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01 nov 2022
Declaração do Partido Operário Revolucionário (POR)
Lula vence as eleições presidenciais
À classe operária, aos demais trabalhadores e à juventude oprimida
31 de outubro de 2022
A derrota de Bolsonaro se deu já no primeiro turno. Foi confirmada no segundo turno, porém, por uma margem bem menor de votos. Não foi surpreendente o acirramento da polarização. Bolsonaro teve a seu favor a máquina do Estado e o apoio ativo de poderosos grupos econômicos. Usou-os o quanto pôde. Mas o fator principal de sua capacidade de mobilização e radicalização eleitoral se encontra na vasta classe média urbana e rural. Trata-se de uma classe cuja posição social estabelecida entre a burguesia e a classe operária lhe permite defender interesses e privilégios particulares. Sem que suas camadas mais pobres, que é grande em relação às camadas mais ricas, estejam sob a direção da política revolucionária do proletariado, essa classe intermediária é extremamente conservadora e egoísta. Nas condições de agravamento da crise econômica e social, como a que predomina no Brasil, a classe média pode servir a uma variante mais reacionária, obscurantista e fascistizante da política burguesa.
Esse fenômeno se manifestou claramente na contundente polarização eleitoral, que dividiu as massas oprimidas. Em seu desenvolvimento, parte da classe operária – empregada, desempregada, subempregada – também foi arrastada pela pressão dos aparatos que agiram fartamente em favor de Bolsonaro. Mas, o fundamental está em que a rejeição a Lula e ao PT esteve abrigada e potenciada na classe média, de onde a direita e ultradireita bolsonaristas extraíram sua força de mobilização eleitoral.
Distintamente, a candidatura e campanha eleitoral de Lula estiveram, em grande medida, apoiada na classe operária e nas camadas mais pobres e miseráveis da população. Pode-se dizer que a derrota de Bolsonaro se deveu a que a maioria dos mais explorados, portanto, dos mais oprimidos, viu em seu governo um algoz. Os dois anos de Pandemia – de mortes massivas, de demissões, de fechamento de fábricas e de escalada da miséria e fome – mostraram a face burguesa do governo da ultradireita. Sem dúvida, uma camada importante da classe média, mais sofrida e esclarecida, acabou sendo influenciada pela campanha do PT, de denúncia e crítica à política obscurantista e retrógrada do bolsonarismo. Para isso, observa-se a importância de notórios representantes do empresariado, do pensamento burguês democratizante e da oposição que concorreu na “terceira via” terem se aproximado da candidatura de Lula e, finalmente, declarado o voto no petista. Não deixou de ser importante o fato de uma camada da classe média urbana ter resistido às pressões do bolsonarismo. Mas, foram os mais pobres e miseráveis, vinculados ou provenientes da classe operária, que decidiram as eleições em favor de Lula.
Essa composição de classe, que caracterizou a polarização da disputa eleitoral, se manifesta nos centros urbanos, no interior e nas regiões, que ocupam lugares diferenciados no quadro do desenvolvimento desigual e combinado da economia e das relações sociais. Não por acaso, o Nordeste esteve na linha de frente do apoio a Lula. Mas, uma boa votação do petista no Sudeste foi decisiva. Bolsonaro foi derrotado no Nordeste e Norte, mas esteve perto da vitória, com a gigantesca expressão alcançada no Sul e Sudeste, sem falar do Centro-Oeste. No fundo da disputa eleitoral, verificada por região e estado, se encontram as condições econômicas, as relações de classe e a projeção social da pobreza e miséria. É sobre essa base que se elevam as forças partidárias, que compõem o quadro da política burguesa, e que encarnam os interesses particulares e oligárquicos da classe minoritária exploradora e opressora da maioria explorada.
A vitória de Lula não corresponde às necessidades e interesses da maioria oprimida, como se tem procurado interpretar por uma avaliação de esquerda. Não é porque venceu a disputa pela presidência da República contra o candidato da ultradireita que o petista representa a maioria mais atingida pela exploração e pela crise, que vem decompondo o capitalismo, no Brasil e no mundo. As massas foram divididas e arrastadas por candidaturas distintas quanto à orientação política, mas de conteúdo burguês comum. As promessas de erradicar a fome são palavras ao vento. Lula já governou o País por dois mandatos, e a miséria e a fome apenas foram maquiadas com os programas assistenciais. Nada melhor que as experiências. Qualquer que seja o governo – independente de sua orientação política mais à esquerda ou à direita, mais propenso ao protecionismo ou ao liberalismo, mais comprometido com o estatismo ou com o privatismo – será um administrador provisório dos interesses gerais da burguesia e, em particular, dos que correspondem ao grande capital. Dizemos administrador provisório, porque será substituído por outro, assim que não mais servir à burguesia, e as massas perderem as ilusões que as levaram a confiar na possibilidade de mudança a seu favor.
Lula e o PT tiveram seu momento de ascensão e queda, agora aproveitam a oportunidade de retornar à presidência galgados pela confiança que a maioria oprimida ainda conserva neles e, sobretudo, pela dura experiência que tiveram com os governos de Temer e Bolsonaro. As contrarreformas trabalhista e previdenciária, a implantação da terceirização, a destruição de direitos trabalhistas, o alto desemprego e o impulso ao subemprego colocaram os trabalhadores, os pobres e miseráveis em posição antagônica a esses dois governos francamente antioperários e antipopulares. Por outro lado, as dificuldades econômicas crescentes provocaram atritos no interior da própria burguesia. Uma fração foi se desprendendo de Bolsonaro. É sobre a base dessas condições que Lula volta à presidência, sem, contudo, impor uma derrota esmagadora ao seu adversário de ultradireita.
