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24 jan 2024
Declaração do Partido Operário Revolucionário, seção do Comitê de Enlace pela Reconstrução da IV Internacional
100 anos do falecimento de Vladimir Ilyich Ulyanov (Lênin)
(21 de janeiro de 1924)
Lênin, pilar do marxismo, dirigente da Revolução Russa, construtor do socialismo e farol da revolução mundial
Um século da morte de Lênin e suas formulações teóricas e programáticas continuam imprescindíveis para o proletariado combater o capitalismo, reconquistar o terreno perdido para a contrarrevolução, reerguer organizativamente o internacionalismo proletário, impor derrotas ao imperialismo, impulsionar as revoluções proletárias e retomar o curso da transição do capitalismo ao socialismo iniciado pela Revolução Russa.
Em outubro, a conquista do poder pelo proletariado russo cumprirá 107 anos. Lênin, como se vê, não teve tempo de dirigir a edificação das bases econômicas e sociais fundamentadas no marxismo e no programa do Partido Bolchevique. A criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), em dezembro de 1922, contou decisivamente com as diretrizes do marxismo-leninismo. Lênin se achava enfermo, mas com uma extraordinária lucidez estratégica e tática, necessária para não só consolidar o poder proletário diante dos inimigos da revolução, como também para assegurar os passos iniciais da transição do capitalismo ao socialismo. Transição essa que se originava nas condições particulares de uma Rússia que ainda conservava heranças de sua formação feudal e que teria de avançar em contraposição ao capitalismo mundial.
Os poucos anos de vida que restavam a Lênin, após a derrubada do poder burguês e a emersão do novo regime social soviético, foram consumidos na luta por estabelecer as bases da transição do capitalismo ao socialismo. Com o poder do Estado sob seu controle, a classe operária teria de se elevar a dirigente da construção socialista, rodeada pelas forças imperialistas da contrarrevolução, fragilizada pelas consequências nefastas da Primeira Guerra Mundial e da guerra civil e atormentada pelas contradições de classes que persistiam.
O problema fundamental, portanto, se encontrava nas difíceis condições de organização da classe operária que havia sido profundamente atingida pelas guerras. A reorganização da economia sobre a base da expropriação da propriedade privada dos meios de produção, estatização e nacionalização cabia à classe revolucionária. A dependência a um contingente de outras classes sociais – principalmente da pequena burguesia – para pôr em movimento as relações de produção e distribuição avariadas pelos acontecimentos que envolveram a revolução trazia o perigo das deformações, pressões e sabotagens burguesas.
Se o período anterior de construção do Partido Bolchevique – de duros enfrentamentos de frações em torno ao programa e às respostas aos acontecimentos da luta de classes com uma tática apropriada – foi extremamente difícil para levar a classe operária ao poder, o período inicial de assentamento das bases socialistas e de estruturação do Estado operário seria infinitamente mais difícil. Estava claro para Lênin que o início das transformações dependia da ditadura do proletariado, da democracia soviética e do fortalecimento de uma vanguarda dirigente que expressasse inconfundivelmente o movimento da classe operária, que se encontrava em um novo momento das tarefas socialistas.
Partindo das condições objetivas excessivamente adversas, Lênin não descuidava em dirigir esforços ao apoio do movimento revolucionário, como o que se havia erguido na Rússia durante a guerra mundial, principalmente na Alemanha e França, que se achava em posição de força capaz de vencer a contrarrevolução. Está absolutamente claro nos escritos de Lênin que os primeiros passos da transição ao socialismo se iniciavam com a revolução e a consequente criação da URSS. Essa compreensão deve ficar profundamente marcada.
No 3º Congresso de toda a Rússia dos Sovietes de Deputados Operários, Soldados e Camponeses, de janeiro de 1918, cerca de dois meses e meio após a vitória da revolução, Lênin expôs com toda a clareza que as profundas mudanças que se realizavam no modo de produção dependiam de uma firme condução da ditadura do proletariado e da luta de classes internacional. Tomemos suas palavras: “Estamos longe de ter completado sequer o período de transição do capitalismo ao socialismo. Nunca nos deixamos seduzir pela esperança de que poderíamos completá-lo sem a ajuda do proletariado internacional. (…) Naturalmente, a vitória definitiva do socialismo num único país é impossível. (…) Os grandes fundadores do socialismo, Marx e Engels, observando durante várias décadas o desenvolvimento do movimento operário e o crescimento da revolução socialista mundial, viram claramente que a passagem do capitalismo ao socialismo exigirá longas dores de parto, um longo período de ditadura do proletariado, a destruição de tudo o que é velho, a destruição implacável de todas as formas de capitalismo, a colaboração dos operários de todos os países, que devem unir todos os esforços para assegurar a vitória até ao fim”.
