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01 ago 2024
Crise na Venezuela
Somente uma política do proletariado tem como enfrentar derrotar a ofensiva do imperialismo
As eleições na Venezuela e a declaração de vitória de Nicolás Maduro projetaram a crise política que marca a trajetória do nacional-reformismo chavista. A oposição de ultradireita e pró-imperialista acusa o governo de fraudar o resultado das urnas. Eclodiu um movimento de contestação. Estimam-se 11 mortos e cerca de 700 presos. A polícia e o Exército foram implacáveis. Caso contrário, o levante oposicionista atingiria um patamar que poderia derrubar o regime chavista.
Avaliando a polarização, Maduro havia dito que a Venezuela corria o risco de enfrentar uma “guerra civil”. Foi um sinal de que as eleições estavam antecipadamente expondo um movimento da oposição apoiado pelos Estados Unidos, aliados europeus e governos latino-americanos. As pressões externas para que houvesse uma vigilância internacional sobre o processo eleitoral indicavam que o imperialismo agiria como um interventor autorizado pelo próprio governo venezuelano.
Em outubro de 2023, se estabeleceu o acordo de Barbados de realização das eleições sob a inspeção externa, no sentido de dar à oposição condições de livre movimentação. Em troca, os Estados Unidos começariam a suspender as sanções econômicas à Venezuela. O Brasil participou ativamente para que se assinasse o acordo de Barbados. Como se vê, se tratou de uma chantagem dos Estados Unidos para determinar o curso da disputa eleitoral que ocorreria nove meses depois.
Houve a tentativa de reverter a proibição da candidatura de Maria Corina Machado, que se destacou desde a época de Hugo Chávez por conspirar contra o nacionalismo que protagonizava estatizações, principalmente do petróleo e fontes de matérias-primas. Corina Machado, filha de um empresário do aço, foi à procura de George W. Bush, no passado, para receber apoio e assim potenciar a posição pró-imperialista de setores da burguesia venezuelana. Esteve em constante conspiração para derrubar o chavismo.
Nas presentes eleição, não conseguiu se livrar do impedimento, de forma que colocou como seu substituto o ex-diplomata Edmundo González. Devido à enorme crise econômica do país, em grande medida alimentada pelo cerco econômico imposto pelos Estados Unidos, que afetou duramente a grande maioria da população, a oposição liderada por Corina Machado esperava, desta vez, retirar da presidência Maduro por meio das eleições.
O acordo de Barbados tão somente serviria para o imperialismo e seus serviçais da América Latina intervirem sob a máscara da legitimidade “democrática”. À medida que se estabeleceu a polarização, Maduro impediu a presença dos fiscais da União Europeia e de determinados países da Organização dos Estados Americanos (OEA). Esses antecedentes indicavam que as eleições concluiriam sem que as partes pudessem se comportar como bons adversários nas entranhas da política burguesa.
O anúncio da vitória de Maduro por 51,2% dos votos diante dos 44% de Edmundo González deu curso à crise política que se instalou anos a fio, ou seja, desde que Hugo Chávez passou a ocupar o poder. A oposição pró-imperialista realizou inúmeras tentativas de arrancar o chavismo do poder do Estado, inclusive recorrendo a tentativas de golpes apoiadas pelos Estados Unidos. Chegou-se ao ponto de inventar um governo paralelo, em 2019, sob a figura do aventureiro Juan Guaidó. A fusão entre o ideário chavista e os militares constituiu uma força política e institucional que impossibilitou as tentativas da oposição de retomar o poder do Estado.
É necessário entender o atual enfrentamento como um elo da história política da Venezuela em que o imperialismo agiu diuturnamente para derrubar o nacional-reformismo, que ousou estatizar empresas de ramos chaves da economia. É inconcebível aos Estados Unidos que um país semicolonial e débil como a Venezuela possa controlar as fontes de matérias-primas. Embora o nacionalismo chavista não atentasse contra a propriedade privada dos meios de produção, os Estados Unidos e aliados europeus agiram no sentido de quebrar a indústria venezuelana e cercar a economia como um todo com as sanções ditatoriais.
Na presente situação, diante da retomada dos protestos de rua e da movimentação norte-americana nos bastidores para anular as eleições, já que a oposição não ganhou força para dividir os militares e caminhar no sentido de um golpe de ultradireita, Maduro se viu obrigado a expulsar vários diplomatas que se colocaram abertamente contra o resultado eleitoral. O governo fascistizante da Argentina, Javier Milei, foi um dos primeiros a se insurgir pela derrubada do governo Maduro, acusando-o estupidamente de “comunista”. Seguiu o caminho da contestação, até mesmo o governo de Gabriel Boric do Chile, que se qualifica de democrático e progressista. A OEA foi convocada em sessão extraordinária para aprovar uma resolução que exigia “uma verificação [das atas eleitorais] com a presença de observadores independentes”, ou seja, não reconhecer a vitória do Maduro. Entretanto, a resolução não foi aprovada, fracassando assim a iniciativa do imperialismo
Ao contrário, a China e Rússia reconheceram os resultados eleitorais. Nessa linha, seguiram inúmeros países. Os que não reconheceram são minoria. A lista maior é a dos que “pedem transparência ou que colocam em dúvida a regularidade do pleito”, entre eles estão os Estados Unidos e Brasil. Os Estados Unidos manobram no sentido de colocar a OEA contra a posse de Maduro. O Brasil aguarda as atas para se posicionar. Lula não seguiu a posição do PT, que reconheceu a reeleição de Maduro e pediu o “diálogo com a oposição”. Nesse terreno, se movimentam as forças intervencionistas.
A posição do proletariado mundial e latino-americano não tem como se expressar organizativamente em defesa da bandeira anti-imperialista e da soberania da nação oprimida de não interferência das potências nos problemas internos da Venezuela. Isso por que na própria Venezuela não existe o partido revolucionário, marxista-leninista-trotskista, e prevalece a profunda crise de direção devido à ausência do Partido Mundial da Revolução Socialista, a IV Internacional.
O Comitê de Enlace pela Reconstrução da IV Internacional (CERQUI) tem em suas diretrizes programáticas o fundamento da autodeterminação das nações oprimidas, como é o caso da Venezuela. Rechaça e combate toda interferência das potências que intervêm nos assuntos internos dos países semicoloniais. E luta no seio das nações oprimidas contra os governos que servem aos interesses do imperialismo, como vemos agora com os alinhamentos montados pelos Estados Unidos e União Europeia na OEA, para contestar a vitória de Maduro e potenciar o movimento da reação pró-imperialista da oposição.
Esse posicionamento coloca nas mãos da classe operária, dos camponeses e dos demais explorados venezuelanos as respostas à crise política, que expressa a decomposição econômica do capitalismo, o esgotamento político do nacional-reformismo e a necessidade de fortalecer o campo da revolução social. A tarefa é pôr em pé o partido-programa, de estrutura bolchevique, celular, enraizado nas massas proletárias, que assinale a perspectiva revolucionária: o governo operário-camponês. Este é o grande objetivo histórico.
Estados Unidos, tirem suas mãos opressoras e sanguinárias da Venezuela!
Pela autodeterminação e soberania da nação oprimida!