A diferença de 60,3 milhões para 58,2 milhões de votos é pequeníssima. Bastam esses números para se ter a ideia do quanto Bolsonaro e o bolsonarismo poderão assombrar o governo de Lula. O Congresso Nacional permanece sob o controle do “Centrão”. Nas principais regiões e estados, a força do bolsonarismo se manteve em pé. Lula e o PT saíram das eleições com a presidência da República, mas com uma dívida e um grau de dependência elevadíssimos, perante os partidos e politiqueiros de centro-direita. Eis por que Lula deixou claro à própria direção do PT que seu governo será de frente ampla. A função do seu vice, Geraldo Alckmin, é a de precisamente servir de instrumento do governo de coligação e de ligação com os diversos setores da classe capitalista. Não por acaso, a candidata da terceira via derrotada, Simone Tebet, se colocou imediatamente como cabo eleitoral de Lula. Está aplainado o caminho para a frente ampla com o PSDB e MDB, que em 2016 foram os principais responsáveis pelo golpe de Estado que derrubou o governo de Dilma Rousseff.
Em seu discurso de vitória, Lula levantou a bandeira de “pacificação” do País. Explicou que não existem “dois Brasis”, e que o povo é um só. Espera-se que, passado o momento de beligerância eleitoral – que chegou a episódios de gangsterismo com a resistência armada de Roberto Jefferson à ordem de prisão e com a perseguição da deputada Carla Zambelli de arma em punho a um petista – as forças burguesas em conflito abaixem a guarda. Pretende-se restabelecer a harmonia dos poderes do Estado, abalada pelos conflitos do Executivo e Judiciário. E objetiva-se estabelecer uma relação de colaboração entre o novo governo e o Congresso Nacional. A “pacificação” almejada é uma condição para que Lula arme um governo capaz de servir à burguesia da melhor forma possível. Assim, a burocracia sindical poderá cumprir sua função de apoio ao governo burguês de frente ampla.
Diante do governo de Bolsonaro, as centrais e sindicatos, em sua imensa maioria, praticaram a política de colaboração de classes, desde a oposição, aguardando o naufrágio da governabilidade e a volta de Lula como caudilho eleitoral. Agora, diante do governo Lula, deixam de estar na oposição, e passam a ocupar a trincheira de defesa da governabilidade. Recompõe-se, portanto, a política de colaboração de classes praticada sob os governos passados de Lula e Dilma.
Se se confirmarem as previsões dos organismos internacionais, de que está no horizonte uma recessão econômica abrangente, o Brasil poderá ser ainda mais afetado. Pelo visto, com o recrudescimento da guerra na Ucrânia, tal prognóstico tem tudo para se confirmar.
A “pacificação” pretendida por Lula, portanto, vem no sentido de dar ao novo governo condições de enfrentar as tendências instintivas de revoltas dos explorados. A pacificação na política burguesa, em relação à necessidade da classe operária e dos demais oprimidos se defenderem com a luta coletiva, é reacionária. Trata-se de o governo unir as forças burguesas no interior do Estado para reagir contra possíveis levantes de massa. Todo palavreado de defesa da democracia, envolvido pelo palavreado de eliminação da fome, oculta a orientação pró-capitalista e pró-imperialista do governo que se constituirá em janeiro. Nem bem se confirmou a vitória de Lula, Biden dos Estados Unidos, Macron da França e Borrell, chefe da União Europeia, reconheceram o resultado eleitoral, antecipando-se a qualquer tipo de resistência de Bolsonaro em admitir a derrota.
Do conjunto desses acontecimentos, vemos que a política burguesa promoveu uma profunda divisão entre a maioria explorada. Lula e Bolsonaro exploraram, cada um a sua maneira e objetivo, o máximo possível a polarização no seio dos explorados. Esse é o tipo de divisão e antagonismo que serve tão somente à classe burguesa, uma vez que minam todo esforço de organização independente da classe operária e dos demais trabalhadores diante de seus exploradores.
O Partido Operário Revolucionário fez a campanha sob as bandeiras: “não confiar nas eleições, confiar em nossas próprias forças; por um programa de reivindicações próprio dos explorados; em defesa da independência política das organizações sindicais; vote nulo! Vimos que caiu o número de votos nulos e brancos, o que também resultou da polarização. O POR teve, assim, de nadar contra a poderosa correnteza eleitoralista.
Não temos a menor dúvida de que o governo Lula será de ataque à vida da maioria oprimida. Não porque queira, mas porque as contradições da crise econômica obrigarão o novo governo a tomar medidas antioperárias, e a viabilizar as contrarreformas de Temer e Bolsonaro. E as centrais, sindicatos e movimentos serão ainda mais estatizados, para servir de instrumento de apoio ao governo. A luta pela independência política e organizativa do proletariado continua sendo a grande tarefa. É preciso, desde os primeiros dias de Lula na presidência, que a vanguarda com consciência de classe denuncie o conteúdo burguês do novo governo de frente ampla, e trabalhe por organizar os movimentos em defesa do programa próprio de reivindicações. Isso sem descuidar, um só segundo, de responder as ações da ultradireita e de combater as tendências fascistizantes encarnadas pelo bolsonarismo. É com o programa e a estratégia da revolução proletária que o Partido Operário Revolucionário continuará a luta pela organização independente dos explorados.