Em 1916, Lênin chegou à conclusão de que a II Internacional estava comprometida pelo revisionismo da socialdemocracia. Combateu no seu interior para impedir que chegasse a trair os fundamentos históricos do marxismo, a romper com as lições da Comuna de Paris e com as conquistas programáticas da I Internacional. Esse embate antes da Revolução Russa foi decisivo para orientar o proletariado a conquistar o poder nas condições da Primeira Guerra Mundial e da guerra civil. Em 1919, Lênin dirigiu o Congresso de fundação da III Internacional. Estava, assim, edificando o Partido Mundial da Revolução Socialista, de acordo com a premissa exposta no 3º Congresso dos Sovietes.
Nesse exato momento que recorremos ao marxismo, aproveitando a data dos 100 anos do falecimento de Lênin, a liquidação da URSS completou 32 anos, levada a cabo pela contrarrevolução, gestada no interior do Estado operário e impulsionada pelo Partido Comunista da União Soviética (PCUS) e pelas forças do imperialismo. Lênin não teve tempo de organizar uma direção que estivesse empenhada em manter a linha geral do programa e da teoria marxista sobre os quais a revolução social se potenciou e triunfou em Outubro de 1917.
As condições e tarefas posteriores à tomada do poder exigiam novas análises, conhecimentos, ações políticas e organização do regime soviético. O que implicava manter e desenvolver os fundamentos históricos e programáticos do socialismo científico. As experiências pré-revolucionárias haviam demonstrado a inevitabilidade das divergências, da formação de frações e das rupturas no movimento operário e no partido. As vantagens de ter derrotado a contrarrevolução, expropriado a burguesia e constituído o Estado operário, certamente, consolidavam o programa e o Partido Bolchevique. No entanto, a reconstrução da economia sobre as bases embrionárias da propriedade social e da confrontação com o domínio mundial do capitalismo trariam novos problemas, recolocariam velhas divergências e gestariam novos embates. A necessidade de manter a unidade do partido, diante da situação escabrosa da economia e das pressões da contrarrevolução, leva Lênin a concluir que era preciso cercear as tendências fracionistas. O que acabou favorecendo uma tendência burocrática encabeçada por Stalin e aliados. Esse foi um dos momentos mais difíceis para Lênin projetar a linha política que assegurasse o controle proletário da direção do partido.
A transição do capitalismo ao socialismo se iniciou em meio à continuidade do enfrentamento às forças internas e externas da contrarrevolução. Essa contradição teria de ser equacionada e respondida, não apenas no âmbito nacional da revolução, mas sobretudo no marco internacional. Lênin deixou claro que os avanços da reconstrução econômica, elevação das condições de existência dos trabalhadores e superação das velhas divisões nacionais herdadas do império russo estabeleceriam a solidez do terreno socialista, necessária para resistir à superioridade e ao poderio do cerco imperialista. Mas nenhuma solidez interna, por maior que fosse, levaria a URSS a concluir a transição do capitalismo ao socialismo. Era fundamental desenvolver as forças produtivas internas sob a direção do Estado operário, a garantia da ditadura do proletariado e a inserção da classe operária na condução geral do funcionamento da economia estatizada, mas em conexão com o movimento internacional dos explorados.
