias. Temer pretendia imediatamente acabar com o abono salarial, desvincular o reajuste da aposentadoria do salário mínimo, desviar parte do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para sustentar a Previdência, aumentar o tempo de vida para o assalariado aposentar, equiparar as mulheres com os homens quanto ao tempo para aposentar, ampliar a terceirização, facilitar as demissões, entre outras medidas.
Parte desse plano serve diretamente aos capitalistas e parte ao Tesouro Nacional. Essa combinação indica que o governo da burguesia está promovendo uma ofensiva em toda linha contra os explorados. Quando economistas insuspeitos, quer dizer, integrados à ordem burguesa, procuram outras soluções, como a de reduzir as taxas de juros, utilizar parte das reservas cambiais, taxar o capital especulativo e as grandes fortunas, por exemplo, a resposta é a de que desencadeariam uma corrida inflacionária, sonegação, evasão de divisas, redução dos investimentos externos, etc. Em resumo, não se pode tomar medidas que afetem os lucros e os capitais da burguesia. Tudo deve vir da classe operária, da classe média urbana e do campesinato. O grande capital está imune.
A gigantesca dívida pública e o exorbitante montante de juros preenchem grande parte do orçamento da federação. Qualquer que seja o governo eleito está obrigado a governar em função da dívida e dos juros. A política econômica, portanto, não está voltada a desenvolver as forças produtivas da nação. Prevalece o contrário, as forças produtivas estão condicionadas à obrigação da nação de garantir a sangria de boa parte da riqueza produzida, que serve ao parasitismo financeiro. O capitalismo da época imperialista se caracteriza em geral pelo do- mínio do capital financeiro, por sua sobreposição à produção e por se levantar como obstáculo às forças produtivas.
Os países de economia atrasada e semicolonial, como é o caso do Brasil, são sempre devedores, provedores de pesada carga de juros e servidores do parasitismo. O sistema financeiro brasileiro é parte do ordenamento mundial do imperialismo. Está aí por que importante parcela de seus negócios é dirigida à dívida pública e à especulação. Como o capital financeiro resultou da fusão do capital bancário com o capital industrial, a burguesia como um todo se tornou uma classe parasitária. Nos países semicoloniais, foi perdendo seu caráter nacional em tal magnitude que se tornou um apêndice da burguesia mundial imperialista, embora continue a refletir conflitos de interesse. O que indica o quanto está submetida ao imperialismo é sua relação com a dívida interna e externa.
No Brasil, a quase totalidade da dívida externa foi transformada em pública sob o governo de Fernando Henrique Cardoso, uma forma de resolver momentaneamente a crise do endividamento, que se abriu no final do regime militar e se prolongou até a década de 1990. O que parecia equacionado – com as privatizações (entrega de patrimônio nacional), com o programa de recuperação de bancos (PROER), com o plano Real e com a adoção da Lei de Responsabilidade Fiscal – voltou com tal força e está no centro da crise política e do impeachment de Dilma Rousseff.
O último informe do Banco Central é de que a dívida se elevou para R$ 2,886 trilhões. Aproxima-se de 70% do Produto Interno Bruto (PIB). Se somarmos as dívidas da União, dos estados e dos municípios, o déficit geral poderá alcançar R$ 750 bilhões. Eis por que a maior parte dos estados se encontra em situação pré-falimentar, o que atinge frontalmente os serviços públicos. Não faltam análises e denúncias consistentes sobre o tamanho do rombo e do parasitismo. Também não faltam explicações convincentes de que a brutal carga de juros e amortizações são as reais responsáveis pela crise fiscal. E não a Previdência, os gastos com programas sociais e aumento do salário mínimo, como diz o governo e seus lacaios.
Essa discussão no âmbito da política burguesa serve para esclarecer alguns aspectos da questão, mas é em vão. Sem dúvida, o excesso de parasitismo afeta interesses particulares de setores da classe capitalista, por isso é questionado. A classe operária está alheia porque seus sindicatos estão sob o controle de direções que seguem esta ou aquela fração da política burguesa e porque lhe falta o partido revolucionário. Mas essa constatação não deve obscurecer o seu lado objetivo. Está posta a tarefa dos explorados combaterem o parasitismo da burguesia e do governo que o encarna, sob a bandeira de cancelamento e não pagamento da dívida pública. Que deve ser acompanhada da bandeira: Não pagaremos pela dívida pública com nossos empregos, salários e direitos trabalhistas.
A luta contra as medidas que descarregam o parasitismo da dívida pública sobre a maioria oprimida permite à vanguarda revolucionária desenvolver no seio das massas o programa de estatização do sistema financeiro, sem indenização, expropriação do grande capital e um plano de superação da fome e miséria. É imprescindível explicar e defender que a luta pelo poder é o objetivo do proletariado. Não se pode quebrar o parasitismo sem destruir a ditadura de classe da burguesia. Está aí por que não se deve omitir e nem relevar a importância da defesa da constituição de um governo operário e camponês.