A luta de classes não se encerrava com a revolução. Manifestaria-se sob novas formas. As forças burguesas internas derrotadas e o imperialismo em nenhum momento cederiam pacificamente à construção do socialismo. A resistência da contrarrevolução teria de ser vencida com o desenvolvimento das forças produtivas internas e com o fortalecimento da luta de classes em nível mundial. Essa interdependência se encontra perfeitamente formulada por Lênin antes e depois da revolução, cujas contradições se manifestarão concretamente diante das tarefas de edificar as bases econômicas do socialismo. Lênin, no 3º Congresso dos Sovietes, a assinala como premissa para o combate às forças da contrarrevolução. Demonstra com todas as letras que não se tratava de vincular abstratamente a dependência da revolução na Rússia à revolução mundial. Tratava-se, sim, de apoiar a construção das forças produtivas socialistas na Rússia como parte das forças produtivas mundiais. A revolução em outros países, que poderia começar na Europa, permitiria ao proletariado mundial ir resolvendo essa contradição. Cabia à Revolução Russa e à URSS servirem à luta de classes em todas as latitudes e auxiliar o proletariado no objetivo histórico de destruir o poder da burguesia. Nessa relação histórica se encontrava a interdependência entre as novas forças produtivas que nasciam da expropriação da burguesia e da estatização da economia, naquele momento, com a revolução na Alemanha e França. Aí está o sentido marxista plenamente exposto na diretriz de Lênin voltada ao 3º Congresso dos Sovietes: “Naturalmente, a vitória definitiva do socialismo num único país é impossível”.
A confusão entre iniciar as transformações socialistas em um determinado país com a possibilidade de obter a vitória definitiva em um único país seria a base do revisionismo encabeçado por Stalin, que sucederia a Lênin no comando do PC(b)R e do Estado soviético. Os primeiros sinais nos desvios do marxismo-leninismo se apresentaram quando Lênin estava no final de sua vida. O fato decisivo nesse momento foi o de Stalin se sobrepor a Trotsky, amparado por dirigentes históricos como Zinoviev, Kamenev e Bukharin, sobretudo. Estabelecia-se uma luta no aparato partidário, que levaria Trotsky a defender a proposição internacionalista de Lênin diante de um revisionismo que recém se manifestava. Lênin não via em Stalin um herdeiro à altura de enfrentar os grandes obstáculos que se apresentavam no caminho da reconstrução da economia arruinada e construção das bases socialistas. No 10º Congresso dos Sovietes, de dezembro de 1922, Lênin se ressentia do agravamento da enfermidade, de forma que não pôde participar diretamente, manifestando-se através de cartas endereçadas à direção do partido, por meio das quais expressava suas divergências com Stalin, Bukharin etc. Neste momento, se destacou a posição de Lênin em defesa do monopólio do comércio exterior e da vigência do centralismo democrático diante das nacionalidades. Em particular, tomou forma de luta política a necessidade de mudar a composição do Comitê Central do partido, que, para Lênin, deveria contar com uma maioria operária.
Nesse embate, Lênin contou com o apoio de Trotsky. Na Carta a J. V. Stalin, para os membros do CC do PC(b)R, diz: “Terminei agora todos os meus assuntos e posso ir-me tranquilo (Lênin seria transferido a Gorki por recomendação médica). Cheguei também a um acordo com Trotsky acerca da defesa de meus pontos de vista sobre o monopólio do comércio exterior. Somente permanece uma circunstância que me preocupa muitíssimo; é a impossibilidade de falar no Congresso dos Sovietes (10º Congresso). Me oponho categoricamente a toda postergação do problema do monopólio do comércio exterior (…) estou convencido de que Trotsky sustentará pontos de vista tão bem como eu (…)”. Nas Últimas Cartas e artigos, de 23 de dezembro de 1922 a 2 de março de 1923, Lênin expõe sua reprovação a Stalin e indica sua aprovação a Trotsky para dirigir o partido.
Após a morte de Lênin, se manifestou mais claramente as tendências burocráticas e revisionistas do marxismo-leninismo. Tornou-se inevitável que Trotsky desenvolvesse uma linha crítica às deformações no centralismo democrático e aos erros de diretrizes econômicas. Já não era possível evitar um fracionamento na direção do partido. A Oposição de Esquerda russa será varrida das fileiras do partido e Trotsky receberá a pena de confinamento e, em seguida, de expulsão da Rússia. Esse momento do final da vida de Lênin constitui um ponto decisivo em que se manifesta uma mudança de direção programática no PCUS.
A derrocada da URSS, ocorrida depois de 67 anos após sua morte, comprovou as formulações sobre a transição do capitalismo ao socialismo e a justeza das críticas de Lênin a Stalin e a seu grupo político. A história reservou a Trotsky a tarefa de encarnar e continuar o marxismo-leninismo. Stalin iria liquidar fisicamente a Oposição de Esquerda e assassinar Trotsky, em agosto de 1940.
O longo percurso de defesa da URSS contra as tendências burocráticas restauracionistas e a constituição da IV Internacional seguiriam o caminho estabelecido pelos Primeiros Quatro Congressos da Internacional Comunista, que estiveram sob a direção de Lênin. A liquidação final da III Internacional, em junho de 1943, a mando de Stalin, prenunciou o destino que tomaria a URSS sob a política do “socialismo em um só país” e da tese da possibilidade de “coexistência pacífica” com o imperialismo.
O desmoronamento da URSS interrompeu o processo de transição do capitalismo ao socialismo, impondo uma das maiores derrotas e retrocessos às conquistas do proletariado russo e mundial. A restauração capitalista rompeu os pilares da URSS, constituídos pela expropriação da burguesia, transformação da propriedade privada dos meios de produção em propriedade social, estatização, monopólio do comércio exterior e economia planejada. O PCUS, completamente esclerosado pela burocratização, cedeu lugar à fração francamente restauracionista e pró-imperialista.
Não se pode reivindicar o marxismo-leninismo sem defender as conquistas da Revolução Russa, da edificação da URSS e da construção da III Internacional como Partido Mundial da Revolução Socialista. A restauração capitalista não rejuvenesceu o capitalismo decadente, ao contrário expressou o enfrentamento entre a revolução e a contrarrevolução. A mais profunda vitória da contrarrevolução, que concluiu com a demolição da URSS, faz parte das dores do parto, como assinalaram Marx e Engels e como expôs Lênin no 3º Congresso dos Sovietes.
É preciso reconhecer sem temor a derrota e até onde atingiu as conquistas históricas do proletariado e das massas oprimidas, para continuar a luta pela retomada da transição do capitalismo ao socialismo, que objetivamente está em curso, como demonstra a falência do capitalismo, a luta de classes mundial em ascensão, as guerras na Ucrânia e na Faixa de Gaza, a escalada militar na Ásia impulsionada pela guerra comercial dos Estados Unidos contra a China, os confrontos nacionais na África, de fundo anti-imperialista, e a profunda desestabilização política na América Latina.
Não há outro caminho para a reabilitação do movimento revolucionário mundial que compreender as causas da derrocada da URSS e de suas implicações a favor da reorganização das forças anticomunistas da contrarrevolução desde o final da Segunda Guerra Mundial. Colocar-se diante dessa tarefa significa trabalhar no seio do proletariado em nosso país e da luta de classes mundial para superar a crise de direção.
A liquidação da URSS se completou nas condições da crise de direção, que não teve como ser superada pela constituição da IV Internacional em 1938, embora estivesse solidamente alicerçada no programa da revolução mundial e na linha do marxismo-leninismo. Uma vez que o programa da revolução política da IV Internacional não teve como ser materializado no curso da luta de classes, o termidor estalinista se firmou e concluiu a contrarrevolução destruindo a URSS.
Essa catástrofe histórica é transitória, ainda que não seja possível determiná-la temporalmente. As contradições do capitalismo na fase imperialista continuam a potenciar e impulsionar a barbárie social. Em meio a profundos conflitos, vêm à tona as experiências e as conquistas da Revolução de Outubro e da construção da URSS. Trata-se de assumi-las e transformá-las em orientação programática, em respostas às guerras em andamento e em combate às tendências bélicas que avançam aceleradamente.
As conquistas práticas da classe operária se acham consubstanciadas no programa da revolução social, que é o programa da revolução e do internacionalismo proletários. Recorrer a Lênin nos 100 anos de sua morte é recorrer à Revolução de Outubro de 1917, à edificação da URSS, à construção da III Internacional e à sua luta contra a burocratização restauracionista que se despontou no alvorecer da transição do capitalismo ao socialismo. Somente se pode recorrer a Lênin, por meio das conquistas da Oposição de Esquerda russa e da IV Internacional, que implica recorrer à luta de Trotsky contra a restauração capitalista.
Toda força, todo empenho, em superar a crise de direção, reconstruindo o Partido Mundial da Revolução Socialista. O Comitê de Enlace pela Reconstrução da IV Internacional (CERQUI) tem em suas mãos essa tarefa histórica. Sua força, hoje, se mede pela assimilação e aplicação do marxismo-leninismo-trotskismo.
Memória Eterna ao camarada Lênin!
Cabe à vanguarda revolucionária se colocar à altura de sua gigantesca obra.
24 de janeiro de 2024